Livros de Horas na Coleção Gulbenkian
No contexto da sua coleção de 35 manuscritos iluminados, Calouste Gulbenkian adquiriu cerca de 16 livros de horas, entre códices e folhas soltas, com destaque para o Livro de Horas de Margarida de Cleves (fig. 1) e o Livro de Horas de Isabel da Bretanha (fig. 2), pela sua importância histórica e artística.
![Fig. 1 – Livro de Horas de Margarida de Cleves. Pinturas do Mestre de Margarida de Cleves. Haia, c. 1395-1400. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Cristo crucificado entre Maria e São João Evangelista, fol. 99v.](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-01.jpg)
A maior produção – e consequente maior disponibilidade no mercado – de manuscritos nos séculos XV e XVI, à medida que os centros de criação se deslocam dos mosteiros mais rurais para as cidades – onde aumenta o número de encomendadores –, aliada à preferência de Gulbenkian por livros ampla e luxuosamente ilustrados, perante exemplares mais modestos em termos decorativos, poderão estar na origem deste interesse particular.
![Fig. 2 – Livro de Horas de Isabel da Bretanha (Horas de Lamoignon). Pinturas do Mestre de Bedford (Haincelin de Haguenau) e colaboradores da sua oficina. Paris, c. 1415‑1416. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Juízo Final, fol. 122v](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-02.jpg)
Tipologia criada na Europa a partir da segunda metade do século XIII, o livro de horas contém orações destinadas à devoção privada, sobretudo por leigos, numa época em que a vida social se deslocava progressivamente dos feudos rurais para as cidades, onde, além da nobreza abastada, a burguesia começava a afirmar-se.
![Fig. 3 – Livro de Horas. Pinturas de Noël Bellemare. França, c. 1520. Encadernação (século XVII) em metal dourado e perfurado sobre um fundo grená esmaltado, gravado com motivos vegetalistas e águias adossadas com colar ostentando a cruz de Lorena e coroa ducal; pedraria e fechos em forma de flor de lis; manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-03.jpg)
O facto de ser encomendado por patronos abastados, para seu uso pessoal ou para oferta (por exemplo, por ocasião de casamentos), e não ser utilizado em cerimónias de culto, justifica o seu pequeno formato, por vezes miniatural (fig. 3), que facilitava a sua portabilidade. Além disso, estes livros seguem uma estrutura aparentemente estável, que se foi convencionando ao longo do tempo, embora possam apresentar especificidades segundo o período, o local de produção ou o próprio encomendador.
![](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-04.jpg)
No início do livro, encontra-se, em regra, o calendário, que geralmente inclui iluminuras para os diferentes meses do ano e para os signos do zodíaco (fig. 4). Por vezes, esta secção é acompanhada por instrumentos (tábuas ou círculos) que permitiam calcular datas e festividades litúrgicas, como a Páscoa (fig. 5).
![Fig. 5 - Livro de Horas. Pinturas de Mestres das Grisalhas de Delft. Delft, 1443. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Tábuas para o cálculo de acontecimentos litúrgicos, fols. 13v-14r](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-05.jpg)
A representação do destinatário do livro, habitualmente ajoelhado em oração diante de figuras devocionais, como a Virgem e o Menino (fig. 6, 7 e 8), pode anteceder, nalguns casos, os Ofícios ou Horas, conjuntos de orações dedicadas à Virgem, ao Espírito Santo, à Cruz, a variados santos e santas, aos defuntos, entre outros. Estes grupos podem conter até oito orações, de acordo com o momento do dia e com diferentes graus de importância: Matinas (madrugada), Laudes (manhã), Prima, Terça, Sexta, Noa (breves orações entre a manhã e a tarde), Vésperas (tarde) e Completas (noite).
![Fig. 6 – Livro de Horas de René II, Duque da Lorena. Pinturas de Mestre François. Paris, c. 1473-1479. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Virgem e o Menino com René II, duque da Lorena, ajoelhado, segurando um brasão com as armas de Lorena e Anjou, fol. 10r](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-06.jpg)
![Fig. 7 – Folha solta do Livro de Horas de Charles de Martigny. Pintura de Jean Bourdichon. Tours, c. 1490. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Charles de Martigny em oração, fol. 1v](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-07-1.jpg)
![Fig. 8 - Folha solta do Livro de Horas de Charles de Martigny. Pinturas de Jean Bourdichon. Tours, c. 1490. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Virgem com o Menino, fol. 2r](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-08.jpg)
No caso do Ofício da Virgem, é frequente, mas nem sempre respeitada integralmente, a inclusão de iluminuras extraídas do ciclo narrativo da Infância de Cristo (Anunciação, Visitação, Natividade, Anúncio aos Pastores, Adoração dos Magos, Apresentação de Jesus no Templo, Fuga para o Egito, Coroação da Virgem) como introdução a cada oração (fig. 9 e 10). O Ofício dos Mortos é, habitualmente, ilustrado com iconografia relacionada com a representação de defuntos, como a Ressurreição (fig. 11) ou o Juízo Final, entre outros.
![Fig. 9 – Livro de Horas. Pinturas de Willem Vrelant ou de um seu seguidor próximo, Mestre de Fitzwilliam 268 e Mestre do Livro de Orações de Dresden. Bruges?, c. 1475. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Anunciação e Mulher sentada com um cão lendo um livro de horas (margem), fol. 180v; Início das Matinas (oração da madrugada), abrindo o Ofício da Abençoada Virgem Maria segundo o uso de Roma e Mulher sentada com um cão e livro de horas (margem), fol. 181r](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-09.jpg)
![Fig. 10 – Livro de Horas. Pinturas de Noël Bellemare. França, c. 1520. Manuscrito sobre pergaminho. Museu Calouste Gulbenkian. Na imagem: Natividade, fol. 69v; Início da Prima (breve oração da manhã) incluída no Ofício da Santíssima Virgem Maria, segundo o uso de Roma, fol. 70r.](https://cdn.gulbenkian.pt/museu/wp-content/uploads/sites/5/2024/07/livro-horas-10.jpg)
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