Eduardo Nery, 1956 – 1996. Arte Pública. Arte Atelier

Exposição individual retrospetiva da obra de Eduardo Nery (1938-2013), realizada pela Culturgest em colaboração com o Serviço de Belas-Artes. A retrospetiva foi dividida em duas mostras, cabendo à Fundação Calouste Gulbenkian a apresentação das obras dedicadas à arquitetura e urbanismo, numa exposição comissariada por Pedro Vieira de Almeida.
Solo retrospective exhibition of the work of Eduardo Nery (1938-2013) organised by Culturgest in collaboration with the Fine Arts Service. The retrospective was staged in two parts, with the Calouste Gulbenkian Foundation hosting works on architecture and urbanism in an exhibition curated by Pedro Vieira de Almeida.

Exposição retrospetiva de Eduardo Nery (1938-2013), dividida em dois momentos: «Arte Atelier», patente na Culturgest de 7 de outubro a 21 de dezembro de 1997, e «Arte Pública», dedicada à obra de Nery em espaços arquitetónicos e urbanos, patente na Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) entre 9 de outubro e 21 de dezembro de 1997.

Na Gulbenkian, a exposição inseriu-se num programa de retrospetivas de artistas com produção em áreas criativas de menor visibilidade pública, como o design, as artes aplicadas ou a arte pública. Este projeto, organizado pelo Serviço de Belas-Artes da FCG com o objetivo de homenagear artistas portugueses com longas carreiras mas cuja obra nunca fora divulgada no seu conjunto, tinha sido iniciado com a exposição «Sebastião Rodrigues: Designer».

A exposição na Culturgest foi realizada no âmbito de um programa de exposições dedicadas a artistas que criaram obras especificamente para o edifício da Caixa Geral de Depósitos. Esta iniciativa constituiu um momento de grande importância para a Culturgest, que ao mesmo tempo homenageava a longa carreira de Eduardo Nery e colaborava com a Fundação Calouste Gulbenkian num projeto ambicioso.

Foi objetivo das duas apresentações contribuir para um maior entendimento histórico da arte portuguesa dos anos 60, tendo em conta o isolamento dos artistas portugueses face aos movimentos artísticos internacionais. A exposição de arte pública resultou de uma colaboração entre o Serviço de Belas-Artes (SBA) e o Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP), sendo coordenada por Manuel da Costa Cabral e Maria do Carmo Marques da Silva. A curadoria da exposição foi da responsabilidade de Cristina Sena da Fonseca, apoiada pela equipa de montagem do CAMJAP.

Segundo Manuel Costa Cabral, esta exposição pretendeu contribuir para a discussão da arte pública, tendo na figura de Eduardo Nery o exemplo de um trabalho consistente que, ao longo de uma carreira de quarenta anos, revelou «uma maturidade única na realização de um conjunto impressionante de cerca de uma centena de projectos para espaços e edifícios públicos» (Eduardo Nery, 1956-1996…, 1997). Estes projetos foram apresentados através de desenhos, fotografias, plantas, maquetas e peças originais, onde se incluíram tapeçarias, painéis de azulejos, o azulejo de padrão de Mértola e os cubos da peça Combinações Múltiplas.

Na exposição da Culturgest, estiveram expostos desenhos, pinturas, tapeçarias, colagens e fotografias produzidos durante os quarenta anos de carreira de Eduardo Nery.

O catálogo foi fruto da colaboração entre o SBA e a Culturgest e apresentou as encomendas para obras públicas a par do trabalho de ateliê, sem valorizar um em detrimento do outro, até porque, como lembra Manuel Costa Cabral, ambos se encontravam intimamente ligados. O conjunto mostrou que há na obra pública de Nery um sentido de intervenção social e uma atitude de coerência entre a vertente plástica da obra e a matriz arquitetónica e urbana, de grande rigor teórico, que contrastam com uma proposta mais onírica e de conotações metafísicas do seu trabalho de ateliê. Estas duas linhas de desenvolvimento criativo, que são, em 1997, expostas em duas exposições articuladas, «completam-se conceptualmente e esclarecem-se entre si», culminando no painel realizado para a cidade de Coimbra, no Instituto do Emprego e Formação Profissional, que articula a expressividade da pintura de cavalete com as premissas do revestimento azulejar.

A arte pública de Nery é, na verdade, um diálogo harmonioso entre as artes plásticas e a arquitetura, sem subalternizar a segunda em relação à primeira. «Muito pelo contrário, na sua obra vai privilegiar-se o respeito pelas constrições particulares da base arquitectónica» (Ibid., p. 34), como frisa Pedro Vieira de Almeida, à semelhança do que sucede, por exemplo, na arte pública de José de Almada Negreiros, nomeadamente nas composições imaginadas para a Gare Marítima de Alcântara, em Lisboa.

No entanto, por vezes, o lado plástico do trabalho surge em Nery como forma de corrigir a arquitetura preexistente, pontualmente de modo irónico – como sucede na Caixa Geral de Depósitos de Angra do Heroísmo. Porém, esta postura irónica, ainda de acordo com Pedro Vieira de Almeida, não se dirige à arquitetura, mas «à situação de compreensão temporal que resulta do confronto entre estruturas de diferentes tempos históricos» (Ibid., p. 40).

O trabalho apresentado, constituído por um universo rigoroso de infraestruturas e esquemas complexos, foi fruto de uma intensa investigação interdisciplinar e de uma leitura atenta de toda a envolvência arquitetónica e urbana, razão que levou Pedro Vieira de Almeida a designar esta faceta do trabalho de Eduardo Nery como «arte de inserção», opondo este termo ao de «arte pública», o qual considera incerto e demasiado generalista, aglutinador de outros intervenientes e práticas artísticas que pouco ou nada têm que ver com as preocupações encontradas no trabalho de Nery.

A organização dos trabalhos fez-se por núcleos, sendo o núcleo da entrada constituído por obras de um dinamismo latente, em que se teve em conta o tipo de visão acelerada e o movimento do espectador. Estas obras remetem para um acentuado dinamismo das formas e da sua perceção, presente nos trabalhos da Cervejeira de Vialonga (segunda metade da década de 1960), da estação do Campo Grande do Metropolitano de Lisboa (1980-1990) e do Aeroporto de Macau (1995).

O primeiro núcleo da exposição apresentou trabalhos que partiam de experiências associadas a uma determinada sensibilidade urbana, como as intervenções de Santo André (1981-1982), da Praça do Redondo (1968-1971), do Reservatório de Água em Almada (1978-1979), do Martim Moniz (1981-1991) e de Faceiras (1979-1980).

O núcleo seguinte foi dedicado aos casos de revestimento azulejar do Banco Nacional de Crédito (1995), das instalações da CP de Contumil (1992-1994), dos pavilhões da Universidade Nova na Caparica (1979-1980) e do interior da Caixa Geral de Depósitos em Angra do Heroísmo (1983-1986).

As intervenções no prédio lisboeta denominado Franjinhas (1967-1969) e no Centro Comercial no Laranjeiro (1994), o conjunto de tapeçarias para a Caixa Geral de Depósitos (1988) e a do Consultório Castro Nery (1972-1973) constituíam o terceiro núcleo.

O quarto núcleo era dedicado à intervenção na Associação Nacional das Farmácias (1995), ao painel de azulejos Ritmos de Ondas (1983) e aos painéis Vibração I e Vibração II, criados para a exposição colectiva «Arte Contemporáneo Portugués» (Madrid, 1987), e ainda ao painel Variação (1991), encomendado pela Fundação Calouste Gulbenkian para oferta ao Everson Museum of Art (Syracuse, Nova Iorque).

O núcleo seguinte apresentava os trabalhos da cúpula da Caixa Geral de Depósitos (1991-1992), do painel da Sede da EPAL (1991-1993) e da Sede do Centro de Emprego – Instituto do Emprego e Formação Profissional de Coimbra.

O sexto e último núcleo da exposição era constituído por trabalhos independentes do suporte da parede, como o Monumento à Água (projeto de 1986-1988), a intervenção no Centro de Saúde de Mértola (1981), o painel de azulejo do Museu da Água (1987) e a intervenção na Asseiceira (1986-1987).

Na FCG, a exposição foi vista por 6560 visitantes.

O catálogo é uma súmula das duas exposições e contém, além de textos assinados por Eduardo Nery, textos dos dois comissários, que explicam cada uma das intervenções arquitetónicas em espaços urbanos. Ambas as exposições foram intensamente divulgadas pela imprensa portuguesa, que as considerou o primeiro grande acontecimento da temporada, apesar de ter sido dado um maior destaque ao conjunto exposto na Culturgest. Há, todavia, críticas que apontam um excessivo número de obras selecionadas, como a de Ruth Rosengarten, que defende que «a mostra teria beneficiado de um depuramento maior e de uma selecção mais judiciosa: a montagem demasiadamente cheia gera uma sensação de redundância que não favorece as obras» (Rosengarten, Visão, 13 nov. 1997).

Sobre a exposição de arte pública presente na FCG, José Luís Porfírio diz que é bem conseguida, na medida em que responde a questões que a exposição de arte de ateliê lança, reforçando alguns aspetos da obra de Nery, como a dupla pulsão contraditória, que, a par da ironia, anima o seu trabalho: o cariz romântico e a exatidão construtivista (Porfírio, Expresso, 1 nov. 1997).

Luísa Soares de Oliveira considera que, pela sua complementaridade, é fulcral visitar as duas exposições para se entender o alcance da obra de Eduardo Nery, uma vez que na mostra da FCG «as dificuldades que Nery parece sentir na pintura esbatem-se, como se o artista encontrasse na decoração – porque é disso que se trata, afinal – o seu meio ideal de expressão» (Oliveira, Público, 19 out. 1997).

No âmbito da exposição patente no piso 01 da Galeria de Exposições Temporárias da FCG, foi realizada, a 4 de dezembro de 1997, uma mesa-redonda intitulada «Arte Pública – Arte em Espaços Públicos», moderada por Manuel Costa Cabral, que reuniu o escultor Alberto Carneiro, o jornalista António Guerreiro, a socióloga Idalina Conde, o professor José Bragança de Miranda e o arquiteto José Manuel Fernandes.

Carolina Gouveia Matias, 2018


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Eventos Paralelos

Mesa-redonda / Debate / Conversa

Arte Pública. Arte em Espaços Públicos

4 dez 1997
Fundação Calouste Gulbenkian / Centro de Arte Moderna
Lisboa, Portugal

Publicações


Material Gráfico


Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Belas-Artes), Lisboa / SBA 15533

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém orçamentos, contas, correspondência interna e externa, material para o catálogo e press-clipping. 1996 – 1997

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Belas-Artes), Lisboa / SBA 15534

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém textos para o catálogo, correspondência interna e externa, informações sobre a montagem e programa da mesa-redonda. 1996 – 1997

Arquivos Gulbenkian (Serviço de Belas-Artes), Lisboa / SBA 25167

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém convite para as duas inaugurações e programa da mesa-redonda. 1997 – 1997


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