- 1967
- Madeira
- Tinta acrílica
- Inv. 81P697
Eduardo Batarda
I Like Art ou a Perspectiva do Costume com Água no Bico
DEPOIMENTO DO ARTISTA
Classificada pelo próprio pintor como a «pièce de résistance» da sua primeira exposição individual (1968), esta pintura tem a particularidade do formato poligonal não retangular, que permite o jogo de trompe l’œil no plano inferior: um cubo ou caixote visto em profundidade, mas com o artifício em perspetiva posto a nu pelo prolongamento das linhas a tracejado. Foram usadas tintas fluorescentes para obter contrastes insólitos, mas o efeito luminoso perdeu-se. O quadro convoca, com humor e cinismo, vários elementos do vernacular, da política e da religião, sendo ao mesmo tempo um comentário à história da arte. É também uma alusão ao mapa estratégico, à pintura de paisagem e às suas relações com a topografia, propriedade e abstração, e à terra vista do espaço («a Terra é azul», descreveu o primeiro homem a viajar na órbita da Terra, Y. Gagarin). Podemos distinguir vários elementos, entre eles uma cabeça hitleriana decapitada, de óculos escuros, com um pássaro cujo «BLESS YOU» tanto remete para a ideia de um Hitler «abençoado» (e em inglês) como parece responder comicamente («santinho») ao «ACHTUNG» (espirrado, como num discurso apoplético do líder nazi) que surge cortado na borda do caixote. A figura repete-se no plano inferior, com o número 2 e um chapéu colonial, junto à inscrição «CHAG», parte do cumprimento festivo judeu Chag Sameach («Boas Festas») e ao mesmo tempo lembrando Chagall, chaga, KAG, CAG (Cabo Verde, Angola, Guiné), entre outras alusões — um comentário à Guerra Colonial.
Outras inscrições e elementos permitem mais leituras e associações, numa estratégia de conotações, ambiguidades e segundos (ou mais) sentidos, explorada em parte pelo hábito e necessidade de fugir à censura, mas sobretudo assumida enquanto pintura. A minúscula figura dentro de um dos caixotes/cubos esboçados que pairam no espaço é encimada por um balão de BD com a afirmação, algo irónica «I like art», que lembra o slogan da campanha de Eisenhower de 1952, «I like Ike». No entanto, por ser parte do título, leva-nos a refletir na tradução literal: gostar de arte (ou de pintura) porque é ela que permite desierarquizar assuntos, amalgamá-los num mesmo plano, associá-los entre si, pôr tudo no mesmo saco (neste caso, no mesmo caixote), e ao mesmo tempo comentar a tradição e a especificidade formal desta maneira de contar histórias, evocando, por exemplo, a perspetiva clássica — na própria pintura e no título, «a perspectiva do costume» —, e aludindo à sua capacidade de ocultação de sentidos, «com água no bico».
Mariana Pinto dos Santos
Maio de 2010
Tipo | Valor | Unidades | Parte |
Altura | 195 | cm | |
Largura | 170 | cm |
Tipo | assinatura |
Texto | Batarda |
Posição | frente, margem lateral esquerda |
Tipo | data |
Texto | 67-68 |
Posição | frente, margem lateral esquerda |
Tipo | inscrição |
Texto | «I LIKE ART», «OOPS», «BOOM», «ACTION», «BLESS YOU», «MCMD», «HOLY CRO», «ACHTUNG», «CHAG», «SO NICE», «AH AH», «ACR», «ARREEA», «BATARDA 67.68» |
Posição | frente, ao longo da mancha |
Tipo | Aquisição |
Data | Julho 1981 |
Anos 60, anos de ruptura, uma perspectiva da arte portuguesa nos anos sessenta |
Lisboa, Livros Horizonte, 1994 |
ISBN:972-24-0867-4 |
Catálogo de exposição |
Eduardo Batarda: Pinturas, 1965-1998 |
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de Arte Moderna José Azeredo Perdigão, 1998 |
Catálogo de exposição |
Exposição Permanente do CAM |
CAM/FCG |
Curadoria: Jorge Molder |
18 de Julho de 2008 a 4 de Janeiro de 2009 Centro de Arte Moderna |
Anos 60, anos de ruptura, uma perspectiva da arte portuguesa nos anos sessenta |
Câmara Municipal de Lisboa |
Curadoria: António Rodrigues |
1994 Palácio Galveias, Lisboa |
Eduardo Batarda |
Galeria Quadrante |
1968 Galeria Quadrante, Lisboa |