Tchaikovsky: Concerto para Piano n.º 1
Orquestra Gulbenkian / Nuno Coelho / Lucas Debargue
O Concerto para Piano e Orquestra n.º 1, em Si bemol menor, op. 23, constitui o marco inaugural da produção concertante de Piotr Ilitch Tchaikovsky. A partitura foi concluída em fevereiro de 1875, vindo a conhecer revisões subsequentes, em 1876 e 1888. O primeiro impulso do músico foi procurar o amigo e pianista virtuoso Nikolai Rubinstein, de quem recebeu uma apreciação muito negativa, face às dificuldades da escrita para o solista. Reconhecendo mais tarde a valia estética e estilística da obra, situada na esteira dos concertos para piano de Liszt, Rubinstein viria a tornar-se, curiosamente, um dos intérpretes de eleição do Concerto op. 23, o qual chegou a tocar por ocasião do ciclo de “concertos russos” da Exposição Universal de Paris, em 1878. Contudo, não foi a tempo de contrariar a decisão de Tchaikovsky que, desiludido com a reação do amigo, veio a designar outro pianista para a estreia do seu Concerto n.º 1 – o carismático Hans von Bülow, o qual se preparava para uma digressão nos Estados Unidos da América. Foi, pois, com a Orquestra do Boston Music Hall, sob a direção do maestro norte-americano Benjamin Johnson Lang, que o pianista germânico protagonizou a primeira audição pública do Concerto n.º 1, a 25 de outubro de 1875.
A brilhante introdução do primeiro andamento anuncia, desde logo, a acentuada interação entre a orquestra e o piano, por via da partilha de um tema intenso e emocionalmente arrebatado. O andamento prossegue sobre uma estrutura de sonata marcada pela diversidade temática, com amplas passagens para os enunciados melódicos do solista, sobretudo na cadência final.
Com o segundo andamento introduz uma atmosfera contrastante, liderada pelo solo da flauta transversal, na tonalidade mediante de Ré bemol maior. O compositor opta aqui por um discurso musical simples e despojado. Na secção central, mais agitada, emerge a citação de uma cançoneta popular francesa, Il faut s’amuser, danser et rire.
Fazendo apelo às convenções do género, Tchaikovsky encerra o Concerto com um Allegro con fuoco inspirado na forma de rondó-sonata, cujo refrão deve o perfil melódico a um tema tradicional ucraniano. Este poderoso elemento propulsor alterna com secções sinfónicas mais alargadas, pelo que o resultado se constitui como uma súmula entre a sugestão coreográfica reminiscente da dança e o idioma instrumental puro que foi apanágio da vivência artística do Romantismo tardio.
Intérpretes
- Maestro
- Piano
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Orquestra Gulbenkian
Em 1962 a Fundação Calouste Gulbenkian decidiu estabelecer um agrupamento orquestral permanente. No início constituído apenas por doze elementos, foi originalmente designado por Orquestra de Câmara Gulbenkian. Ao longo de sessenta anos de atividade, a Orquestra Gulbenkian (denominação adotada desde 1971) foi sendo progressivamente alargada, contando hoje com um efetivo de cerca de sessenta instrumentistas, que pode ser expandido de acordo com as exigências de cada programa. Esta constituição permite à Orquestra Gulbenkian interpretar um amplo repertório, do Barroco até à música contemporânea. Obras pertencentes ao repertório corrente das grandes formações sinfónicas podem também ser interpretadas pela Orquestra Gulbenkian em versões mais próximas dos efetivos orquestrais para que foram originalmente concebidas, no que respeita ao equilíbrio da respetiva arquitetura sonora.
Em cada temporada, a Orquestra Gulbenkian realiza uma série regular de concertos no Grande Auditório, em Lisboa, em cujo âmbito colabora com os maiores nomes do mundo da música, nomeadamente maestros e solistas. Atua também com regularidade noutros palcos nacionais, cumprindo desta forma uma significativa função descentralizadora. No plano internacional, a Orquestra Gulbenkian foi ampliando gradualmente a sua atividade, tendo efetuado digressões na Europa, na Ásia, em África e nas Américas. No plano discográfico, o nome da Orquestra Gulbenkian encontra-se associado às editoras Philips, Deutsche Grammophon, Hyperion, Teldec, Erato, Adès, Nimbus, Lyrinx, Naïve e Pentatone, entre outras, tendo esta sua atividade sido distinguida, desde muito cedo, com diversos prémios internacionais de grande prestígio. O finlandês Hannu Lintu é o Maestro Titular da Orquestra Gulbenkian, sucedendo a Lorenzo Viotti.
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Nuno Coelho
Maestro Convidado
Na temporada 2022/23, Nuno Coelho é o novo Maestro Principal e Diretor Artístico da Orquestra Sinfónica do Principado das Astúrias e cumpre o quinto ano como Maestro Convidado da Orquestra Gulbenkian, que dirige numa produção da visão de José Saramago da ópera Don Giovanni de Mozart, em comemoração do centenário do escritor. Outras atuações de destaque incluem estreias com a Orquestra do Real Concertgebouw de Amesterdão, a Filarmónica de Tampere e a Sinfonieorchester St Gallen, novas colaborações com a Sinfónica de Amberes e a Sinfónica de Tenerife e uma digressão com a Jovem Orquestra Nacional de Espanha.
Na temporada passada estreou-se à frente da Filarmónica de Helsínquia, da Dresdner Philharmonie, da Staatsorchester Hannover, da Filarmónica do Luxemburgo, das Sinfónicas de Gävle e Malmö, da HET Residentie Orkest, da Filarmónica de Estrasburgo e da Orquestra Nacional de Lille. Reforçou o seu relacionamento com as Sinfónicas da Galiza e de Barcelona. Em março de 2022, na Fundação Gulbenkian, dirigiu uma produção semi-encenada de Così fan tutte, expandindo o seu repertório de ópera que abarca produções de La traviata, Cavalleria rusticana, Rusalka, O diário de Anne Frank e Os sete pecados mortais, entre outras.
Nuno Coelho venceu o Concurso Internacional de Direção de Orquestra de Cadaqués em 2017 e, desde então, dirigiu a Royal Liverpool Philharmonic, a BBC Philharmonic, a Sinfónica de Hamburgo, a Sinfónica de Castela e Leão, a Noord Nederlands Orkest e a Orchestra Teatro Regio Torino. Em 2018/19 recebeu a Bolsa Dudamel, o que lhe permitiu colaborar com a Filarmónica de Los Angeles. Nessa mesma temporada, dirigiu a Sinfónica da Rádio da Baviera, ao substituir o maestro Bernard Haitink à última hora.
Nuno Coelho nasceu no Porto. Estudou direção de orquestra na Universidade das Artes de Zurique com Johannes Schlaefli e ganhou o Prémio Neeme Järvi no Festival Menuhin de Gstaad. Em 2014 foi bolseiro da Fundação Gulbenkian e em 2015 foi admitido no Dirigentenforum do Conselho Alemão da Música. Nos dois anos seguintes foi bolseiro em Tanglewood e maestro assistente da Filarmónica dos Países Baixos. Ocupa o seu tempo livre com a literatura e o ténis.
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Lucas Debargue
Piano
O pianista francês Lucas Debargue revelou-se ao grande público no 15.º Concurso Internacional Tchaikovsky, realizado em Moscovo em 2015, tendo recebido o cobiçado Prémio da Associação de Críticos Musicais de Moscovo. Após este auspicioso início, foi sendo sucessivamente convidado a tocar a solo e a colaborar com importantes orquestras, apresentando-se em prestigiados palcos como a Philharmonie de Berlim, o Concertgebouw de Amesterdão, o Konzerthaus de Viena, o Théâtre des Champs-Élysées e a Philharmonie de Paris, o Wigmore Hall e o Royal Festival Hall de Londres, a Alte Oper Frankfurt, a Philharmonie de Colónia, o Suntory Hall de Tóquio, o Conservatório Tchaikovsky de Moscovo, o Teatro Mariinsky de São Petersburgo ou o Carnegie Hall de Nova Iorque, sob a direção de maestros como Mikhail Pletnev, Vladimir Jurowski, Andrey Boreyko, Tugan Sokhiev, Vladimir Spivakov ou Bertrand de Billy. Os seus parceiros de música de câmara incluem Gidon Kremer, Janine Jansen e Martin Fröst.
Lucas Debargue nasceu em 1990 e começou a estudar piano aos onze anos. Em paralelo com a exploração do repertório pianístico, diplomou-se em Literatura, tendo também concluído uma pós-graduação em Arte. Aos vinte anos, começou a estudar com a professora Rena Shereshevskaya, na École Normale de Musique de Paris Alfred Cortot, o que viria a determinar a sua decisão de se tornar pianista profissional. Músico dotado de grande curiosidade e poder de comunicação, enriquece a sua inspiração com a literatura, a pintura ou o cinema, desenvolvendo uma visão musical muito pessoal. Para além da interpretação das obras consagradas do repertório pianístico, toca também peças de compositores menos conhecidos como Karol Szymanowski, Nikolai Medtner ou Miłosz Magin. Dedica uma parte do seu tempo à composição, tendo escrito mais de vinte obras para piano solo e para agrupamentos de música de câmara. Como artista convidado permanente da Kremerata Baltica, foi-lhe encomendada a composição de uma ópera de câmara.
Artista exclusivo da Sony Classical, Lucas Debargue gravou para esta editora música de Scarlatti, J. S. Bach, Beethoven, Schubert, Chopin, Liszt, Ravel, Medtner e Szymanowski. Com a Kremerata Baltica e Gidon Kremer, gravou um CD dedicado ao compositor polaco Miłosz Magin. Já em 2024, foi lançado o seu novo projeto de gravação integral das obras para piano de Gabriel Fauré, assinalando o centenário da morte do compositor.
A revelação de Lucas Debargue no Concurso Tchaikovsky é o tema do documentário To music, realizado por Martin Mirabel e produzido pela Bel Air Media. Foi exibido no Festival Internacional de Cinema de Biarritz.
Programa
Piotr Ilitch Tchaikovsky
Concerto para Piano e Orquestra n.º 1, em Si bemol menor, op. 23
1. Allegro non troppo e molto maestoso – Allegro con spirito
2. Andantino semplice – Prestissimo
3. Allegro con fuoco