- 1990
- Poço em gesso, moldura de porta, tubo de cobre e 10 placas de gesso
- Inv. 94E343
Pedro Cabrita Reis
D(OOR), D(AM)
Fonte, poço, canal, dique, silo, casa, escada, degrau, porta, lareira, mesa, cadeira, banco, cesto, jarro constituem um alfabeto de referências e formas, a partir do qual Pedro Cabrita Reis trabalha no início da década de 1990.
D(oor) D(am) pertence ao conjunto inaugural de obras construídas com base nesse léxico elementar: 67 trabalhos distinguidos com a publicação de um livro de artista [1]. Com este livro, Cabrita Reis consolida a ideia de uma viragem nas suas pesquisas plásticas, já que o exercício da pintura e do desenho, privilegiado nos anos 80, cede agora o lugar à produção de objectos/construções/instalações que, diversificando técnicas e materiais, se reportam a esse alfabeto-base. Longe de qualquer categorização disciplinar definida, a linha de pesquisa com que Cabrita Reis abre os anos 90, potencia o resgate de materiais comuns, a variedade e os cruzamentos do universo de referências, a densidade e a sobreposição dos sentidos possíveis. Em diversos trabalhos surge ainda acentuada uma relação vital entre a obra e o espaço que a acolhe [veja-se Alexandria (1990) no Convento de S. Francisco em Beja].
Os trabalhos que resultaram desta viragem são construídos a partir de um universo (em expansão) de matérias familiares: da arquitectura dominada pelo impacto visual do gesso ao estaleiro da construção civil e à recuperação de objectos da vida quotidiana (o jarro e os cestos acima citados, mas também, em breve, a utilização de lâmpadas ou panos). Estas matérias-primas sugerem à primeira vista situações habituais, conhecidas. Porém, rapidamente damos conta da sua estranheza. A «deslocação do sentido que define a obra de arte» [2] despojou esses elementos da sua comum dimensão, do sentido que habitualmente lhes é conferido, obrigando-nos a multiplicar as possibilidades de leitura e a lidar, portanto, com a instabilidade dos potenciais significados.
Em D(oor) D(am), a memória funcional e simbólica da vocação primordial da porta foi intencionalmente perturbada pela sobreposição de outros sentidos. Se por um lado o valor do objet trouvé é recuperado, por outro lado, Cabrita Reis não deixa, de modo nenhum, de sublinhar a acção transformadora da sua intervenção criadora, e portanto a deslocação do sentido que desfamiliariza a moldura da porta, as placas de gesso recortadas ou a forma circular do hipotético poço. Cumpre-se assim o «absoluto desejo de metáfora» [3] no acaso objectivo do encontro de um dique com uma porta: «Um dique separa a água da terra; uma porta separa o dentro e o fora. Em Amsterdam, os canais dispõem-se quase em forma de U sensivelmente paralelos e concêntricos. Na porta de Amsterdam está o desenho de um canal de Amsterdam. Estranha convergência ou matriz construtiva?» [4]. Eis D(oor) D(am), a porta-dique que acolhe as águas vazadas pelo reservatório-poço adjacente. Longe de qualquer intenção explicativa, descritiva ou ilustrativa, este trabalho clarifica o investimento do artista na expansão das possibilidades de construir o mundo. A ambiguidade fundamental que se joga nesta obra, como em quase todas as outras de Pedro Cabrita Reis, contribui decisivamente para a desestruturação da ideia de um universo de significação natural e pretensamente estável.
Joana Cunha Leal
Maio de 2010
1 Pedro Cabrita Reis, Lisboa, CAM – Fundação Calouste Gulbenkian, 1992.
2 Idem, p. 36.
3 Idem, p. 148.
4 Idem, p. 72.
** Peça construída em Novembro de 1990, na oficina de Sander Van Den Elshout, Amsterdão, a partir de uma porta encontrada nas obras do ICA Amsterdam.
Tipo | Valor | Unidades | Parte |
Altura | 70 | cm | |
Largura | 380 | cm | |
Profundidade | 173 | cm |
Tipo | Aquisição |
Data | Novembro de 1994 |
Hors Catalogue - Un projet Gulbenkian à propos de sa collection |
Amiens, Maison de la Culture d'Amiens, 1997 |
ISBN:2 903082 70 8 |
Catálogo de exposição |
Extremo Occidente - Arte Portugués Contemporáneo en la Fundação Calouste Gulbenkian |
Bilbao, Sala de Exposiciones REKALDE, 1995 |
Catálogo de exposição |
Tríptico |
Gand, Museum Van Hedendaagse Kunst, 1991 |
Monografia |
Pedro Cabrita Reis |
Lisboa, Centro de Arte Moderna - Fundação Calouste Gulbenkian, 1992 |
Catálogo de exposição |
Contra a claridade |
Lisboa, Centro de Arte Moderna - Fundação Calouste Gulbenkian, 1994 |
Catálogo de exposição |
Pedro Cabrita Reis |
Valencia, IVAM, 1996 |
Catálogo de exposição |
Tage der dunkelheit und des lichts: zeitgenössische Kunst aus Portugal |
Bonn, Bonn: Kunstmuseum, 1999 |
Catálogo de exposição |
Pedro Cabrita Reis |
Ostfildern-Ruit, Ostfildern-Ruit: Hatje Cantz Verlag, 2003 |
Monografia |
Pedro Cabrita Reis - Contra a Claridade |
CAMJAP/FCG |
Curadoria: CAMJAP/FCG |
24 de Maio de 1994 a Julho de 1994 Galeria do Piso 1 do museu do CAM |
Exposição comissariada por Jorge Molder, José Sommer Ribeiro e Pedro Cabrita Reis. |
Hors Catalogue - Un projet Gulbenkian à propos de sa collection |
CAMJAP/FCG |
Curadoria: João Fernandes |
Dezembro de 1996 a Fevereiro de 1997 Casa da Cultura de Amiens, França |
Uma co-produção da Casa da Cultura de Amiens e do Serviço de Belas-Artes e do CAMJAP da Fundação Calouste Gulbenkian. Esta exposição tem origem numa proposta de Augusto Rodrigues da Costa, responsável pela programação de artes plásticas da Casa da Cultura de Amiens. |
Cabrita Reis, Sculptures |
Barbara Farber Gallery |
Curadoria: Barbara Farber Gallery |
1990 a 1990 Barbara Farber Gallery, Amesterdão |