Exposição temporária da obra pictórica do artista português Julio/Saúl Dias (1902-1983), apresentada no Centre Culturel Calouste Gulbenkian (CCCG), sede da Delegação da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris, entre 14 de janeiro e 20 de fevereiro de 1993. Foram expostos cerca de 30 trabalhos, dos quais 25 eram datados das décadas de 1920 e 1930 e os restantes produzidos nos últimos anos de vida do artista, que, na sua atividade como poeta, utilizou sempre o pseudónimo de Saúl Dias. A inauguração contou com um recital de poesia, no qual Maria Barroso leu poemas de Saúl Dias.

No âmbito desta exposição, realizaram-se alguns eventos paralelos: nos dias 21, 26 e 28 de janeiro, as conferências «Régio et la culture française», por Eugénio Lisboa, «A Geração da Presença», por José Manuel Esteves, e «Julio et sa peinture», por Fernando de Azevedo; e, no dia 4 de fevereiro, um concerto para piano e violoncelo, interpretado por Paulo Gaio Lima e António Rosado.

A mostra visou divulgar a obra de Julio junto do público francês, reunindo obras cedidas por vários colecionadores privados, galerias e museus, selecionadas por José Alberto Reis Pereira, Maria de Lourdes Belchior, diretora do CCCG, e José Sommer Ribeiro, diretor do Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP). A produção da exposição resultou de uma parceria entre o CCCG o CAMJAP, com a coordenação de Maria Almeida Lima, da equipa do CAMJAP.

Irmão do poeta José Régio, de quem foi o principal ilustrador, Julio fez parte do grupo da revista Presença, cujo papel na consolidação do modernismo e da liberdade criativa foi fundamental. A sua obra, que se mantivera desconhecida do grande público até bastante tarde, só seria reconhecida com a grande exposição que a Fundação Calouste Gulbenkian lhe dedicou em 1979/1980.

Parafraseando Mário Soares, presidente da República, que no catálogo da exposição faz uma breve análise da obra de Julio, a sua obra conjuga uma expressão popular e tipicamente portuguesa, através da caricatura social, e a influência da obra de artistas europeus como Marc Chagall, Pablo Picasso, George Grosz e Otto Dix, resultando numa figuração onde ingenuidade e folclore se fundem, expressionismo e denúncia social (Julio. Le Peintre-Poète, 1993).

Como nota Luísa Soares de Oliveira, no artigo que escreve para o Público, são frequentes na obra de Julio personagens como «"burgueses" deformados e horrendos, prostitutas sem remissão, palhaços; mas estes são os palhaços dramáticos, que simbolizam o absurdo da existência humana» (Oliveira, Público, 12 jan. 1993, p. 31). Mas após «experiências sem continuidade com a arte de Kandinsky, dos surrealistas, de Picasso, […] Júlio […] dedica-se a explorar valores simbólicos e poéticos. […] Como se se auto-afastasse das grandes questões da arte do seu tempo» (Ibid., p. 31).

Nas palavras de Rosa Maria Oliveira, «a pintura inseparável da poesia deu ao pintor-poeta (Saúl Dias) essa sensibilidade forte que só se concretiza no seio de um espírito independente» (Oliveira, Letras e Letras, 17 fev. 1993, p. 13).

Carolina Gouveia Matias, 2018