• 1913
  • Guache sobre papel
  • Inv. 87DP335

Amadeo de Souza-Cardoso

Canção d’Açude – Poema em Cor

Canção d’açude poema em cor é um poema-pintura que faz parte dos materiais produzidos no contexto da Corporation Nouvelle, projeto coletivo que previa a edição de publicações e a organização de exposições internacionais e itinerantes que foi desenvolvido por Robert e Sonia Delaunay durante a sua estada em Portugal em 1915 e 1916 e contou com a colaboração dos artistas portugueses Amadeo de Souza-Cardoso, Eduardo Viana e José de Almada Negreiros. Contendo possíveis referentes regionais, como a ponte D. Maria Pia no Porto, o aqueduto de Vila do Conde e a ponte de São Gonçalo em Amarante,[1] bem como letras de uma canção popular, esta pequena composição cristaliza o interesse do grupo pela arte popular. Além do destaque dado ao artesanato e a bonecos regionais nas obras do casal Delaunay, de Viana e de Amadeo, o último representaria igualmente máscaras típicas do norte de Portugal (os caretos de Podence, que têm um ritual especialmente intenso no Carnaval).

O pochoir era a técnica uniformizadora da Corporation Nouvelle. Na correspondência com os Delaunay, Amadeo confessava a sua resistência aos escantilhões, que o “tornavam escravo”.[2] No entanto, o pintor já tinha recorrido a esta técnica na pintura Poème-Prière [Poema-Oração], de 1913, e acabaria por usar o pochoir na sua “imagem de marca” — a icónica assinatura reprodutível “amadeo / de souza / c ardoso”, que se tornaria parte integrante de muitas das suas obras durante a Primeira Guerra Mundial.  

Além de um trabalho dos Delaunay em torno da relação entre texto/imagem que vinha da Prose du Transsibérien e de la Petite Jehanne de France, escrito por Blaise Cendrars e ilustrado por Sonia Delaunay, e do próprio Poème-Prière de Amadeo, onde se inscreve uma oração, os escantilhões prestavam-se bem às letras e, como tal, às potencialidades da inscrição do texto que foram exploradas nesta pintura e em Serrana poema em cor, obra “gémea” de Canção d’Açude ao nível do grafismo, da técnica e da dimensão.

Em ambos os casos, Amadeo introduz na composição letras de canções populares que seriam da região. De momento, as pesquisas etnográficas não nos permitem resgatar a melodia, mas encontra-se no espólio do artista um manuscrito de 1913 com a transcrição destas letras. Na segunda estrofe, lê-se “Os moleiros — Os moleiros desta açude / adoram a Virgem toda de branco / porque, Christo seja louvado, / os moleiros desta açude / adoram a farinha”, excerto que passou para a pintura quase na totalidade.

Amadeo viria a dedicar grande atenção à música, atribuindo aos instrumentos musicais uma especial vitalidade. Esta obra revela outra faceta do pintor mais direcionada para a etnografia, interesse que se expressou igualmente na sua publicação da tradução francesa de “Chansons Portugaises chantées en des fêtes populaires” [Canções Portuguesas cantadas em festas populares] na revista La Vie em agosto de 1912[3].

 

Marta Soares


[1] Joana Cunha Leal, “A Long-Distance Call? Social Space and Corporation Nouvelle’s places of production”, Visual Resources, nº 35, 2019, pp. 8-12.

[2] Amadeo de Souza-Cardoso, Carta a Robert Delaunay, 11 de junho de 1915, publicada em Paulo Ferreira (ed.), Correspondance de quatre artistes portugais Almada Negreiros, José Pacheco, Souza-Cardoso, Eduardo Viana avec Robert et Sonia Delaunay, Paris: PUF; Fondation Calouste Gulbenkian Paris, 1981, p. 69.

[3] Catarina Alfaro, “Biographie”, in Helena de Freitas (ed.), Amadeo de Souza-Cardoso, Paris: Réunion des Musées Nationaux; Grand Palais, 2016, p. 275.

TipoValorUnidadesParte
Altura23,8cm
Largura33,1cm
Tipooutras
TextoOs moleiros/deste açude/ adoram a /virgem/ toda de branco/ Os moleiros /deste açude adoram /a farinha.
PosiçãoOcupa a superfície do desenho.
TipoDoação
DataJaneiro de 1987
Exposição de Pintura (Abstracionismo): amadeo de souza-cardoso
Porto, [s.n.], 1916
Catálogo
Exposição de Pintura: amadeo souza-cardoso
Lisboa, [s.n.], 1916
Catálogo
1887-1987 centenário do nascimento de amadeo de souza-cardoso
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1987
Catálogo
História da arte em Portugal: Pioneiros da modernidade. Vol. 12
Lisboa, Alfa, 1988
Monografia
Amadeo de Souza-Cardoso: diálogo de vanguardas
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian. Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão, Assírio & Alvim, 2006
Catálogo
La légende de Saint Julien l'hospitalier. Edição facsimilada
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian. Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão, 2006
Monografia
Amadeo de Souza-Cardoso (1887-1918): Ein pionier aus Portugal
Hamburg, Ernst Barlach Haus, 2007
Catálogo
Exposição de Pintura: amadeo de souza-cardoso
4 de Dezembro a 12 de Dezembro de 1916
Liga Naval de Lisboa, Palácio do Calhariz
Exposição de Pintura (Abstracionismo): amadeo de souza- cardoso
1 de Novembro a 12 de Novembro de 1916
Salão de Festas do Jardim de Passos Manoel
1887-1987 centenário do nascimento de amadeo de souza- cardoso
Fundação Calouste Gulbenkian
Curadoria: Fundação Calouste Gulbenkian
20 de Julho de 1987 a 31 de Outubro de 1987
Fundação Calouste Gulbenkian
Amadeo de Souza-Cardoso: diálogo de vanguardas
Curadoria: FREITAS, Helena de
15 de Novembro de 2006 a 15 de Janeiro de 2007
Fundação Calouste Gulbenkian
Atualização em 04 abril 2024

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