Projeto do Jardim

O Jardim da Fundação Calouste Gulbenkian construído na década de 60, segundo um projeto dos arquitetos paisagistas António Viana Barreto e Gonçalo Ribeiro Telles, é um dos jardins de Portugal que espelha, de forma eloquente, os princípios do desenho do jardim do movimento moderno na cultura portuguesa.

São representativos daqueles princípios:

  • a continuidade entre interior e exterior;
  • a funcionalidade;
  • a rutura com as axialidades impositivas;
  • a predominância do desenho do espaço sobre o desenho das formas;
  • a dimensão social do jardim;
  • a presença das questões ecológicas e regionais;
  • o respeito pela identidade cultural e histórica do lugar;
  • a apologia da beleza intrínseca da natureza.

 

Um ecossistema artificial

O jardim da Fundação Calouste Gulbenkian é um ecossistema artificial enquadrado num contexto cultural e estético que se oferece como espaço de prazer, de vivência no seio da natureza em contexto urbano. Foi pensado a partir de um conceito e construído a partir de um conjunto de técnicas e dispositivos complexos e inovadores para a época.

O resultado final deste trabalho, desenvolvido por arquitetos paisagistas, arquitetos e engenheiros durante uma década, traduz-se num conjunto complexo, íntegro, onde edifícios e jardim são uma única entidade.

Gonçalo Ribeiro Telles, ao apresentar o quadro conceptual que presidiu ao desenvolvimento do Jardim da Fundação Calouste Gulbenkian, refere que o lugar onde iria surgir aquele jardim continha a memória de uma estrutura rural, de um jardim privado e de um mundo de sociabilidade determinados pelo jardim zoológico e de aclimação de Lisboa e pela Feira Popular que aí se instalara, durante o Verão, a partir de 1943 [i].

No entanto os projetistas consideraram que esta parte da história do lugar não era terreno fértil para o novo programa que em 1960 se pretendia implementar neste espaço.

Os arquitetos paisagistas optaram por estabelecer um corte em termos conceptuais, não com o lugar, não com a sua morfologia, mas ao nível de conceito de espaço aberto de fruição.

Daquele tempo (1866-1960) perdurou a forma trapezoidal da Quinta de Fernando Larre  que a Carta Topográfica de Fava  (1801) e o Atlas da Carta Topográfica de Lisboa, da responsabilidade de Filipe Folque (1856/1857) registam.

 

O desenho do Parque de Santa Gertrudes

O desenho formal do Parque de Santa Gertrudes, muito marcado temporalmente, transformou-se numa complexa rede espacialidades densamente entrelaçadas como refere Marc Treib [ii].

Orla, mata e clareira combinam-se de acordo com as condições ecológicas que as determinam e de acordo com aquelas que entre elas se estabelecem gerando um conjunto de lugares de intimidade e/ou de sociabilidade que acolhem o utilizador e o retiram física e psicologicamente de um tempo rápido, linear e de um espaço artificial que caracteriza a vida urbana contemporânea.

 

Um refúgio do mundo

O jardim da Fundação Calouste Gulbenkian funciona com um refúgio do mundo que lhe é exterior não deixando com isso de ser um espaço urbano. Não nega a cidade e é participante no processo do sistema vivo que a cidade constitui.

A dimensão cultural, as características ecológicas, morfológicas, físicas da vegetação, da água, da luz, do relevo e o movimento são os princípios orientadores da estratégia desenvolvida pelos projetistas.

Com eles construiu-se uma diversidade de espacialidades atravessadas por um sistema de percursos que se apresenta mais como um sistema de passeios. É percorrendo este sistema que o carácter do jardim melhor se expressa.

Uma sucessão de jogos entre luz e sombra, sociabilidade e intimidade, clareira, mata e orla surpreendem e revelam o caráter deste jardim.

Os projetistas tiraram partido da situação fisiográfica (uma encosta suave, virada a norte, que desce de S. Sebastião da Pedreira até à Av. de Berna, a antiga vala do Rego) não só através da dramatização da pendente que o desenho propõe, quer conjugando-a com o uso da vegetação – enquanto plano de superfície, volume vertical ou elemento isolado – quer com a fisicalidade da água parada ou em movimento e com a exposição solar.

Do desenho com o relevo, com a vegetação, com a água e com a luz, surge uma sequência de espaços de estadia e de percursos, uma sequência de perspetivas próximas e longínquas, que são reveladas à medida que o visitante percorre ou se aquieta neste paraíso.

O caráter predominantemente monocromático que este jardim apresenta obriga a um olhar atento que revela apontamentos fugazes de cor, cuidadosamente localizados sobre uma palete de verdes riquíssima que funciona como a cor de fundo onde tudo acontece: o movimento dos visitantes, os reflexos da luz, o voo e o chilrear dos pássaros e a música do vento.

 

[i] Quinta de Fernando Larre – in Atlas da Carta Topográfica de Lisboa
Parque de Santa Gertrudes

[ii] Marc TREIB, “Arcadia  urbana – a paisagem do Jardim Gulbenkian e outras do seu tempo” in Aurora CARAPINHA, O Jardim, Fundação Calouste Gulbenkian, FCG. Lisboa, 2005 p.160.

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