Nova obra de Sérgio Pombo no CAM

Em 2020, o CAM adquiriu para a sua coleção uma nova obra de Sérgio Pombo, que vem completar o conjunto de peças do artista representadas na coleção.
Luísa Cardoso 11 out 2022 3 min
Obras da Coleção do CAM

Começando a expor em finais da década de 1960, Sérgio Pombo (1947-2022) foi autor de uma produção diversificada, a qual vem sendo enquadrada na Pop Art, em certas estratégias do pós-conceptualismo ou no «regresso à pintura» dos anos de 1980. Transitando entre meios como a pintura, a escultura, o desenho, a serigrafia ou a fotografia, Pombo fez do corpo o eixo estruturante da sua pesquisa, criando uma figuração não-narrativa. «Todo o meu trabalho plástico», afirma o artista, «foi, desde o início, a tentativa de representar o corpo. O Homem e a Mulher. Nunca pintei paisagens e nunca me interessou a “pintura figurativa” enquanto modo de contar histórias.»[1]

Esta nova obra adquirida pelo CAM complementa um conjunto de outras obras já existentes no acervo. Neste conjunto é possível observar outra das características do artista: desde as pinturas mais abstratas até às esculturas aparentemente «hiper-realistas», notamos sempre o mesmo procedimento de análise pela decomposição, isolando um elemento para o ressignificar, transmutando assim o individual no universal, um tempo concreto num tempo abstrato.

Nesta obra, datada de 1978, Pombo dispõe dois elementos sobre um fundo verde: um plano rosa, bordejado de amarelo, e um plano negro, a destacar a figuração de um pé sobre um fundo branco. Ao confrontar a figuração do pé com o plano rosa abstrato (não sabemos se paisagem, se vazio, como diria Jorge Silva Melo), Pombo ambiciona torná-los signos de índole semelhante, transcendendo o seu carácter representativo e dotando a pintura de uma existência concreta no espaço: «Diluir o mais possível os limites da “tela”. Deixar viver a figura como objeto, apetecível, lento, despojado, monótono. Um signo. Uma letra. Quero colocar as minhas figuras na paisagem sem pintar uma paisagem por trás delas. Deixar viver a pintura na geometria do espaço, da sala, da galeria. Deixá-la flutuar no espaço real. Em qualquer circunstância.»[2]

A mesma imagem do pé feminino surge noutra obra do mesmo ano, de maiores dimensões. Há pois um procedimento de fragmentação, mas também de repetição: o mesmo elemento, ao surgir em diferentes composições, permite-nos acompanhar o desenvolvimento de um pensamento plástico, a sua ressignificação pelo contexto. Mas também a passagem do tempo e as transformações operadas pela memória nas suas revisitações: a imagem da mulher, «repetida, múltipla e sempre diferente», é um ícone que atravessa o seu trabalho, revelando «[u]m desejo erótico da memória» que continuamente reinterpreta o passado.[3]


[1] Sérgio Pombo: Obras, 1973-2017, Lisboa, Fundação Carmona e Costa/Documenta, 2019, p. 117.
[2] Idem, p. 118.
[3] Idem, p. 117.

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