Mahler: Sinfonia n.º 7

Coro e Orquestra Gulbenkian / Lorenzo Viotti

O maestro Lorenzo Viotti dirige a Orquestra Gulbenkian na Sinfonia n.º 7 de Gustav Mahler, com uma participação especial do Coro Gulbenkian no início do concerto.
Rui Cabral Lopes 15 set 2023 104 min

Composta entre 1904 e 1905, a Sinfonia n.º 7, em Mi menor, é um dos marcos da produção instrumental mahleriana. Não obstante, durante muito tempo, a sétima foi um dos marcos menos visitados da produção sinfónica do compositor boémio, devido à complexidade da sua linguagem musical, situada algures na fronteira do movimento romântico com as tendências de um modernismo latente, ambicionado por um número cada vez maior de contemporâneos de Mahler.

Do ponto de vista da linguagem harmónica, trata-se provavelmente da sinfonia mais sofisticada do compositor, povoada por dissonâncias ásperas e modulações abruptas, cuja ação conjunta exerce um efeito de dissolução das funções tonais convencionais. Neste aspeto específico, a obra dá plena continuidade à anterior Sinfonia n.º 6, em Lá menor (1904). Por outro lado, a utilização recorrente do intervalo de quarta como elemento estruturador quer de motivos e temas, quer de agregados harmónicos, traz ao idioma da Sinfonia n.º 7 um caráter distintivo, que a afasta dos cânones mais tradicionais do género. Contudo, apesar da vincada influência modernista, não deixa de prestar homenagem ao universo romântico, através de uma arquitetura global de inspiração poética que transporta o ouvinte dos contornos sombrios do Allegro introdutório até à apoteose triunfante do Allegro final. De permeio, Mahler compôs dois singulares andamentos moderados, ambos intitulados Nachtmusik (“música noturna”), os quais enquadram, por sua vez, um Scherzo central, Schattenhaft (“como uma dança de sombras”). O signo da noite – ícone dileto da cultura romântica – perpassa pois toda a conceção da sinfonia, estando na origem do subtítulo “Canto da noite”, pelo qual é muitas vezes designada.

Mahler concluiu a Sinfonia n.º 7 na localidade austríaca de Toblach, durante o verão de 1905. No entanto, a obra só veio a ser estreada a 9 de setembro de 1908, em Praga, depois de Mahler ter declarado que esperaria “o tempo que fosse preciso” para assistir a este evento. As expectativas do compositor foram, de certo modo, correspondidas por uma receção respeitosa, mas não propriamente calorosa, o que se pode facilmente compreender em vista das vastas dimensões e do estilo da partitura, bastante arrojado para a época.

Desde os primeiros compassos da introdução, Adagio, as sonoridades refinadas e ritmicamente bem destacadas tomam conta da textura. A linha melódica irregular entoada  pela trompa-tenor, virá a ser empregue noutras partes da partitura, desempenhando um papel unificador de fundo. A introdução virá a ser sucedida por um Allegro de caráter marcial, em que se impõe, de imediato, o intervalo de quarta descendente. O desenvolvimento que se segue desenrola-se com base em duas secções distintas. Na primeira assiste-se ao prolongamento do movimento impetuoso da exposição, ao mesmo tempo que o material melódico e harmónico de origem é variado e ampliado. Já na segunda secção, Mahler propõe um quadro esplendoroso de imaginário bucólico, o qual vem depois a ser importunado pelo recitativo inicial da trompa-tenor. O regresso do anterior episódio Allegro, densamente trabalhado, encerra o andamento na tonalidade de Mi maior.

O segundo andamento, Nachtmusik (Allegro moderato, em Dó maior), constitui uma espécie de marcha lenta de caráter militar, iluminada por uma atmosfera fantástica que faz recordar alguns dos Wunderhorn Lieder. Segundo o amigo do compositor Willem Mengelberg, o andamento foi inspirado pelo célebre quadro seiscentista de Rembrandt intitulado A Ronda da Noite.

O Scherzo (Schattenhaft, em Ré menor), não esconde a sua filiação na valsa vienense, muito embora os contornos da instrumentação sugiram, por diversas vezes, uma face grotesca e desconcertante que transfigura a recriação da dança. No centro do andamento é exposta, por três oboés, uma melodia de tipo popular, na tonalidade de Ré maior, antes do reaparecimento súbito da bizarra valsa inicial.

A orquestração do terceiro andamento, Nachtmusik (Andante amoroso, em Fá maior), integra uma guitarra e um bandolim, dois instrumentos de aparecimento muito raro neste tipo de repertório, mas que conferem uma sonoridade característica às texturas “noturnas” de Mahler.

Por fim, o efervescente Finale (Rondo, em Dó maior) é o exemplo acabado da visão progressista de Mahler, instaurando, por detrás de aparente desordem, as mais complexas inter-relações entre o material musical e a organização de um tempo psicológico cuja apreensão se revela deveras complexa e exigente, do ponto de vista do ouvinte. Na sua mescla controversa entre o trivial e o sublime, o andamento progride inexoravelmente, até à sua conclusão triunfal, sobre as ondulações maciças de semicolcheias que reúnem os sopros, a percussão e as cordas.


Intérpretes

  • Maestro

Programa

György Ligeti

Lux aeterna*

Gustav Mahler

Sinfonia n.º 7, em Mi menor

*Cem Anos do Nascimento de György Ligeti

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