Como podemos atrair as aves selvagens

Jardins para a vida silvestre

O professor João Eduardo Rabaça dá-lhe a conhecer algumas espécies de passeriformes, e partilha algumas sugestões sobre como preparar as áreas verdes para os receber.
Wilder 29 abr 2022 4 min
Jardins para a vida silvestre

Por todo o mundo existem cerca de 6.000 espécies de passeriformes (também chamados de pássaros ou passarinhos), uma ordem bastante diversa que inclui muitas pequenas aves, como a felosinha (Phylloscopus collybita) e a carriça (Troglodytes troglodytes), mas também algumas maiores como o gaio (​​Garrulus glandarius) e o corvo (Corvus corax).

A ordem dos Passeriformes é aliás o grupo de aves mais representativo nos ecossistemas terrestres, lembra João Eduardo Rabaça, autor do livro “As Aves do Jardim Gulbenkian”. São também uma presença constante nos meios urbanos, “podendo ajudar-nos a entender as dinâmicas da Natureza”. Espécies como os pardais (Passer domesticus), melros (Turdus merula) e rabirruivos-pretos (Phoenicurus ochruros), por exemplo, convivem diariamente com a azáfama da cidade.

Gaio Garrulus glandarius © Diogo Oliveira
Melro Turdus merula © Diogo Oliveira

João Eduardo Rabaça, que é também docente e investigador da Universidade de Évora e especialista em aves, guiou o segundo passeio do ciclo de visitas “Jardins para a Vida Silvestre” no Jardim Gulbenkian, dia 20 de março, e partilhou connosco algumas sugestões sobre como preparar as áreas verdes para os passeriformes.

Muitos espaços podem revelar-se úteis, incluindo aqueles que parecem mais insignificantes: “pequenos jardins, quintais, logradouros ou mesmo varandas”. Se forem criadas as condições certas, podem servir como “poisos ocasionais” e como “locais de alimentação”, fornecendo “insectos, bagas e sementes” às aves urbanas. E “eventualmente”, podem transformar-se em locais onde estas “edificam os seus ninhos”.

Carriça Troglodytes troglodytes © Diogo Oliveira
Chapim-real Parus major © Diogo Oliveira

Controladoras de pragas e “jardineiras”

Mas trata-se de uma relação recíproca, em que também os espaços verdes saem a ganhar. “Como elementos constituintes da biodiversidade, e como quaisquer outros seres vivos, as aves desempenham determinadas funções nos ecossistemas onde ocorrem”, nota João Eduardo Rabaça.

Um exemplo são as aves insectívoras que comem insetos fitófagos – que por sua vez se alimentam das plantas – como a toutinegra-de-barrete (Sylvia atricapilla), o pisco-de-peito-ruivo (Eritachus rubecula), o rabirruivo-preto e a carriça. Assim, podem contribuir para manter esses insetos “abaixo do nível populacional de praga”.

Tanto a toutinegra-de-barrete como o pisco-de-peito-ruivo, e o melro-preto, entre muitos outros, são igualmente “agentes de dispersão botânica” ao dispersarem as sementes: comem-nas em especial nos meses mais frios, quando os insectos rareiam.

Já o gaio, outro visitante do Jardim Gulbenkian e de muitos outros jardins, é um “reconhecido auxiliar na regeneração florestal pelo facto de ter o hábito de enterrar no solo os frutos dos carvalhos (bolotas), com vista a dispor de armazenamento de alimento”. Como muitas bolotas ficam esquecidas, algumas vão dando origem a novas árvores.

Toutinegra Sylvia atricapilla © Diogo Oliveira

Semear, plantar e criar pontos de água

Mas como podemos transformar os nossos espaços, desde terrenos a varandas, em “jardins para os passeriformes”? Há que transformá-los em “locais de abrigo e nidificação”, “promovendo uma disponibilidade alimentar diversificada”.

E isso pode ser conseguido com ações simples, como “a sementeira de plantas herbáceas e a plantação de arbustos e árvores, utilizando as espécies autóctones existentes nessa região”, exemplifica este especialista. “No fundo, trata-se de criar condições que potenciem a recuperação de uma certa integridade ecológica, que permitirá a ocorrência de uma fauna de macroinvertebrados diversificada e apropriada para a alimentação de aves insectívoras” – como borboletas na fase de lagartas e como adultas, moscas, abelhas e vespas.

Por outro lado, se não houver pontos de água será  útil “disponibilizar bebedouros com água durante o Verão”, devido ao “rigor estival nas nossas latitudes”. Já instalar comedouros é menos importante, uma vez que em Portugal costuma haver alimentos disponíveis para as aves na natureza, de janeiro a dezembro.

“E se for apropriado e houver condições, poder-se-ão colocar caixas-ninho para a nidificação de aves cavernícolas como, por exemplo, chapins-reais (Parus major) ou chapins-azuis (Cyanistes caeruleus).”

Série

Jardins para a vida silvestre

O Jardim Gulbenkian promove um conjunto de visitas sobre como tornar os nossos jardins, parques e terrenos, tanto no interior das cidades como fora, em espaços mais acolhedores para vida silvestre – fundamental para a vida na Terra! Estas visitas são acompanhadas pela revista Wilder que, em parceria com a Fundação Gulbenkian, publica artigos sobre cada um dos temas.

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