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- Inv. GP1039
Júlio Pomar
Corpo Verde
Realizada em 1979, a presente gravura resulta de um conjunto de desenhos que, no mesmo ano, Pomar realiza para um livro de Maria Velho da Costa, do qual herda o título. Nem todos os desenhos que produz em torno do tema constam do livro, de pequenas dimensões, onde texto e imagem se afirmam com igual importância. As gravuras, de grandes dimensões, contrastam aliás com o formato reduzido e intimista dos desenhos no livro, como se as primeiras afirmassem uma vocação de exposição (logo outro tipo de recepção e relação por parte do observador) e os segundos convocassem a proximidade e a recepção unipessoal do observador que abre, folheia e fecha o livro.
Porém, a erotização da produção de Pomar e a exploração de uma estética do fragmento e da justaposição começara na década anterior, com as suas variações sobre o Banho Turco de Ingres iniciadas em 1968.* Dos procedimentos de fragmentação, recorte, colagem e sobreposição que explora nas suas telas ao longo da década de 70, a presente gravura cria um novo entendimento, retendo o estudo do “linearismo” de Ingres, a aprendizagem com os guaches recortados de Matisse, mas resolvida numa nova “situação de justaposição” ou de “coexistência”.** Efectivamente, se compararmos a presente gravura com, por exemplo, a tela L’Épure, de 1977***, observamos como a passagem da pintura com colagem para o desenho permite que a justaposição (dos corpos, das formas) não resulte numa ocultação, mas antes numa coexistência. A representação dos dois corpos enlaçados, dada através de uma grande economia e depuração de traço, retém o registo da silhueta de ambos os corpos, não respeitando a ocultação que a forma em primeiro plano provocaria da forma em segundo plano. Ou seja, em certa medida o desenho assume-se como desenho, como traço, cuja única matéria é o contorno descarnado, sem matéria que preencha a forma que os seus limites contêm. Como se os corpos fossem transparentes.
Ao longo de toda a série de desenhos para Corpo Verde observamos a representação de várias posições no acto sexual. Os corpos raramente surgem isolados (“como se o corpo não fosse ele próprio senão no diálogo com outro corpo”****). Há a exposição do acto, mas, como refere Gilles Plazy, os rostos nunca são figurados, preservando assim o anonimato e, mais do que isso, desindividualizando a imagem e abrindo a possibilidade de esta se apresentar como um arquétipo.
Um desenho muito semelhante a esta gravura (mas não exactamente igual) surge no pequeno livro de Maria Velho da Costa, na frente de uma folha. No verso que a acompanha, à esquerda, lê-se o seguinte texto da autora: “Agarra o meu cabelo que eu te arredondo o mundo e me concitas pela tua mão aos outros continentes, mares irmãos.”*****
* Todavia, Pomar expusera já em 1961 uma série de desenhos eróticos. Ver Alexandre Pomar, “Júlio Pomar in Júlio Pomar. Catálogo ‘Raisonné’ I. Pinturas, Ferros e ‘Assemblages’. 1942-1968, Paris, La Différence, 2001-2004, p. 21
** “JP: O Banho Turco de Ingres foi o pretexto que deu início a uma mudança fundamental na minha pintura. Foi ele que serviu de esteio à organização de um jogo de curvas evidentes, que são de uma simplicidade quase geométrica e que vão delimitando os campos de cor e escrevendo as formas. O estudo do “linearismo” de Ingres articula o que ia aprendendo com os guaches recortados de Matisse.”
JF: Essa é também uma experiência de justaposição. N’O Banho Turco, encontramos essa situação de justaposição…
JP: Ou de coexistência…”. Entrevista de João Fernandes a Júlio Pomar in Júlio Pomar: Cadeia da Relação, Porto, Museu de Serralves/Civilização, 2008, pp. 45-47
*** L’Épure, 1977. Colagem e pintura acrílica sobre tela. 100 x 100 cm. Ver Júlio Pomar. Catalogue Raisonné (org. Alexandre Pomar), Vol. II, Paris, La Différence, 2001-2004. pp.164-165
**** Gilles Plazy, Théatre du Corps: Vingt Peintures Récentes de Júlio Pomar, Paris, Galerie Bellechasse, 1979.
***** Maria Velho da Costa, Corpo Verde. Desenhos de Júlio Pomar, Lisboa, Contexto, 1979, pp. 18-19.
Luísa Cardoso
Fevereiro 2015
Tipo | Valor | Unidades | Parte |
Largura | 73,1 | cm | papel |
Altura | 55,1 | cm | papel |
Tipo | A definir |
Data | A definir |
1/150 Gravar e Multiplicar - Gravuras da Colecção do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian |
Casa da Cerca - Centro de Arte Contemporânea |
Curadoria: Casa da Cerca - Centro de Arte Contemporânea |
31 de Janeiro de 2009 a 17 de Maio de 2009 Casa da Cerca |
exposição comissariada por Ana Vasconcelos, Emília Ferreira e António Canau (Comissário científico). |