Exposição de um conjunto de fotografias de Fernando Lemos (1926-2019) pertencente à coleção do Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP). Apresentada na área de exposições rotativas do piso 01 do CAMJAP, esta mostra, comissariada por Maria Almeida Lima, parte de uma vasta série de retratos de figuras-chave da arte e cultura do século XX, captados por Fernando Lemos, entre 1949 e 1952, e doados pelo artista à Fundação Calouste Gulbenkian em 1994.

Esta doação surge na sequência da mostra «Fernando Lemos. À Sombra da Luz» (1994), a qual teve um papel determinante na recuperação e conservação dessas e de outras imagens fotográficas datadas do mesmo período. No texto de apresentação do catálogo, Jorge Molder conta como se processou esse trabalho: «[…] ao iniciarmos a preparação desta actual apresentação confrontámo-nos com a inexistência das fotografias originalmente apresentadas [1952], as celebradas provas do "saudoso amigo Mário de Almeida Camilo" dos Grandes Armazéns do Chiado. Por outro lado, se podíamos contar com algumas dezenas de provas feitas pelo Estúdio Mário Novaes para a exposição realizada em 1982 na Sociedade Nacional de Belas-Artes, a verdade é que as vicissitudes por que passaram estas provas (muitas das quais se apresentam nesta exposição) não permitiriam a reorganização metódica deste corpo fotográfico. Optámos assim por realizar maioritariamente novas provas, revisitando para o efeito demoradamente as caixas de cartão que alojam a quase totalidade dos negativos que o Fernando Lemos fez. Foi incumbido da feitura dessas provas Yvon le Marlec, impressor francês de méritos internacionalmente reconhecidos, que se envolveu entusiasticamente na tarefa que lhe era proposta.» (Fernando Lemos. À Sombra da Luz, 1994)

Das inúmeras figuras retratadas – artistas, poetas, escritores, atores –, a curadora seleciona alguns artistas plásticos de diferentes gerações, representados na exposição da coleção: os surrealistas António Pedro, Fernando de Azevedo, Vespeira e Mário Cesariny, o casal Vieira da Silva e Arpad Szenes, e o então jovem Costa Pinheiro. Os retratos são agrupados tendo em consideração os referidos círculos de artistas.

Aos retratos individuais juntam-se outros de grupo, alguns resultantes de sessões fotográficas no ateliê de Lemos, outros que imortalizaram encontros entre os artistas. Em todos eles são evidentes as experiências do artista, enraizadas no surrealismo, que o próprio resume da seguinte forma: «Nos anos quarenta, nós, então surrealistas, andávamos muito envolvidos com as experiências da escrita automática […]. Após o primeiro impulso do automatismo, a escrita, como as fotos que estão expostas, passaram a ser dirigidas, controladas, programadas. […] Essas experiências e inquietações têm a ver com a [máquina fotográfica] Flexaret, com o botão de disparar desabotoado e livre, desautomático, capaz de assumir um erro de fotógrafo amador comum e nomeá-lo gesto operador na arte em liberdade, que foi o lado mais sagrado do surrealismo.» (Ibid.)

Em alguns casos, os artistas foram captados no seu ambiente de trabalho, como foi o caso de Vieira da Silva e Arpad Szenes. Lemos retrata cada um individualmente, mas também o casal, no seu ateliê de Saint-Jacques, dois anos após o seu regresso do Brasil. Nessa ocasião, é fixado o retrato de grupo, aqui exposto, no qual juntamente com o casal se encontram Fernanda e José-Augusto França, o jornalista e crítico de arte Joaquim Novaes Teixeira e o poeta e pintor António Dacosta, que se tinha estabelecido em Paris.

A exposição termina com um autorretrato de Fernando Lemos que remete para o caráter autobiográfico destas imagens, ou para a fusão entre vida e obra, condensando em si o olhar do artista sobre aquelas personalidades, a maioria seus amigos íntimos, o registo de encontros pessoais e artísticos, e o resultado de experiências e pesquisas artísticas.

Mariana Roquette Teixeira, 2019