Judite dos Santos. Work and Leisure

Exposição individual da artista portuguesa Judite dos Santos (1945), radicada em Nova Iorque. O projeto proposto foi a sua instalação «Work and Leisure», composta por grandes reproduções que preenchiam, em extensão, todas as paredes do espaço expositivo e cuja temática evocava a questão da falta de equilíbrio entre trabalho e lazer na sociedade contemporânea.
Solo exhibition of the work of Portuguese artist Judite dos Santos (1945), based in New York at the time. The installation on display, Work and Leisure, made up of large prints that covered the walls of the exhibition space, was a strong critique of how the modern world works.

Exposição individual da artista de origem portuguesa Judite dos Santos (1945), radicada em Nova Iorque.

Com um percurso artístico ainda numa fase inicial, desenvolvido maioritariamente nos Estados Unidos, mas que já contava com duas exposições individuais e algumas participações em projetos e mostras coletivas, nos Estados Unidos, Brasil, Alemanha e Israel, Judite dos Santos contacta pela primeira vez a Fundação Calouste Gulbenkian em abril de 1987, com o intuito de dar a conhecer o seu trabalho. Este contacto surgia num momento em que a artista procurava fortalecer as suas relações com Portugal, país onde nasceu, e com o meio artístico português, com o qual tinha escassas ligações (Carta de Judite dos Santos dirigida à Fundação Calouste Gulbenkian, 1 abr. 1987, Arquivos Gulbenkian, CAM 00051). Neste sentido, a Fundação Calouste Gulbenkian pela sua importante ação na promoção e divulgação da arte contemporânea foi considerada pela artista a instituição mais indicada para expor o seu trabalho.

Dois anos mais tarde, a instalação Work and Leisure, da sua autoria, integraria a programação de exposições temporárias do Centro de Arte Moderna, ocupando a Sala de Exposições Temporárias.

Com esta proposta, a artista dava continuidade às suas pesquisas recentes, tanto em termos processuais, explorando a apropriação de imagens e objetos, como conceptuais, centrando a sua reflexão no mundo corporativo. Estas questões ocupavam a artista desde 1985, ano em que apresentou as instalações Executives. Paper Tiger Television Show (Whitney Museum of American Art, 1985), Let Them Eat Cake (Mason Gross School of the Arts, Rutgers, 1985) e NewsStacks (black installation) (Museum of Contemporary Hispanic Art, 1985). Nas duas primeiras, usando de forma distinta a mesma imagem intervencionada de um grupo de executivos, Judite dos Santos chamava a atenção, por um lado, com Executives, para o controlo corporativo dos meios de comunicação de massas, bem como para as relações de trabalho hierárquicas e a centralização do poder, e por outro, com Let Them Eat Cake, para o distanciamento da classe dominante relativamente às situações das restantes classes sociais. NewsStacks (black installation) inseria-se, por sua vez, noutro grupo de trabalhos, do qual faziam parte as instalações Newspackages (#1) e (#2) (Bronx Museum, 1984), e que se caracterizava pela exploração do jornal enquanto material de trabalho, inicialmente associado a uma reflexão sobre os usos dados ao papel de jornal quando este deixa de servir a sua função original.

Em Work and Leisure observa-se o cruzamento destas duas linhas de trabalho. Esta instalação era composta por duas séries fotográficas – Executivos e Commuters –, resultantes da apropriação e manipulação de imagens preexistentes, e uma pilha de jornais intervencionada, que servia de plinto a um objeto.

Executivos partia de uma imagem retirada de um relatório de contas de uma grande empresa norte-americana (Miguel von Hafe Pérez, «Persistence as the millennium transitions» [texto de exposição], 2018). Nesta, quatro homens, vestidos de fato e gravata, surgem lado a lado em poses confortáveis e confiantes. A imagem é intervencionada pela artista, que cobre a negro a zona dos olhos e nariz de cada um dos retratados, omitindo a sua identidade. O resultado desta ação é reproduzido várias vezes, dando origem a uma espécie de imagem-padrão que preenche a parede oposta à entrada.

A imagem fotográfica como múltiplo é trabalhada novamente em Commuters, na qual a repetição de uma imagem arrastada de um grupo de pessoas remetia para a realidade dos commuters, multidões apressadas no percurso diário casa-trabalho-casa.

Estas séries encontravam-se dispostas como que em confronto, mostrando realidades opostas. A linearidade e sequência pretendidas foram alcançadas através da construção de uma parede que unia dois pilares estruturais e gerava um espaço de planta retangular, com dois vãos de acesso. A parede de entrada e as duas laterias eram ocupadas pela série Commuters, enquanto a parede oposta, de frente para a entrada, era preenchida, em toda a sua extensão, pela série Executivos. Ao centro da sala, encontrava-se uma pilha de jornais intervencionada com tinta preta, a mesma que encobria o rosto dos executivos, remetendo para a informação que é vedada às massas, aqui representadas pelos commuters.

O distanciamento entre classes, a perda de identidade no mundo corporativo, a mediação da realidade são questões despertadas pelo ambiente criado. Por último, a pilha de jornais servia de suporte para uma caixa de música fechada, que podia ser aberta pelo espectador (Plano da exposição, s.d., Arquivos Gulbenkian, CAM 00051).

Um desequilíbrio de escalas era evidente entre as fotografias e a caixa de música, a qual por sua vez constituía o único elemento de cor em toda a instalação. Neste contexto, esta ganhava um duplo sentido conforme fosse encarada enquanto mecanismo que põe a girar duas figuras ao som de uma música, ou como objeto lúdico. Deste modo, poderia ser lida como metáfora da condição daqueles que não têm alternativa a não ser seguir o ritmo que lhes é imposto, ou como referência ao lazer enquanto espaço de liberdade.

Intitulada Work and Leisure, esta instalação parece partir da questão da falta de equilíbrio entre trabalho e lazer na sociedade contemporânea, acabando por aprofundar outros aspetos associados ao trabalho corporativo, nomeadamente as relações interpessoais, o que pode ser explicado pelo modo como a artista desenvolve o seu trabalho.

Numa declaração incluída no seu website, a artista clarifica: «My work results from observing life as it evolves through me, my contemporaries and the world of my time. I am very interested in observing how we humans process "reality" and make our world what it is, individually or collective. My work reflects my responses to those things that concern me at any time and I attempt to be as honest to the moment and context as I possibly can.» (Disponível em http://www.juditedossantos.com/notations)

Esta instalação, inaugurada no CAM, integraria no ano seguinte a mostra, comissariada por Julia Herzberg e Giulio Blanc, «Figurative, Perspectives: Six Artists of Latin American Background», no Rockland Center for the Arts (West Nyack, Nova Iorque).

Após esta exposição, Judite dos Santos manteve relações com a Fundação Calouste Gulbenkian, que lhe atribuiu uma bolsa em 1993, e com outras instituições nacionais, passando a expor com regularidade em Portugal.

Mariana Roquette Teixeira, 2018


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Publicações


Material Gráfico


Fotografias

José Sommer Ribeiro (ao centro)

Documentação


Periódicos


Páginas Web


Fontes Arquivísticas

Biblioteca de Arte Gulbenkian, Lisboa / Dossiê BA/FCG

Coleção de dossiês com recortes de imprensa de eventos realizados nas décadas de 80 e 90 do século XX, organizados de forma temática e cronológica. 1984 – 1997

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00051

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém correspondência, currículo detalhado da artista, documentação relativo a obras anteriores enviada pela artista, provas fotográficas e textos para o catálogo, convite. 1987 – 1990

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Comunicação), Lisboa / COM-S001/004-D00498

Coleção fotográfica. inauguração (FCG, Lisboa) 1989

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Exposições e Museografia), Lisboa / SEM-S007-P0248-D00782

Coleção fotográfica: inauguração (FCG, Lisboa) 1989


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