- 1983
- Papel vegetal
- Marcador
- Inv. DP1420
Júlio Pomar
Fernando Pessoa e Almada Negreiros
Afirma Júlio Pomar que em princípios da década de 80 andava a “tentar o diabo” dizendo que “bem precisava de passar um ano inteiro a desenhar”.* Essa oportunidade surge com a encomenda para intervir na estação do Alto dos Moinhos, do metropolitano de Lisboa, da qual este desenho faz parte.
O tema escolhido foram quatro poetas que associa à mitologia de Lisboa, bem como alguns elementos do universo literário de cada um: Pessoa, Almada, Bocage e Camões. Almada Negreiros e Fernando Pessoa já havia feito entrada na sua obra na década de 70, quando esta se centralizou em torno do retrato. Almada abrira o ciclo com o retrato Almada I, em 1970 (pertencente à colecção do CAM), e Fernando Pessoa seguir-se-lhe-ia pouco depois, em 1973, com os retratos Fernando Pessoa e Fernando Pessoa II (Lisboa com suas Graças).**
A obra que observamos pertence à segunda fase do processo de trabalho de Pomar para a estação do Alto dos Moinhos, sendo esta precedida por desenhos a carvão e concluída na sua etapa final pela passagem do desenho fixado a marcador sobre papel vegetal para a cerâmica do azulejo. Feita de sucessivas aproximações às personagens, este vasto conjunto de desenhos — objecto de uma exposição no CAM em 1984 — considera cada um dos poetas individualmente, mas aqui reúne dois dos eleitos: Almada, assumindo uma personagem de arlequim ou de diabo, e Pessoa. Se a posição de Almada na composição e a estruturação desta em torno de uma mesa de café é remanescente de Auto-retrato num grupo que Almada realiza para o café A Brasileira, no Chiado, em 1925 (e pertencente à colecção do CAM), a opção de retratar Fernando Pessoa à mesa de um café não pode deixar de evocar a iconografia pessoana primeiramente fixada, e também, por Almada, no Retrato de Fernando Pessoa que realiza em 1954 (e do qual o CAM possui uma réplica de 1964 encomendada pela Fundação Calouste Gulbenkian).
O retrato de Pessoa à mesa de um café (supostamente, o Martinho da Arcada) é alvo de diversas variações nestes desenhos de Pomar: Pessoa com Almada, assumindo o últimos diferentes posições e fisionomias, ou Pessoa desmultiplicado, numa alusão aos seus heterónimos. A presente obra é das que maior economia de traço apresenta, num caminho para a simplificação e clarificação do desenho confessadamente pretendido pelo autor. De linhas eminentemente verticais e rectilíneas, com um traço pouco quebrado quando comparado com outros desenhos da série, observamos Fernando Pessoa à mesa, central mas recuado na composição, e à esquerda, num plano mais avançado, a figura esguia de um Almada, que parece converter-se numa das suas personagens acrobáticas. Fundidos num mesmo plano, por um pintor de uma geração posterior, estão assim duas personagens principais do Modernismo em Portugal, companheiros da revista Orpheu. Representados como personagens, numa aproximação que não pretende desvelar as suas múltiplas máscaras (assumidas na heteronímia pessoana ou nas poliédricas actividades de Almada) mas, ao invés, assumi-los, precisamente, como personagens de uma mitologia cultural.
* Júlio Pomar, Pomar: Um ano de desenho: 4 Poetas no Metropolitano de Lisboa, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian/ Centro de Arte Moderna, 1984, s/ p.
** Ver Catalogue Raisonné II. Peintures et Assemblages. 1968-1985, Paris, Éditions de la Différence, 2001, pp. 82-83.
Luísa Cardoso
Fevereiro 2015
Tipo | Valor | Unidades | Parte |
Altura | 215,5 | cm | moldura |
Largura | 162,7 | cm | moldura |
Altura | 203 | cm | papel |
Largura | 150 | cm | papel |
Tipo | assinatura |
Texto | Pomar |
Posição | frente, canto inferior direito |
Tipo | outras |
Texto | N.º 87 |
Posição | verso |
Tipo | data |
Texto | 83 |
Posição | frente, canto inferior direito |
Tipo | A definir |
Data | A definir |