Manuela Marques. La taille de ce vent est un triangle dans l'eau

Exposição temporária e individual da obra fotográfica de Manuela Marques (1959), comissariada por Sérgio Mah. A exposição, que apresentou o trabalho mais recente da artista luso-francesa, dedicado ao entendimento poético e intimista da realidade vivida, foi amplamente divulgada pela imprensa francesa e portuguesa.
Temporary solo exhibition of photography by Manuela Marques (1959) curated by Sérgio Mah. The exhibition, which presented the most recent work of the Portuguese-French artist, was dedicated to a poetic and intimate understanding of lived reality. It was widely publicised in the French and Portuguese press.

De 30 de abril a 26 de julho de 2014, a Fondation Calouste Gulbenkian – Délégation en France apresentou a exposição «Manuela Marques. La taille de ce vent est un triangle dans l'eau», comissariada por Sérgio Mah. A inauguração, que teve lugar a 29 de abril, contou com a presença de Artur Santos Silva, antigo presidente da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), de Isabel Mota, então administradora da FCG, da artista e do comissário.

A exposição apresentou a obra fotográfica mais recente de Manuela Marques (1959), artista luso-francesa vencedora do prémio BES Photo 2011, reunindo um conjunto de linhas que definem a sua prática artística desde a segunda metade de 1990, altura em que começou a desenvolver um trabalho caracterizado pela inclusão de uma imaginação intimista e poética nas suas obras. Foi também apresentado um vídeo projetado no teto, que mostrava o movimento da água, contribuindo para quebrar um sentimento de «enguiço do imobilismo e a anunciar que as imagens (as fotográficas também) estão longe de uma existência petrificada» (Gomes, Público, 9 mai. 2014).

A produção de «La taille de ce vent est un triangle dans l'eau», cujo título foi pedido de empréstimo ao poema «Grafia 1», de Fiama Hasse Pais Brandão, inseriu-se numa das linhas condutoras da programação da FCG – Délégation en France, assente na divulgação em França de artistas portugueses e no seu contributo para a representação da arte contemporânea. «C'est une opportunité pour le public, initié ou non, de découvrir l'intranquillité qui habite cette artiste», referiu Artur Santos Silva (Manuela Marques. La taille de ce vent est un triangle dans l'eau, 2014, p. 131).

Para Sérgio Mah, o trabalho de Manuela Marques insere-se numa prática fotográfica contemporânea associada à expressão poética e a um exercício especulativo, ficcional e reflexivo de interpretação da realidade vivida. Este traduz-se num entendimento da imagem que passa pela distanciação do seu significado como mera tradução direta da realidade, sublinhando assim o caráter expressivo e dinâmico da fotografia, algo que a artista explicou em entrevista ao Público: «Utilizo-a [a fotografia] muitas vezes como se estivesse a negar as suas funções mais básicas. Utilizo-a como uma espécie de contra-indicação para problematizar a percepção que temos do real e dos espaços que nos rodeiam. Inverto as regras do jogo, procuro as coisas menos evidentes.» (Gomes, Público, 9 mai. 2014)

Distribuído por cinco salas da Délégation en France, o conjunto dos cerca de 30 trabalhos apresentados era revelador de uma iconografia desenvolvida à volta de três elementos fulcrais: ar, madeira e pedra, transformados de várias formas que realçavam o seu valor simbólico. No entanto, a seleção destas fotografias não pretendia obedecer a nenhuma lógica temática, cronológica ou narrativa, tendo a artista optado antes por apresentar um campo de experimentação das relações de afastamento e proximidade entre a realidade e a imagem e o plano dos sentidos desencadeados pela fotografia. Os protagonistas destas fotografias, elementos da natureza, como pedras, árvores e outros materiais orgânicos, contrastavam com faces, mãos e pormenores arquitetónicos, encenados com o objetivo de questionar estratos de uma realidade percecionada pelo público como axiomática.

Também o percurso expositivo foi concebido com este intuito, reforçando o sentimento de dúvida provocado pela fotografia, respeitando a máxima de que a perceção é influenciada pelo modo como os objetos são apresentados. Assim, a exposição era iniciada com um retrato feminino em tronco nu, voltado para o espaço da sala que, segundo Sérgio B. Gomes, acompanharia visualmente o espectador, fornecendo pistas para o modo de ler os trabalhos e lembrando-o constantemente do olhar de retorno das imagens. A importância desta figura para a exposição e para a obra de Manuela Marques ficou registada nas análises que o comissário e Michel Poivert fizeram dela: enquanto Sérgio Mah referiu a dupla possibilidade existente nela de ver e ser vista, ou a metáfora de um espelho, elemento regular na obra de Manuela Marques, Michel Poivert convocou a presença de Phyntia, figura associada à leitura e transcrição de oráculos, em Delfos, na Grécia Antiga, por revelar informações sobre o valor da imagem e sobre a recusa de a assumir como mera tradução da realidade.

Nesta fotografia coexistem valores de oposição caros à obra de Marques (o que é visto e o que é percecionado, realidade e imaginação), além do pendor performativo e teatral que define a sua prática artística, através da presença do gesto. Este, muitas vezes, encontra-se representado nas mãos que tocam, agarram, arranham e atiram, protagonizando grande parte das ações fotografadas. É também a presença das mãos que confere ao trabalho uma perspetiva humana, de proximidade e afastamento, controlados pela própria fotógrafa, e que revelavam a sua vontade de atribuir uma componente táctil e física à dimensão visual intrínseca da fotografia.

O final do trajeto expositivo era marcado pela presença de «retratos», embora, nesse caso, de pedras que surgiam como formas abstratas desfocadas, sugerindo a excessiva aproximação da fotógrafa ao objeto fotografado. A grande proximidade traduzia um registo intimista, mas era isenta de intuito autobiográfico, presente noutras obras de Marques. Neste registo, a intimidade surgia ligada à necessidade de estar mais próxima dos objetos para criação de um confronto físico entre estes e o espectador.

Com um dossiê de imprensa generoso, «La taille de ce vent» foi largamente divulgada pela Délégation en France nos media franceses. Catorze periódicos escreveram artigos sobre a exposição, entre os quais Paris Art, M – Magazine du Monde, Le Quotidien de l'Art e Paris Capitale. Também em Portugal foram várias as publicações que se debruçaram sobre a exposição, com destaque para o suplemento Ípsilon, do jornal Público, no qual constou um artigo assinado por Sérgio B. Gomes, que esteve em Paris a convite da Fondation Calouste Gulbenkian – Délégation en France.

Para este jornalista, os intuitos do percurso expositivo foram cumpridos, convidando o público a entrar num jogo que envolvia mais do que a visão: «São fotografias (e um vídeo) que nos recordam que a experiência do ver e a recepção das imagens estão para lá da capacidade física dos olhos. São trabalhos que pedem para ser vistos não apenas com o olhar, mas sobretudo com o pensamento e com a certeza de que é impossível experimentá-los sem a memória (a nossa, a da autora e das imagens).» (Ibid.)

Depois de Paris, a exposição foi apresentada no Centre Régional de la Photographie Nord-Pas-de-Calais, entre 6 de dezembro de 2014 e 15 de fevereiro de 2015.

Carolina Gouveia Matias, 2020


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Publicações


Material Gráfico


Fotografias

Manuela Marques
Isabel Mota (à esq.), Manuela Marques e Sérgio Mah (ao centro) e Artur Santos Silva (à dir.)
Manuela Marques (à esq.)
João Manuel Caraça (à esq.)
Artur Santos Silva e Isabel Mota
Miguel Magalhães
Manuela Marques (ao centro)
Miguel Magalhães (à esq.) e João Manuel Caraça (à dir.)

Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 129318

Coleção fotográfica, cor: inauguração (FCG-Délégation en France, Paris) 2014


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