Bartolomeu Cid dos Santos

1931 – 2008

Desiludido com o ensino artístico na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, Bartolomeu Cid dos Santos planeava a sua ida para Paris, após o contacto com críticos de arte no Congresso Internacional de História da Arte, realizado em Lisboa em 1949 e organizado pelo seu avô Reynaldo dos Santos. 

A aquisição de um livro intitulado Charmes de Londres mudaria completamente o seu rumo.** Fascinado com as fotografias a preto e branco de uma cidade em constante mudança e com aspectos do quotidiano londrino em vias de extinção, Bartolomeu Cid dos Santos candidata-se à Slade School of Fine Art, em Londres, onde nessa época João Cutileiro estudava, sendo admitido em 1956 a fim de frequentar a Full-Time Non-Diploma Student, por um ano.

 

Admitido no Curso de Pintura, rapidamente é aconselhado pelo seu tutor a conhecer Anthony Gross e integrar o Departamento de Gravura, por introduzir bastante negro nas suas aguarelas. No advento da gravura com influências da Pop Art, a gravura em Inglaterra era ainda marcadamente a preto e branco pelas técnicas de calcografia que engloba as técnicas em chapas de metal (cobre ou zinco) geralmente conhecidas por água-forte e água-tinta.

 

Aluno na Slade School até 1958 e admitido como professor em 1961, Bartolomeu Cid dos Santos dedica-se quase exclusivamente à gravura, desde 1956 até 2008, ano do seu falecimento. Em Londres, Bartolomeu Cid dos Santos encontrava-se quase sempre nas oficinas de gravura da Slade School of Fine Art. Sem condições financeiras e técnicas de possuir um atelier próprio, Bartolomeu Cid dos Santos executava e imprimia todas as suas gravuras na escola londrina, contribuindo de certa forma para uma aproximação com os seus alunos, estabelecendo um espírito colectivo em torno da gravura. Nas palavras do próprio, tal situação contribuiu para uma mudança estrutural no ensino de gravura.**

 

As suas primeiras gravuras da década de 50 são influenciadas pelas fotografias de Izis, publicadas no livro já citado Charmes de Londres. Bartolomeu Cid dos Santos grava aspectos da sua vivência com a cidade, num constante jogo de claro-escuro, onde o denso negro cria formas sob um fundo branco do papel. São disso exemplo as gravuras Chaminés de Londres, 1957 (GP1981), que marcadamente rasgam o céu ou O Tamisa em Chelsea, 1958 (GP50) onde vemos um rebocador atravessar a composição sem interferir na serenidade que a gravura transmite.

 

A viagem e a exploração são temas constantes e transversais na sua obra: Terra Incógnita (GP754; GP756; GP757; GP765; GP1082 e GP2179) e The Explorers (GP764) são alguns exemplos da imagética de Bartolomeu Cid dos Santos. Aurora ou Portuguese Men of War (GP1397 e GP1347) e O Barco dos Doidos (GP115) – gravura que lhe valeu o 1º Prémio na II Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, em 1961 – para além da ideia de viagem, remetem para a Guerra Colonial (1961-1974). A repressão política, a guerra e a violência são temas explorados ao longo da sua obra: como crítica ao regime do Estado Novo, Um amante, o zolofo da Pátria (GP393); Sem Título (“Este nunca está satisfeito”) (GP405) e Para que não voltem é preciso não esquecer (GP413); mas também, já no novo século com a invasão americana no Iraque, em 2004.

 

Na véspera de ir para os Estados Unidos da América para leccionar gravura na Universidade de Wisconsin em Madison, em 1969, Bartolomeu encontra-se com Paula Rego que lhe fala, pela primeira vez, da obra literária de Jorge Luís Borges. Já nos EUA, Bartolomeu Cid dos Santos encontra numa livraria os livros do escritor argentino. Fascinado com a sua obra, executa algumas gravuras abordando o tema dos labirintos (título de um dos livros de Borges): Atlantis (GP2176 e GP2192), Sem Título (GP2193) e The Secret Place (GP2178). A obra gravada de Bartolomeu Cid dos Santos influenciada por uma dimensão literária, directa ou indirectamente, destaca-se a nível nacional com a homenagem a duas figuras centrais: Cesário Verde, em Homenagem a Cesário, 1985 (05GP1937) e Fernando Pessoa nas gravuras O Poeta Alberto Caeiro, 1984 (GP293) e O Poeta Fernando Pessoa, 1984 (GP284).

 

Ao longo de cinco décadas, Bartolomeu Cid dos Santos com um exímio domínio da técnica explora a plasticidade e particularidade das diferentes técnicas de gravura, assumindo assim a matriz como um campo de experimentação. Explorando alguns temas com uma forte crítica social e política, Bartolomeu Cid dos Santos envereda também por outros temas, privilegiando, paisagens, naturezas-mortas ou figuras em cenários intimistas e silenciosos, cristalizando nas suas composições o tempo e o espaço.

 

Desenvolve a técnica de gravura a ácido sobre pedra para decoração mural, sendo de sua autoria a decoração da estação de metro de Entrecampos, em Lisboa. Membro da The Royal Society of Painter Printmakers, em Londres, Bartolomeu Cid dos Santos foi agraciado com diversos prémios, sendo nomeado, em 1996, Emeritus Professor in Fine Art of the London University.

 

O seu atelier em Tavira, que construiu após a sua jubilação da Slade School of Fine Art, foi reabilitado, após a sua morte, como Oficina Bartolomeu dos Santos, um espaço importante na divulgação da gravura, contando com a edição de cursos e residências artísticas assim como na promoção de exposições. 

 

 

* O livro, publicado pela editora suíça Guilde du Livre, contém fotografias de Izis – nome artístico do fotógrafo Israëllis Bidermanas – e textos de Jacques Prevert.

 

** Cf. Bartolomeu Cid dos Santos: entrevistas MELO, Jorge Silva – “Gravura: esta mútua aprendizagem” [documentação]. Documento electrónico, prod. [2007].

 

 

Inês Gomes 

Novembro 2014

Atualização em 10 março 2016

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