Em agosto de 1985, numa noite de lua cheia, o compositor de jazz e pioneiro do afrofuturismo Sun Ra apresentou no anfiteatro ao ar livre da Fundação o que foi descrito como «um ritual musical exemplar». As crónicas do evento narram um espetáculo memorável, que se terá estendido pela noite fora – conta-se que às quatro da manhã o público ainda pedia mais. Invocando este momento e a presença fantasmagórica de Sun Ra no jardim Gulbenkian, «Ecologias Imateriais» desdobra-se em torno das dimensões imateriais e espirituais da ecologia. Investigando diferentes formas de extrativismo para lá do seu significado material, o programa foca-se na alienação interior e no empobrecimento espiritual que estes processos de extração implicam.
Ao longo de três dias, o programa questiona as consequências do extrativismo em relação ao esgotamento da linguagem, à fadiga espiritual e ao fluxo de energias desperdiçadas ao mesmo tempo que especula sobre a possibilidade de se religar a terra e o corpo.
Reunindo diferentes disciplinas e práticas artísticas, o programa entrelaça contribuições de artistas, teóricos, poetas, cientistas e paisagistas para abordar estas dimensões imateriais enquanto condição fundamental para a compreensão das epistemologias extrativistas do presente e a sua abordagem material reducionista na imaginação de mundos e futuros diversos. Além de uma visão crítica sobre o materialismo ecológico vigente, o programa procura criar momentos para a partilha de formas invisibilizadas de conhecimento e de relação com o mundo, baseadas em ontologias não-produtivistas, indígenas, matriarcais, queer, campesinas e orientadas para as plantas.