• 1970
  • Tela
  • Tinta acrílica
  • Inv. 83P771

Júlio Pomar

Almada I

Almada Negreiros foi uma das primeiras personalidades da cultura portuguesa retratadas por Júlio Pomar, ao qual se juntariam, por exemplo, Fernando Pessoa, Luís de Camões ou, em moldes distintos, Mário de Sá Carneiro, Santa-Rita Pintor e Amadeo de Souza Cardoso (veja-se a obra Lusitânia no Bairro Latino (Retratos de Sá Carneiro, Santa-Rita Pintor e Amadeo de Souza Cardoso, pertencente à colecção do CAM).

Almada merecerá ainda dois outros retratos de Pomar (Almada II, de 1971-72, e Almada III, de 1972), começados em data posterior ao presente mas acabados anteriormente. Questionado sobre o surgimento de Almada na sua pintura, Pomar esclarece: “O Almada era uma personalidade fascinante, que nos seduzia e intrigava. O Nome de Guerra comprado nos tabuleiros… Hoje costumo dizer que houve dois homens no Portugal próximo-passado que de Portugal sabiam melhor do que ninguém e que sem os perceber não há Portugal (Lisboa?) que se perceba: um chamava-se António de Oliveira Salazar e reinou o mais longo reinado da história (que aprendíamos por reinados), outro José de Almada Negreiros e reina ainda no pensamento a-cultural que elaborou. Esses foram dos poucos que conheceram Portugal na carne e por dentro.”* Salazar também será retratado por Pomar, mas em data posterior e como ilustração para a obra de José Cardoso Pires Dinossauro Excelentíssimo.

Com a linguagem conquistada depois da série dos Banhos Turcos, este retrato, como outros que realiza, apresenta-se como um “brasão” ou “heráldica” da pessoa retratada: “Estas telas não são retratos, no sentido fotográfico do termo, mas brasões, panóplias: a pintura é uma prática invocatória”.** Mas nessa invocação — e este retrato de Almada foi feito de memória — a semelhança é para Pomar “fundamental”.*** Podemos assim reconhecer facilmente Almada no perfil proeminente do seu nariz e queixo, nas suas sobrancelhas expressivas, nos seus olhos desorbitados. No entanto, outras formas se juntam ao redor da evidência do seu rosto: “A semelhança funciona como a marca. É como que o nome escrito. O resto vem quase que involuntariamente e tem por função accrocher o personagem à tela.”****

Efectivamente, com uma paleta cromática limitada mas muito expressiva por empregar as cores puras, Pomar dispõe o rosto de Almada numa posição central, mas, sustentando o mesmo e “agarrando-o” à tela, surgem uma plêiade de outras formas, pontiagudas e curvilíneas, sugerindo sobreposições e animando o imenso amarelo do aparente fundo. Contudo, interessando-lhe tantos as formas como os intervalos entre estas e, consequentemente, problematizando a relação do fundo com as formas que não simplesmente se lhe justapõem, notamos como o rosto de Almada emerge do próprio fundo, assim tornado imagem, subvertendo as tradicionais relações entre estes dois elementos.

Toda a lição das camadas lisas de tinta de Ingres e dos guaches recortados de Matisse se encontra aqui reelaborada em síntese: “Há uma rigorosa definição das formas, um rigoroso isolar destas num espaço que rigorosamente as dispõe, segrega, faz gravitar. Organização do espaço essa que entre espaço e forma indetermina o primado. Aqui terá raiz a heráldica da minha pintura de retratos: brasões do corpo regidos por, ou regendo, um espaço tenso. Partindo dos aplats de Ingres e levado pelo seu ondulatório organizar-se, dei comigo diante da cor arquitecturada de Matisse, da grande proposta das suas guaches découpées que só por essa altura me parece ter começado a entender.”*****

 

Luísa Cardoso

Fevereiro 2015

 

* Helena Vaz da Silva com Júlio Pomar, Lisboa, Edições António Ramos, 1980, p. 98.

** Idem, p. 66.

*** Idem, p. 65.

**** Idem, p. 65.

***** Idem, p. 91.

TipoValorUnidadesParte
Altura163cmSuporte
Largura130cmSuporte
Altura166,5cmcom moldura
Largura133,5cmcom moldura
Tipo assinatura
TextoPOMAR
Posiçãoc.i.d.
Tipo data
Texto70-73
Posiçãoc.i.d.
Tipo legenda
TextoALMADA 70.72 POMAR
Posiçãona frente, q.s.e.
TipoAquisição
DataJulho 1983
Autobiografia
Sintra Museu de Arte Moderna
Curadoria: Sintra Museu de Arte Moderna
8 de Maio de 2004 a 28 de Novembro de 2004
Sintra Museu de Arte Moderna
Grande exposição de Júlio Pomar realizada pelo Sintra Museu da Arte Moderna com o apoio do Millennium BCP.
4º Prémio Amadeo de Souza-Cardoso: Júlio Pomar
Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso
Curadoria: Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso
13 de Setembro de 2003 a 2 de Novembro de 2003
Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso
Exposição realizada no âmbito da atribuição do Prémio Amadeo de Souza-Cardoso ao Mestre Júlio Pomar.
Pintura Portuguesa - Século XX
Câmara Municipal de Coimbra
Curadoria: Telo Morais
6 de Dezembro de 2001 a 27 de Janeiro de 2002
Casa Municipal da Cultura, Coimbra
Exposição que pretendeu retratar a produção de alguns pos pintores mais relevantes do século XX.
Atualização em 07 agosto 2023

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