Percurso do Lago

Porque o lago e a sua envolvência são o âmago, o coração do jardim, acede-se a ele através dos restantes percursos, a partir de um conjunto de pequenos trajetos, quase secretos, que se rasgam numa mancha arbórea e arbustiva densa.

A espessura da vegetação não permite vislumbrar o objetivo dos percursos, mas sentimos que nos aproximamos de uma concha.

Os diferentes tipos de árvores, arbustos e herbáceas que nos envolvem, como um túnel, indiciam e antecipam a presença da água.

© José Manuel Costa Alves
© Paula Côrte-Real
© Márcia Lessa
© Márcia Lessa
© José Manuel Costa Alves
© Márcia Lessa
© Paula Côrte-Real
© Paula Côrte-Real
© Paula Côrte-Real
© Paula Côrte-Real
© Márcia Lessa

Desfrutemos mais um pouco destes recantos umbrosos, confidenciais e aromáticos, onde, de quando em quando, surge a luz refletida pela superfície calma do lago.
À intimidade, ao isolamento, à contenção, determinados pela escala dos percursos que vimos percorrendo e pela dimensão da vegetação que os abraça, sucede-se a amplitude, a sociabilidade, a cor e a luz que a enorme clareira relvada junto ao lago oferece.
É aqui nesta concha, definida pelo socalco que acabamos de explorar e pela fachada sul do edifício, que se concentra grande número dos visitantes do jardim. Uns desfrutam do jardim da esplanada adjacente ao edifício, outros repousam ou brincam no relvado. Para aí nos dirigimos com a clara sensação que atingimos o âmago do jardim, senão mesmo aquilo a que chamamos o Tempo do Jardim.
É neste lugar — onde convergem três ribeiras para o interior da concha projetada e construída entre 1963 e 1966 — que se oferece como um enorme espelho da reflexão da luz, que se revela o grande discurso da água.

É também aqui que nos sentimos mais afastados do turbilhão da vida moderna. A linguagem naturalista em que o lago se constrói, a vegetação que o enquadra, a imagem de céu na terra que a fisicidade da água proporciona, o jogo de profundidades que todos estes elementos determinam e que a presença da ilha amplia, assim como a diversidade e a riqueza ecológica que este sistema húmido garante, a isso levam. A cidade desvanece-se. Os seus ruídos chegam-nos atenuados pela modelação do terreno e pela vegetação que configuram o jardim. O vento, que sopra de norte, transforma-se em brisa benfazeja pelos obstáculos permeáveis que encontra no seu percurso. O jardim revela-se em toda a sua plenitude.

Qualquer que seja a aproximação ao lago, ela realiza-se sempre pelo atravessamento da vegetação que primeiramente esconde e protege este lugar, para em seguida o revelar em grande apoteose. É manifesta essa apreensão quando a chegada ao lago se faz através da mata a poente ou através do anfiteatro. Daqui colhe-se a panorâmica mais conhecida do Jardim da Gulbenkian: o diálogo entre a superfície calma do lago e o edifício, nomeadamente com a enorme janela que se rasga na fachada sul do auditório. O volume grandioso, inerte em betão, do auditório, avança pelo vale dentro até ao lago numa sintonia quase perfeita entre matéria inerte/ matéria viva, dualidades que muitas vezes consideramos contraditórias.

A mestria com que esta área do jardim foi projetada e construída, de acordo com os princípios ecológicos do funcionamento da paisagem, faz-nos esquecer que o cenário que observamos é artificial. Esquecemo-nos mesmo que parte desta paisagem é um jardim suspenso que sobre camarins e salas de apoio ao auditório se constrói.

O lago foi estudado e desenhado até à exaustão, sempre em íntima ligação com o edifício, nomeadamente com o Auditório, com o Anfiteatro e com a Galeria de Exposições Temporárias, com os quais estabelece relações de limite, de profundidade e de cumplicidade.

TOSTÕES, Ana; CARAPINHA, Aurora; CORTE-REAL, Paula. Gulbenkian, Arquitetura e Paisagem.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2013

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Atualização em 21 agosto 2019

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