- 1973
- Papel
- Tinta-da-china e Aguarela
- Inv. 98DP1726
Eduardo Batarda
O Vitória de Marracuene
Esta pintura é uma das maiores executadas em aguarela sobre papel, técnica que Eduardo Batarda aperfeiçoou nos anos em que estudou em Londres com uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian (1971-1974). As aguarelas de Batarda são uma pesquisa dentro da própria pintura, com vista a permitir a coexistência de uma elevada qualidade técnica (que é, ao mesmo tempo, ironizada), uma iconografia vernacular e um conjunto de comentários críticos sobre atualidade e arte de grande complexidade intelectual. Esta persistência na especificidade da pintura é enfatizada pela escala desta obra, que permite leituras diferentes conforme a distância a que é observada. Há um convite a uma dança de afastamento e aproximação análoga à atitude cliché com que se observam grandes obras de arte (com admiração e veneração), o que contrasta com o tipo de figuração praticada, bebida nos comics clássicos e underground, caricatural, cínica, de humor às vezes duvidoso e, em alguns momentos, pornográfica.
O título refere-se ao combate de 1895 em Marracuene (Moçambique), no qual os soldados portugueses adotaram a formatura em quadrado, que foi no entanto rompida mais de uma vez pelos oponentes, armados apenas com lanças. O combate trava-se no contexto de uma contenção sangrenta de revoltas dos autóctones, e há um paralelismo evidente com a guerra colonial ainda em curso à data da obra.
Em 1977 a pintura foi boicotada por estudantes universitários africanos quando exposta em Bulgária, que nela viram conotações racistas. O erro de interpretação deve-se à representação estereotipada dos africanos (recorrendo à imagem dos pickaninnies, corruptela do português «pequenino» para designar as crianças negras e depois os bonecos-tipo africanos frequentes em cartoons e publicidade, de grandes olhos e lábios grossos) com função irónica, ou seja, na verdade anti-racista e anti-colonialista. Estas personagens atacam um cubo transparente ao centro, no interior do qual estão os colonos, boçais não menos estereotipados — a «formatura em quadrado», aliás a puxar para triângulo (remetendo para a conotação religiosa), será também um epíteto pictórico de reacionarismo. A ação passa-se num palco cujo cenário conjuga elementos abstratos reconhecíveis dos modernismos e comentados na sua utilização decorativa. Observando mais cuidadosamente verificamos que, em vez de lanças e flechas, as armas da maior parte dos nativos são pincéis e os seus escudos são paletas, o que, juntamente com outras referências da história de arte, permite entender este combate numa outra perspetiva: como um ataque das neo-vanguardas (fumadoras de maconha, caóticas, aguerridas) a um modernismo por elas visto como enquistado, oficial, obsoleto, mas sendo elas próprias dele devedoras, perpetuando, por exemplo, os primitivismos modernistas numa arte dita antropológica.
Uma legenda sobre fundo azul surge em rodapé, à maneira das que apareciam integradas nas antigas gravuras didáticas ou nas que reproduziam grandes obras da pintura, indicando o título, artista, localização, escola, etc.
MPS
Maio de 2010
Tipo | Valor | Unidades | Parte |
Largura | 100 | cm | |
Altura | 69 | cm |
Tipo | data |
Texto | 73/12 |
Posição | frente, canto inferior esquerdo |
Tipo | assinatura |
Texto | Batarda |
Posição | frente, canto inferior esquerdo |
Tipo | inscrição |
Texto | «Functions of Painting», «Prémio SNI 1973», «l’illustration», «toile de fond par M.M. 1960-1968», «essa é de rebimbòm[…]o!», «beauté créole», «Silbes», «Tunes», «boa noite e lepra!», «ad reinhardt 63», «Batarda 73/12», «as grandes momentas da nossa história: o vitória de marracuene, por abelardo batarda, e.s.b.a.l., e.s.b.a.l., r.c.a., fut. a mural in the palace of justice, elvas-sur-mondego, portugal – peinture murale au palazzo de la jurisprudence, villa major carvalhosa, portugal; pintura mural, estádio dos moicanos, versailhes-gare, lisboa, portugal» |
Posição | frente, ao longo da mancha |
Tipo | Aquisição |
Data | Fevereiro de 1998 |
Linhas de Sombra |
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian e Centro de Arte Moderna, 1999 |
ISBN:972-635-115-4 |
Catálogo de exposição |
Um Oceano Inteiro para Nadar |
Lisboa, Culturgest, 2000 |
Catálogo de exposição |
Eduardo Batarda: Pinturas, 1965-1998 |
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de Arte Moderna José Azeredo Perdigão, 1998 |
Catálogo de exposição |
Eduardo Batarda Fernandes |
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1975 |
Catálogo de exposição |
Eduardo Batarda - Pinturas 1965-1998 |
CAMJAP/FCG |
Curadoria: Alexandre Melo |
3 de Março a 10 de Maio de 1998 Galeria do piso 1 do museu do CAMJAP |
Transfert - Obras do CAMJAP em Itinerância/ Itinerant CAMJAP works |
Fundação Calouste Gulbenkian |
Curadoria: Leonor Nazaré |
16 de Junho a 8 de Setembro de 2007 Palácio da Galeria/ Museu Municipal de Tavira |
Linhas de Sombra |
Fundação Calouste Gulbenkian |
Curadoria: João Miguel Fernandes e Maria Helena de Freitas |
29 de Janeiro a 18 de Abril de 1999 |
Um Oceano Inteiro para Nadar |
Culturgest |
2000 Culturgest, Lisboa |
Eduardo Batarda Fernandes |
Fundação Calouste Gulbenkian |
1 a 31 de Agosto 1975 Galeria de Exposições Temporárias da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa |
Portuguese Contemporary Art |
Exposição apresentada em Belgrado, Bucareste, Atenas, Sofia, no ano de 1977. |