Segunda edição da exposição bienal «European Photo Exhibition Award», um evento desenvolvido por quatro fundações europeias – a Fundação Calouste Gulbenkian (Portugal), a Fondazione Banca del Monte di Lucca (Itália), a Körber-Stiftung (Alemanha) e o Fritt Ord Foundation (Noruega) – com o intuito de criar «a free space where socially relevant topics concerning Europe are developed and discussed by talented young photographers who live and work in Europe» (European Photo Exhibition Award 02, 2014, p. 7).

A temática proposta para reflexão nesta edição foi «o novo social», designação usada para caracterizar as situações resultantes das novas formas de tensão social na Europa, em grande medida decorrentes da crise financeira e económica que assolou o mundo em 2008. Com vista a promover o debate sobre esta problemática foram escolhidos doze fotógrafos, oriundos de geografias, culturas e contextos sociais distintos. A origem dos fotógrafos determinou, em grande medida, os subtemas escolhidos.

O processo de seleção dos participantes seguiu o modelo instituído na primeira edição: cada instituição convidava um curador, que selecionava três fotógrafos com os quais trabalharia, acompanhando de perto os seus projetos. A exposição destes projetos nas várias instituições participantes seria da responsabilidade do respetivo curador convidado. Deste modo, diferentes olhares dariam origem a diferentes diálogos e relações.

Os curadores (os mesmos da edição anterior) juntaram um grupo diversificado de fotógrafos, alguns deles artistas visuais, outros com ligações mais fortes ao fotojornalismo. Sérgio Mah, curador convidado pela Fondation Calouste Gulbenkian – Délégation en France, optou por trabalhar com dois artistas portugueses e um francês: Patrícia Almeida (1970-2017), que explorava as possibilidades da fotografia documental enquanto campo visual; André Cepeda (1976), artista visual com um trabalho fotográfico centrado na observação quotidiana das condições espaciais, sociais e históricas da cidade do Porto; e Eric Giraudet de Boudemange (1983), que então aliava a fotografia à performance e ao vídeo, em projetos que aprofundavam práticas e processos ancestrais praticamente esquecidos.

Apesar de propositadamente concebidos para esta exposição, alguns projetos possuíam um historial, como era o caso de My Life Is Going to Change, de Patrícia Almeida, uma instalação que partia de um arquivo visual iniciado em 2011. Este era encarado pela artista como um arquivo vivo, gerando vários trabalhos que refletiam sobre o poder da imagem. A presença da imagem fotográfica surgia nesta instalação quer através da sua omissão, quer pela reprodução e apropriação. No extremo oposto, encontrava-se a série de André Cepeda, captada na cidade do Porto e produzida com uma câmara de grande formato. Intitulada Fade, reúne imagens a cores e a preto-e-branco que mostram ambientes interiores e exteriores, com e sem a presença humana. Mais do que o que as imagens revelam, importa o modo como essa revelação é feita, salientando através da exploração da luz a mediação operada pela fotografia. Também a proposta de Eric Giraudet de Boudemange, The Thorn Birds (2013), tinha origem num projeto anterior, iniciado em 2012, em Auby, por ocasião de uma residência artística. Os resultados da aproximação do artista à prática da criação de pombos e o seu questionamento na contemporaneidade foram apresentados através de um conjunto de fotografias e de um vídeo, que põem em confronto aquela prática e os seus seguidores.

Os projetos apresentados pelos fotógrafos selecionados por Enrico Stefanelli variavam entre o registo fotojornalístico (Massimo Berruti), a encenação (Jan Brykczynski) e o retrato (Simona Ghizzoni), aprofundando temas ligados a manifestações de democracia, consequências da longevidade, a solidão e o abandono.

Os trabalhos escolhidos pelo curador Rune Eraker foram motivados por realidades vividas na Europa Setentrional, com as quais os fotógrafos possuíam ligações mais ou menos próximas. Jovens, casais homossexuais e figuras excêntricas são os grupos fotografados por Linda Bournane Engelberth (1977), Arja Hyytiäinen (1974) e Espen Rasmussen (1976), trazendo para o debate uma série de transformações sociais enfrentadas pela juventude na Letónia, como a falta de emprego e, consequentemente, de perspetivas de futuro, ou o modo como a sociedade norueguesa trata os indivíduos que escolhem outros modos de vida, e a necessidade do alargamento do conceito de família. No caso de Hyytiäinen e Rasmussen, foram experiências pessoais que deram origem aos seus projetos, reveladores de alterações em curso.

Questões de género e a discriminação de quem vive à margem da sociedade foram abordados por outros fotógrafos, como Stephanie Steinkopf (1978) e Paula Winkler (1980), selecionadas por Ingo Taubhorn. Vogelfrei, de Steinkopf, e Centerfolds, de Winkler, questionam as linhas que separam dois mundos – no caso da primeira, o feminino e o masculino; no caso da segunda, a comunidade sem-abrigo e a população com casa. A questão da diferença e o modo como a sociedade lida com ela era a questão-chave deste grupo de trabalhos, ao qual se juntou Otpusk – Out of the Blue, de Kirill Golovchenko, que escolheu fotografar a praia como lugar inclusivo, verdadeiramente democrático, uma conquista da Ucrânia pós-soviética.

A reunião de todos estes projetos e as suas possíveis correlações deu origem a «Horizons», título escolhido para a exposição, remetendo igualmente para a ideia de destino ou futuro da Europa, tendo em consideração os cenários observados.

Para a exposição na Fondation Calouste Gulbenkian – Délégation en France, Sérgio Mah seguiu sensivelmente a mesma linha de orientação da edição anterior. Deste modo, aspetos comuns em termos temáticos determinaram a disposição das obras no espaço. Formaram-se, assim, núcleos que mostravam grupos sociais negligenciados, como Things Come Apart e Oddballs (ambos de 2013); a luta por novos valores e direitos, como Çapulcu (2013), Family (2013) e Centerfolds (2013); novos hábitos e realidades, como While You Were Sleeping (2013) e Otpusk – Out of the Blue (s.d.); lugares que oscilam entre o urbano e o rural, como Things Come Apart, Oddballs e Fade (2013). Além da denúncia e da crítica, evidente por exemplo na sala que juntava dois trabalhos que, cada um à sua maneira, criticam o modo como a comunicação social usa as imagens – My Life Is Going to Change (2011-2013) e Vogelfrei (2013) –, alguns dos trabalhos apresentados procuravam contribuir para a mudança positiva, nomeadamente Family ou Centerfolds.

Por outro lado, esta opção curatorial transmitia uma ideia de projeto conjunto. Apesar de as escolhas dos artistas serem levadas a cabo individualmente por cada curador, os projetos a desenvolver foram debatidos num workshop onde todos participaram, sem estarem associados ao curador responsável.

Para acompanhar este projeto, foi produzida conjuntamente uma publicação que reunia reproduções de todas as séries fotográficas apresentadas, acompanhadas por breves textos da autoria dos artistas ou dos curadores que os selecionaram. O texto de abertura do catálogo, que aprofunda a problemática em análise, é da autoria do professor de história da arte Sigrid Lien.

Com este encontro, dava-se continuidade à relação de parceria entre a Fundação Calouste Gulbenkian e as três instituições europeias mencionadas, que resultaria em mais uma edição deste projeto.

Mariana Roquette Teixeira, 2019