A série Je t’aime moi non plus, a que pertencem estas imagens, é formalmente idêntica a Grand tourism, em que o artista se apropriou de um conjunto de postais das décadas de 50, 60 e 70. Agora porém, ao invés de escolher locais turísticos – reconhecíveis após um escrutínio apurado, de um olhar mais demorado sobre as imagens –, o tema da série são estâncias balneares de veraneio.

 

Partindo da refotografia dos postais, o autor escurece quase por completo toda a imagem, à excepção de um detalhe (uma figura humana), que, numa primeira instância, fixa a atenção do espectador.

 

Depois, é a ocultação que, revelando ainda assim alguma transparência, obriga a um olhar mais atento, para que se entenda o ambiente em que a personagem destacada se insere. E é justamente nesse olhar demorado que reside a essência da série, num trabalho que pretende questionar a percepção e o modo como o claro-escuro, ou o revelado-velado, funcionam em paralelo na descoberta de uma imagem.

 

O aparente nonsense da resposta «eu também não» à afirmação de «eu amo-te», no título da série, é uma provocação que funciona como linha de fractura na coerência de um discurso que invoca em simultâneo a negação e a afirmação como faces complementares de uma mesma realidade.

 

Formalmente, poder-se-iam invocar as ocultações com tinta-da-china e guache, que Fernando Azevedo fez sobre imagens fotográficas impressas na década de 50, como um antecedente deste tipo de técnica, ou mesmo rever nas imagens uma metáfora do mecanismo fisiológico da visão central e periférica – que distingue justamente cor e detalhe na zona em que fixamos o olhar, para, na periferia, nos dar conta apenas das mudanças da intensidade luminosa.

 

É porém talvez na invocação da memória – como mecanismo em que a dimensão do real se vai diluindo (esquecendo, ocultando) – que a referência à lógica do fragmento e às estratégias da recepção tenham aqui sentido, como processos de significação na série de imagens.

 

JO

Novembro de 2011