Luciana Fina. Terceiro Andar

Doclisboa

Exposição individual de Luciana Fina (1962), que resultou da primeira colaboração entre a Fundação Calouste Gulbenkian e o Doclisboa. Foi apresentada uma videoinstalação intitulada Terceiro Andar, que abordou os temas da tradução, do amor e da construção de felicidade, através do diálogo entre uma mãe, Fatuma, e a sua filha, Aissato Baldé.
Temporary solo exhibition of work by Luciana Fina (1962) arising from the first collaboration between the Calouste Gulbenkian Foundation and Doclisboa. The show comprises the video installation Third Floor, which encompasses themes of translation, love and the construction of happiness, through a dialogue between a mother, Fatuma, and her child, Aissato Baldé.

Exposição resultante da primeira colaboração entre a Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) e o festival de cinema documentário Doclisboa. Terceiro Andar, de Luciana Fina (1962), esteve patente ao público de 21 de outubro de 2016 a 23 de janeiro de 2017 na Sala Polivalente do Centro de Arte Moderna (CAM).

A videoinstalação era constituída por um díptico, no qual se apresentava a história de uma mãe, Fatuma, e da sua filha, Aissato, através do diálogo entre as duas. A narrativa encontrava o seu lugar no terceiro andar de um prédio no Bairro das Colónias, em Lisboa, onde tanto esta família – uma família muçulmana numerosa, originária da Guiné-Bissau – como a realizadora residiam. Neste espaço de diálogo, Luciana Fina, cineasta italiana a residir em Lisboa, propunha várias reflexões, sobretudo no campo dos afetos.

A conversa mantida entre mãe e filha abordava o amor e a construção da felicidade, numa tradução simultânea por Aissato daquilo que era dito pela mãe. O som dos contos, poemas, cartas e rezas, em crioulo guineense, português e inglês trespassava as paredes, as portas e os corredores do seu andar e passava a ocupar as escadas e os vários patamares do prédio. Podia-se ainda escutar uma transmissão de rádio em italiano, tendo a realizadora optado por não traduzir todas as línguas faladas. Sobre a existência de vários dialetos em Terceiro Andar, Ricardo Vieira Lisboa notou que a cada um deles era atribuída uma função diferente: «A língua para as cartas de amor, a língua para as histórias e para as memórias, a língua para a comunicação diária.» (Lisboa, À Pala de Walsh, 15 jun. 2016)

A narrativa era conduzida horizontal e verticalmente. Se o primeiro momento era definido pelo diálogo e pela tradução estabelecidos entre mãe e filha, numa transferência horizontal de imagens de um ecrã para o outro, o eixo vertical da história mostrava o prédio, local da ação, na sua totalidade, descendo as escadas do edifício desde o último andar, onde residia Luciana Fina. Ao acompanhar a verticalidade do prédio, a realizadora introduz um tempo na narrativa e uma medida na relação entre esse tempo e a rotina que condiciona a dupla Fatuma/Aissato. Esta narrativa vertical acompanha o retrato de uma planta tropical de raízes aéreas, que atravessa todo o interior do prédio, desde o quinto andar, e que assume o papel de elemento condutor.

Manuela Synek comparou estas raízes a um «fio extenso que parece não terminar, podendo simbolizar a trama das ligações humanas e as marcas das linhas da memória que só o passado pode tornar vivo» (Synek, Umbigo, 4 jan. 2017).

Interior e exterior cruzam-se em Terceiro Andar através das janelas e portas abertas, pelas quais vão sendo revelados alguns detalhes arquitetónicos e decorativos da cidade de Lisboa, algo que surge frequentemente na obra de Luciana Fina, definindo-se já como marca autoral, e que nasce de uma vontade de estabelecer uma relação entre o cinema e a arquitetura.

O som era um dos elementos mais importantes desta instalação, materializado no diálogo entre as duas mulheres, em on ou em off, e noutros efeitos sonoros, como o bater do pilão de madeira, marco temporal que assinalava as 19 horas no prédio do Bairro das Colónias.

Esta videoinstalação foi também concebida como documentário de 62 minutos, exibido, primeiro, na Sala Polivalente da Coleção Moderna e, posteriormente, no Cinema Ideal. A transferência do filme de uma sala de cinema para uma sala de projeção num museu é parte integrante da prática artística desenvolvida por Luciana Fina e traduz o seu desejo de instigar o debate sobre o próprio cinema. O projeto apresentado na Galeria de Exposições Temporárias, concebido em específico para esse espaço, e a funcionar, portanto, num formato de site-specific, recorrente na obra da artista, distinguia-se pela sua duração inferior, de apenas 27 minutos, e por se desdobrar em telas de dois planos diferentes: um mais próximo do observador e outro mais distante.

Além destas diferenças entre as duas versões, a expositiva e a cinematográfica, a segunda incluía um conjunto de imagens menos apuradas, apresentadas num formato de 4:3, de uma «qualidade plástica mais porosa», que, segundo Ricardo Vieira Lisboa, «revelam mais uma vez – e desta vez de um ponto de vista puramente formal – as distâncias que se estabelecem afinal entre o objecto de galeria e o objecto de cinema» (Lisboa, À Pala de Walsh, 15 jun. 2016).

A exposição foi bem recebida pela imprensa portuguesa, sendo classificada como «magistral» por Manuela Synek, que, num artigo da revista Umbigo, incitava de imediato o leitor à sua visita: «Se ainda não teve a oportunidade de ver a instalação vídeo Terceiro Andar da cineasta italiana Luciana Fina sob a curadoria de Cíntia Gil e Davide Oberto, sugiro que vá vê-la, por ser magistral […].» (Synek, Umbigo, 4 jan. 2017)

No âmbito da exposição, foram programadas outras atividades desenvolvidas pela artista que «envolveram um conjunto de associações de refugiados e comunidades migrantes em Portugal, um projeto que visou integrar as práticas da criação artística contemporânea, num efetivo envolvimento entre Programação e Serviço Educativo. O projeto teve a colaboração do Programa Gulbenkian do Desenvolvimento Humano (PCDH)» (Relatório e Contas. FCG. 2016, 2017, p. 60).

Em simultâneo com a videoinstalação de Luciana Fina, foram exibidos na Sala Polivalente do CAM vários filmes, alguns deles também no âmbito da secção «Passagens», do Doclisboa, «que surge da convergência de dois movimentos recentes: a passagem do filme para os museus e a inclusão do documentário na arte contemporânea» (Doclisboa 2017).

No total, o público pôde ver no CAM 33 dos filmes originalmente integrados em várias secções do Doclisboa: «Filmes de Correspondência – Missivas, Distâncias, Deslocações», «Riscos/New Visions», «Heart Beat», «Competição Portuguesa» (da qual fez parte Terceiro Andar, na sua versão cinematográfica) e «Competição Internacional», que incluiu diversas estreias portuguesas, europeias e mundiais. Esta mostra decorreu entre 21 e 30 de outubro de 2016.

Carolina Gouveia Matias, 2019


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Eventos Paralelos

Ciclo de cinema

Doclisboa'16

21 out 2016 – 30 out 2016
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna – Sala Polivalente
Lisboa, Portugal

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2002 / Sede Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa

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