John Beard. Visão Fugitiva. Instalação de «The Land's End» e outros novos trabalhos

Exposição individual do artista galês John Beard (1943), comissariada por Ana Vasconcelos. Tem como ponto de partida a instalação The Land’s End (1998-99), pertencente à coleção do CAMJAP, e dá a conhecer a produção mais recente do artista, revelando a importância do período em que viveu em Portugal.
Solo exhibition of work by Welsh artist John Beard (1943) curated by Ana Vasconcelos e Melo. The show was designed around the installation “The Land’s End” (1998/9), which belongs to the CAMJAP collection, revealing the artist’s latest work and the importance of Beard’s time living in Portugal. 

Exposição individual do artista galês John Beard (1943), comissariada por Ana Vasconcelos.

Apresentada na área de exposições rotativas do piso 0 do Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP), esta mostra parte da instalação The Land's End (1998-1999), incorporada na coleção do CAMJAP por doação do artista em 2000, e reúne um conjunto de outros trabalhos que caracterizam a sua produção mais recente.

The Land's End foi produzida no âmbito da residência artística realizada por Beard em Porthleven, por ocasião do programa «Artist's Projects» da Tate St. Ives. Com este trabalho, o artista dava continuidade às pesquisas e experiências pictóricas desenvolvidas em 1993 a partir da representação da rocha da Praia da Adraga (Sintra, Portugal) e que levaram o curador Michael Tooby a dirigir-lhe o convite para participar no referido programa.

Este último tinha por objetivo «to show 20th century art in the context of Cornwall, particularly the modern tradition with which St Ives itself is associated, and to develop work in response to the location of the gallery, and its architectural character». Como resposta a tais propósitos, a proposta apresentada por Beard procurava «to extend the connections between his Portuguese paintings (entitled the ADRAGA series), and both the historical context for modern artists who immigrated to St Ives and the topography of Britain's Land's End Peninsula» (John Beard. After Adraga/The Land's End, 1998, p. 14). O resultado foi uma instalação e uma série de pinturas em acrílico sobre papel, que partilham o mesmo título – The Land's End – e são desenvolvidas a partir da mesma imagem, um frame de um vídeo registado pelo artista em 1997 na costa de Land's End. É precisamente com esse vídeo, exposto na parede exterior da sala com recurso a um ecrã, que esta exposição se inicia.

No interior da sala é apresentado um conjunto de trabalhos sobre questões de perceção e representação, revelando novos processos então desenvolvidos pelo artista, que envolvem imagens fotográficas.

A instalação The Land's End (1998-1999) é composta por sete serigrafias que correspondem a sete variações da referida imagem a preto-e-branco, manipulada através do aumento ou diminuição da intensidade da luz. Esta gradação no sentido dos extremos, para o preto (subexposição) e para o branco (sobre-exposição), torna-se mais evidente na montagem da instalação feita em St. Ives, onde as serigrafias foram alinhadas na vertical. Como explica o artista: «Arrangement of the square modules is meant to encourage multiple configurations.» (John Beard, 2011, p. 208) A montagem realizada no CAM dispõe as imagens manipuladas em torno da imagem original. Partindo desta, posicionada ao centro, a leitura no sentido dos ponteiros do relógio culmina numa imagem quase branca, e no sentido contrário, numa outra quase negra, havendo em ambos os casos uma dissolução dos pormenores, alcançada de formas distintas.

O resultado é rarefação versus densificação. Nas palavras do artista: «The ambiguity is paramount – readings oscillate in between shadow/rock/void/water/vaporous material and between painting and paint – between purposeful and aimless gesture – between all and nothing at all. A state of pre-perception and of pre-history. A raw state before seeing.» (Ibid.) O modo como Beard explora os extremos, os limites do visível, parece ter dirigido a seleção das restantes obras expostas, que não pertencem à coleção. Esta ideia pode ser reforçada pelo título atribuído à mostra.

O início das referidas pesquisas está representado nesta exposição por uma fotografia – Adraga (1993) –, na qual as águas movimentadas do Atlântico embatem no rochedo, que surge como uma mancha negra na fotografia. Um conjunto de pequenas pinturas sobre papel demonstra o desenvolvimento dos trabalhos de Beard em torno da rocha e na relação com o mar, que progressivamente se afastam da figuração e se aproximam da abstração lírica, na qual já não se reconhece a forma da rocha, nem as ondas do mar, mas se sente a energia dos diferentes elementos, a leveza do ar, a rugosidade da rocha, a densidade da espuma das ondas e a sua agitação. As gradações entre o preto e o branco são neste caso trabalhadas em pintura e desenho, com diferentes materiais, e a sequência criada, na qual o branco e o preto se intercalam, dá a sensação de expansão e contração.

A estes trabalhos juntam-se três pinturas recentes, dois autorretratos do artista (os quais intitula de Head) e uma pintura que representa a mão da sua filha. Nos dois primeiros, os traços do rosto do artista vislumbram-se com grande dificuldade, como se um véu negro se tivesse apoderado da imagem, escurecendo-a de tal maneira, que forma e fundo se confundem. Estes autorretratos parecem fazer referência a um mundo interior que está para além do visível e que muitas vezes é confundido com aquilo que é imediatamente percetível.

No extremo oposto, no sentido da sombra para a luz, encontra-se a pintura a óleo Hand (2005). O processo por detrás desta pintura tem bastantes semelhanças com o dos trabalhos intitulados Land's End. A partir de um frame do vídeo Aisle (2005), em que uma criança espalha com as mãos pó branco pelo chão de uma sala, o artista realiza uma série de pinturas, sendo esta a primeira. No vídeo, ao longo da ação, as mãos da criança vão ficando progressivamente cobertas desse pó, deixando de se ver a pele. O branco entra na pintura e domina-a. Neste caso, forma e fundo partilham a mesma textura e os contrastes são atenuados. A mão parece absorver aquilo em que toca confundindo-se com o mundo exterior.

Esta exposição revela como John Beard, desde a série Adraga, trabalha a noção de limite, ao nível da perceção, explorando diversos media, e conceptualmente, através das temáticas que aprofunda, desde as linhas de fronteira e marcos naturais até aos limites do corpo e suas linhas definidoras. Num ensaio sobre o trabalho de Beard, Paul McGillick estabelece uma curiosa relação entre os seus autorretratos e as pinturas Adraga: «There is a similar kind of entropy in the recent work of John Beard which began in the mid-1990's with his "Adraga" paintings […]. This investigation of the fugitive character of the rock constantly transformed by a surging sea in the mercurial light of the Atlantic Ocean has continued in his portrait paintings which propose the very impossibility of portraiture with heads which don't reveal themselves immediately, emerging only after sustained scrutiny, and then with a continuing sense of fugitive vulnerability.» (John Beard, 2011, p. 208)

À semelhança das outras exposições rotativas, também esta não possui uma publicação associada.

Mariana Roquette Teixeira, 2019


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Coleção Gulbenkian

The Land's End

John Beard (1943-)

The Land's End, 1998/99 / Inv. 00GE604


Fotografias


Periódicos


Páginas Web


Fontes Arquivísticas

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 113016

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG-CAMJAP, Lisboa) 2005


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