Em 2004, o Centre Culturel Calouste Gulbenkian (CCCG) acolheu no seu espaço parisiense o humor político do cartoonista António [António Moreira Antunes (1953)]. A exposição decorreu de uma parceria com a revista Courrier International e foi uma das iniciativas da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) a assinalar o trigésimo aniversário do 25 de Abril de 1974. Apresentou desenhos para a imprensa concebidos imediatamente antes da Revolução e ao longo das três décadas já transatas de regime democrático em Portugal.

Um artigo do jornal Público (23 de abril de 2004, p. 49) indica que o trabalho mais antigo exposto foi Evolução na Continuidade, publicado no histórico jornal República, a 16 de março de 1974 – «curiosamente o dia do fracassado Golpe das Caldas», levantamento militar que antecedeu o 25 de Abril («Cartoons de António expostos em Paris», Público, 23 abr. 2004). O Público informa ainda que, para esta exposição na capital francesa, o espírito crítico de António foi alimentado por um debate programado para a sessão inaugural, a 27 de abril de 2004, no qual participaram Mário Soares e Eduardo Lourenço. Na companhia do artista, o antigo presidente da República Portuguesa e o ensaísta, duas figuras centrais para o pensamento da história contemporânea de Portugal, terão discutido algumas das contingências do antes e do depois da Revolução, sondando o já feito e o por fazer do trajeto democrático até este início de século XXI. A arte de António é, seguramente, uma das problematizações mais criativas de muitas dessas vicissitudes.

A 5 de junho de 2004, o semanário Expresso adianta que, no âmbito das mesmas comemorações, o Courrier International publicou um número especial que reproduz desenhos de António em exposição no CCCG, que a própria revista coorganizou (Courrier International. «Portugal. Trente ans après», n.º 703, 21 abr. 2004). Assinalando o êxito alcançado pelas 53 obras em exposição, o mesmo artigo do Expresso refere que a FCG decidiu prolongar «Trente Ans de la Vie Politique du Portugal. Dessins de Presse de António» até 18 de junho de 2004 («António em Paris», Expresso, 5 jun. 2004).

A 26 de abril de 2004, um dia antes da inauguração desta individual de António, abria uma outra exposição no CCCG, desta feita no Espaço Biblioteca. Apresentou cartazes de comemorações da Revolução dos Cravos, de anos transatos, mas também outros na orla de temas quentes que a Revolução catapultara, como a Guerra Colonial, bem como materiais gráficos do período pós-revolucionário, nomeadamente da fase do Processo Revolucionário em Curso (PREC). É de referir a origem estrangeira de vários desses materiais, nomeadamente conexos com a diáspora portuguesa em França. Com o título Mémoires d'Avril. Un Passé Gardé à la B.D.C.I., a iniciativa foi organizada em colaboração com a Bibliothèque de Documentation Internationale Contemporaine (BDCI) e as Universidades de Paris X-Nanterre e de Rennes (Arquivos Gulbenkian, PRS 05722).

O convite para a inauguração indica que foram apresentados alguns documentos inéditos. Foram também expostos e disponibilizados para consulta materiais bibliográficos do fundo Biblioteca do CCCG, de valor histórico e pertinentes para a análise das problemáticas em questão. Foi impresso um índice bibliográfico dessa seleção, atualmente nos Arquivos Gulbenkian (Ibid.). A exposição contou ainda com uma programação paralela de leituras de textos de Jorge de Sena e Charlotte Delbo, a cargo da companhia Cá e Lá, com encenação de Graça Santos. Na reportagem fotográfica que acompanha esse evento, é possível ver as obras de António em fase de montagem no átrio do palácio da Avenue d'Iéna (Ibid.).

Daniel Peres, 2019