No verão de 2005, o Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP) cedeu algumas das obras da sua coleção para uma exposição coletiva na vila de Porto de Mós. Sob o título «Desenhos e Esculturas do CAMJAP» a iniciativa integrou a agenda das comemorações dos 700 anos do primeiro foral daquela vila – documento de substancial relevância histórica, emitido em 1305, durante o reinado de D. Dinis.

A exposição foi apresentada no castelo da vila, de 8 a 28 de julho de 2008. Reuniu cerca de duas dezenas de obras de 12 artistas destacados do panorama da arte contemporânea portuguesa. Possibilitou um vislumbre sobre alguns aspetos salientes da produção artística das décadas de 1980, 1990 e 2000 em Portugal, dos territórios mais gráficos e pictóricos aos processos escultóricos, passando pelo objeto apropriado e pela fotografia.

Comecemos pelos trabalhos de desenho e pintura sobre papel: Julião Sarmento (1948-2021) foi representado pelo erotismo da peça Noites Brancas, de 1982 (Inv. 96DP1637). Já Pedro Proença (1962) expôs três dos seus desenhos horizontais, de 1995 (Invs. 95DP1697; 95DP1693; 95DP1692), com jogos de simetria e personagens de imbrincadas simbologias, cujos laivos de animalismo medieval se terão entrecruzado com a atmosfera do castelo e da ocasião que então se celebrava. De Pedro Gomes (1972) apresentou-se uma das vistas urbanas (Inv. 96DP1703) da série Habitar, de 1996, com uma mancha pacientemente sistematizada a esferográfica. Outro tipo de paisagismo esquemático é trazido pelos guaches coloridos de Alexandre Conefrey (1961): Haiku, de 2002 (Inv. 04DP1823), envolvendo guache, aguarela e folha de ouro, e Das Boot, de 2004 (Inv. 04DP1824) – ambos com reminiscências da estampa japonesa de gravadores como Hokusai ou Hiroshige. No campo da abstração, expuseram-se quatro desenhos horizontais e rítmicos de António Palolo (1956-2000), pertencentes a uma série apresentada na FCG em 1992 (Invs. 92DP1604; 92DP1605; 92DP1606; 90DP1613). Igualmente assentes sobre dinâmicas de geometrização, foram apresentados dois desenhos de Rui Sanches (1954) (Invs. 91DP1538; 91DP1537), ao invés da mais conhecida vertente escultórica do seu trabalho. Gaëtan (1944-2019), por sua vez, expôs desenhos da série Troppa Lucce (Inv. DP1721 1-5), de 1998. Introduz fortemente a temática da autorrepresentação, que também sobressai na série a que pertence o desenho Os Cegos de Praga XII (Inv. 98DP1715) de Pedro Cabrita Reis (1956). Deste artista, foi também instalada uma peça escultórica: A Casa do Esquecimento, de 1990 (Inv. 93E301). De Rui Chafes (1966) foram apresentadas duas esculturas muito distintas entre si: a suspensa e mais antropomórfica Würzburg Bolton Landing I, de 1994 (Inv. 95E355), e a A Manhã I, de 1994 (Inv. 93E302), que se desenvolve junto ao solo. A tridimensionalidade adquiria uma vertente extremamente pictórica na obra de Xana (1959), autor de quem também foi integrada uma peça (Inv. 93E307). A mistura de categorizações artísticas foi ainda confirmada pela obra de Helena Almeida (1934-2018), através de uma das suas séries intituladas Desenho Habitado, neste caso de 1976 (Inv. 94FP378). A artista fotografa as suas próprias mãos desenhando uma linha, que aparece também traçada a caneta sobre o próprio papel fotográfico, e coisificada como linha de costura, colada no suporte, e lançando-se para cá da imagem.

O Relatório Balanço e Contas da Fundação Calouste Gulbenkian. Ano de 2005 indica que também foram apresentados dois desenhos de Fernando Calhau (1948-2002). A mesma edição informa que o comissariado da exposição ficou a cargo de José António Nunes de Oliveira.

«Desenhos e Esculturas do CAMJAP» foi uma das várias iniciativas conjuntas entre a Câmara Municipal de Porto de Mós e a Fundação Calouste Gulbenkian no início dos anos 2000, no âmbito de exposições itinerantes de obras do acervo da coleção do Centro de Arte Moderna, que circularam por vários municípios do país. Relembre-se a apresentação de gravuras de Henry Moore, que chega ao Castelo de Porto de Mós em 2004, ou a mostra de aguarelas de Roque Gameiro, acolhida no mesmo espaço em 2003.

Daniel Peres, 2019