Pedro Valdez Cardoso doa obra ao CAM

Doada pelo artista Pedro Valdez Cardoso, a instalação «Livro de Actos» integra agora a Coleção do Centro de Arte Moderna.
11 ago 2021

Livro de Actos foi exposta nas alcáçovas do Castelo de Sines em 2006, com uma relação com a dimensão histórica e cultural do local muito forte. As peças da instalação misturam no nosso imaginário guerreiros e armas, espírito lúdico e arte sacra. Alinhadas contra a parede, são espectrais e assustadoras, mas ao mesmo tempo dinâmicas, apelativas e reluzentes… Podem ser olhadas como um cemitério, um mostruário, um desfile, um repositório ou um acervo de relíquias e ornamentos.

Como escreveu, na altura, Sandra Vieira Jürgens[1], parecem «estandartes que expõem combinações ecléticas de objetos de diversa natureza: uma pá, um balde, remos, ossos, velas, latas de cerveja, caveiras, esfregonas, pás, armas, baús, tesouros…». Os estandartes remetem para valores coletivos, para a coesão de grupos, simbolizam poder sobre um território real ou imaterial. Mas algo de risível se expõe na presença de andas em vez de pernas, botas em vez de pés, cotos sem corpo e sem músculos.

 

Pedro Valdez Cardoso, «Livro de Actos» (pormenor), 2006. Inv. 21E1934. Foto: Nuno Moreira Inácio
Pedro Valdez Cardoso, «Livro de Actos» (pormenor), 2006. Inv. 21E1934. Foto: Nuno Moreira Inácio

 

Numa entrevista à Arte Capital em janeiro de 2015[2], o artista afirmava que a restrição a um só material industrial num conjunto anula a individualidade de cada peça e permite uma leitura uniforme de instalações ou peças complexas. Trata-se de um procedimento habitual no seu trabalho. Neste caso, o revestimento com folha de alumínio e fita de prata isolante confere ao conjunto uma qualidade refletora e cenográfica generalizada. Mas os efeitos distrativos da aparência coexistem com a descoberta inquieta dos detalhes.

 

Pedro Valdez Cardoso, «Livro de Actos» (pormenor), 2006. Inv. 21E1934. Foto: Nuno Moreira Inácio
Pedro Valdez Cardoso, «Livro de Actos» (pormenor), 2006. Inv. 21E1934. Foto: Nuno Moreira Inácio

 

Como diz Sérgio A. Fazenda Rodrigues[3], num texto assinado em 2016, o artista cruza «cultura popular e erudita, cultura de rua e de museu, cultura remota e contemporânea» e «as esculturas (…) apresentam uma natureza híbrida, onde a justaposição de referências ancestrais e de origem tribal (como, por exemplo, a máscara ou o totem) se cruzam com referências urbanas, de um tempo presente (como, por exemplo, o grafitti e as artes decorativas)».

Finalmente, o título, Os Actos dos Apóstolos, também chamados Livro de Actos ou Livro de Actos dos Apóstolos, situa a obra numa esfera religiosa que ela não «respeita», no sentido em que também convoca um vago desfile de carnaval e uma repentina expressão da inconsequência. Encostadas conta o muro e (in)animadas, as figuras do conjunto propõem uma sensação de desamparo e logro à nossa vontade de ir ao encontro delas.

 

Leonor Nazaré
Curadora

 

[1] Sandra Vieira Jürgens, «Pedro Valdez Cardoso. Livro dos Actos», 28 de janeiro de 2006. Texto disponível em: http://sandravieirajurgens.com/pedro-valdez-cardoso-livro-dos-actos

[2] Pedro Valdez Cardoso entrevistado por Victor Pinto da Fonseca, «Snapshot. No atelier de…», ArteCApital, 2015. Entrevista disponível em: https://www.artecapital.art/snapshot-12-pedro-valdez-cardoso

[3] Sérgio A. Fazenda Rodrigues, Comunicado de imprensa da exposição Pedro Valdez Cardoso. Margens. Galeria Caroline Pagès: 24 de setembro e 19 de novembro de 2016. Disponível em: http://www.carolinepages.com/index.php/141781

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