Noite Transfigurada

Orquestra Gulbenkian / Lorenzo Viotti

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Orquestra Gulbenkian
Lorenzo Viotti Maestro

Béla Bartók (1881 – 1945)
Música para cordas, percussão e celesta, Sz. 106
– Andante tranquillo
– Allegro
– Adagio
– Allegro molto

Composição: 1936
Estreia: Basileia, 21 de janeiro de 1937
Duração: c. 30 min.

Obra-prima da literatura instrumental do século XX, Música para cordas, percussão e celesta emerge da produção de maturidade de Béla Bartók como símbolo inequívoco de modernidade, numa época pródiga em transformações sociais, políticas e também artísticas. Concluída a 7 de setembro de 1936, a obra foi estreada a 21 de janeiro do ano seguinte, na Suíça, pela Orquestra de Câmara de Basileia, sob a direção do maestro Paul Sacher.

Do primeiro andamento, Andante tranquillo, emerge, desde logo, o tema das cordas, com perfil altamente cromático, sobre o qual se articula uma fuga rigorosa e de proporções ambiciosas, cujas sonoridades evoluem em crescendos e diminuendos enigmáticos, rumo a um momento de clímax orquestral. Sobre o emaranhado expressivo das várias partes instrumentais paira, na verdade, a linha estética inaugurada por vultos da Segunda Escola de Viena, como Arnold Schönberg e Anton Webern, ainda que bastante adaptada, neste caso, ao gosto e ao método de Bartók.

No curso do andamento seguinte, Allegro, os efeitos percussivos pontuam o discurso agitado das cordas, alastrando também ao piano. Após a extensa secção em pizzicato das cordas, o tempo acelera gradualmente, visando a cadência final que foi inspirada pelos modelos virtuosísticos do Romantismo.

Por contraste, o terceiro andamento, Adagio, instaura uma atmosfera serena e contemplativa, dando espaço a efeitos subtis do xilofone, da harpa, do piano e da celesta. As combinações sonoras inusitadas conferem à textura uma aparência sempre renovada e, por vezes, imprevisível.

Verdadeira homenagem do compositor húngaro à tradição do concerto instrumental, o derradeiro andamento, Allegro molto, invoca uma variante do rondó-sonata para fazer alternar a textura entre as apresentações do refrão e as veredas contrapontísticas intensas que envolvem todo o efetivo instrumental, culminando num crescendo orquestral agitado e pujante que se extingue com uma breve peroração descendente, a desfazer todas as ambiguidades anteriores com o acorde perfeito de Lá maior.

Rui Cabral Lopes

 

Arnold Schönberg (1874 – 1951)
Noite Transfigurada, op. 4
– Grave – Molto rallentando – Pesante – Adagio

Composição: 1899 / rev. 1943
Estreia (para sexteto de cordas): Viena, 18 de marco de 1902
Duração: c. 30 min.

Composta originariamente para sexteto de cordas, Noite Transfigurada, op. 4, constitui um dos marcos mais representativos da primeira fase estilística de Arnold Schönberg. O ponto de partida foi um poema do escritor germânico Richard Dehmel (1863-1920), no qual se coloca em relevo a complexa teia de sentimentos que envolve um homem e uma mulher apaixonados, cuja relação se vê ensombrada pelo facto de a mulher se encontrar grávida de outro homem. A aceitação incondicional da mulher pelo seu amante e a superação da dura prova emocional constituem a meta do poema e, consequentemente, da obra de Schönberg.

A estrutura formal da partitura segue, de perto, o poema e integra cinco secções musicais distintas, cada uma das quais tece um comentário musical preciso a cada etapa do diálogo dramático. Desta forma, a introdução lenta, em Ré menor, espelha a primeira estrofe do poema, na qual os dois amantes são apresentados ao luar, num cenário tipicamente romântico. Um motivo cromático descendente, de caráter algo taciturno, domina a textura. A viola representa a primeira intervenção da mulher: “Eu trago no meu ventre um filho, mas não é teu”. Todo o discurso musical, orientado para o modo menor, é dominado por sentimentos de culpa e de ansiedade. A secção seguinte pode ser definida como um scherzo grotesco, que alude aos sentimentos de insegurança e incerteza demonstrados pela mulher, enquanto aguarda a reação do parceiro à sua confissão. O personagem masculino intervém, pela primeira vez, na quarta secção. As suas palavras são expostas na tonalidade radiante de Ré maior: “Não deixes que o filho que concebeste seja um fardo para a tua alma”. A última secção da obra propõe a “transfiguração” do tema cromático inicial, agora exposto na tonalidade homónima de Ré maior, sobre a voluptuosa sonoridade dos violoncelos que descrevem, com especial sensibilidade, as palavras “O fôlego de ambos fundiu-se no ar enquanto se beijavam”. Uma breve coda encerra a obra, molto pianissimo.

De 1917 data a versão para cordas (revista em 1943), elaborada pelo próprio compositor. Em grande medida, esta adaptação do sexteto original, a qual inaugura o presente concerto, tornou-se o veículo ideal para a regeneração, junto da crítica e do público, de uma obra que havia causado o maior escândalo, aquando da sua estreia em Viena, a 18 de março de 1902.

Rui Cabral Lopes


GUIA DE AUDIÇÃO

 

Por Sérgio Azevedo

Sérgio Azevedo fala-nos de duas obras fundamentais na música do século XX: A Noite Transfigurada de Arnold Schönberg e a Música para cordas, percussão e celesta de Béla Bartók.


A Fundação Calouste Gulbenkian reserva-se o direito de recolher e conservar registos de imagens, sons e voz para a difusão e preservação da memória da sua atividade cultural e artística. Caso pretenda obter algum esclarecimento, poderá contactar-nos através de [email protected].

Noite Transfigurada foi composta originalmente para sexteto de cordas (1899), tendo sido orquestrada por Schönberg em 1917 e 1943. Inspirada pelo poema homónimo de Richard Dehmel, esta obra programática foi a primeira partitura de relevo de Schönberg, um marco no desenvolvimento de uma linguagem musical revolucionária. Por seu lado, em 1936, Bartók compôs Música para cordas, percussão e celesta para um conjunto instrumental pouco convencional. Dois grupos de cordas, separados espacialmente por um importante naipe de percussão, sustentam uma partitura que se constitui também como uma síntese da escrita musical orgânica de Bartók.

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