Entre 1977 e 2002, os Encontros Gulbenkian de Música Contemporânea (EGMC) deixaram uma marca saliente no panorama da música erudita em Portugal. A programação da 23.ª edição, em 1999, contou com uma exposição dedicada ao célebre compositor Arnold Schoenberg (1874-1951). Pioneiro do vanguardismo musical da primeira metade do século XX, Schoenberg foi também pintor, filósofo, pedagogo. Embora com enfoque sobre a sua música, esta exposição esforçou-se por dar expressão ao autor na sua totalidade, cobrindo os vários campos em que se desdobrou o seu espírito.

Com comissariado de Nuria Schoenberg Nono e Lawrence A. Schoenberg, dois dos três filhos do artista, a mostra apresentou um caráter multimédia, apelando a uma fruição multissensorial. Inaugurou a 3 de maio de 1999 na Galeria de Exposições Temporárias da Sede da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) (piso 01) e ficou patente até dia 16 desse mês – coincidindo na totalidade com o período em que decorreu a 23.ª edição dos EGMC. Segundo um artigo de Cristina Fernandes para o jornal Público – em que são recolhidos vários depoimentos de Nuria Schoenberg Nono a propósito da iniciativa –, esta passagem da mostra por Lisboa era a nova etapa de uma itinerância que já havia estado patente em várias cidades europeias desde que se estreara em Veneza, «apenas três dias antes do terrível incêndio que destruiu o mítico Teatro La Fenice», ou seja, a 26 de janeiro de 1996 (Fernandes, Público, 4 mai. 1999).

A componente visual da mostra partia de 12 painéis com montagens fotográficas rememorando episódios da vida de Schoenberg e do seu envolvimento nos contextos artísticos do seu tempo. Reproduziam fotografias de época, documentos, epistolografia, cartazes de eventos relevantes, obras de artes visuais da autoria do compositor e de artistas seus contemporâneos. Houve também lugar para o vídeo e para os formatos informáticos, sendo disponibilizados computadores em que era possível navegar num CD-ROM e aceder, via Internet (que era então novidade), a uma plataforma do Arnold Schönberg Center (Viena). A tudo isso se somavam alguns livros e partituras para consulta, junto a consolas que disponibilizavam gravações de obras integrais de Schoenberg, para audição no local (Arnold Schoenberg (1874-1951), vol. 1, 1999).

Acompanhando todos esses dispositivos, a dimensão sonora foi obviamente crucial. Era facultada aos visitantes uma edição em CD com 18 faixas áudio que se relacionavam com os 12 painéis expostos. Esse material fornecia textos ditados, da autoria de Christopher Hailey, conjugados com testemunhos do próprio Schoenberg e, claro, com diversos trechos musicais. Alguns passos desses audioguias debruçam-se, inclusivamente, sobre a métrica de algumas composições do músico, esforçando-se por comunicar essas temáticas específicas de um modo acessível à compreensão da generalidade do público.

Para a exposição na Fundação Gulbenkian, esse CD mereceu, naturalmente, uma versão portuguesa, editada pela FCG em conjunto com a Sony Music Entertainment. Encontra-se atualmente disponível para consulta na Biblioteca de Arte da FCG (CDR 174), fazendo-se acompanhar de duas outras publicações que também estiveram disponíveis durante a exposição. Igualmente em versões portuguesas, uma delas apresenta a transcrição textual de cada uma das faixas do CD, enquanto a outra cataloga os 12 painéis expostos, incluindo ainda uma introdução à mostra assinada pelos comissários e o ensaio «Schoenberg: estética e ética», de Massimo Cacciari (Ibid.).

Para a montagem de «Arnold Schoenberg (1874-1951). Uma Exposição Multimédia Interactiva», o Serviço de Música da FCG contou com a colaboração direta de vários serviços da Fundação, nomeadamente, os Serviços Centrais, o Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão e o Serviço de Orçamento, Planeamento e Controlo (Divisão de Informática). Entre as muitas entidades externas que apoiaram a iniciativa, contam-se o Departamento Cultural do Município de Viena, o Ministério Federal da Áustria para a Ciência, Criação e Arte e o Ministério Federal da Áustria para os Negócios Estrangeiros.

Paralelamente a esta mostra, a programação da 23.ª edição dos EGMC apresentou outros momentos dedicados a Schoenberg. Às 18.30 do dia 4 de maio de 1999, no Auditório 2 da FCG, teve lugar uma conferência-recital do pianista Stefan Litwin, com a colaboração de Nuria Schoenberg Nono. Nesse evento, foram interpretadas as obras Três Peças para Piano, op. 11, Seis Pequenas Peças, op. 19 e Sinfonia de Câmara, op. 9 (redução para piano de Eduard Steuermann). Dois dias depois, no mesmo Auditório 2, deu-se a exibição de My War Years, documentário sobre a vida e obra do compositor, com realização de Larry Weinstein. Já nos últimos dias da exposição, às 21.30 do dia 14 de maio de 1999, a Orquestra Gulbenkian, sob orientação do maestro Luca Pfaff, integrou na sua apresentação as Cinco Peças para Orquestra, op. 16 e Concerto para Piano e Orquestra, op. 42, esta última com Michel Béroff como solista. Schoenberg voltaria ao Grande Auditório da FCG no último espetáculo deste ciclo de programação, com as Cinco Peças para Orquestra, op. 16 (versão integral) a figurarem entre as obras interpretadas pela Orquestra Sinfónica Portuguesa e pelo Electric Phoenix Ensemble, com condução do maestro Michael Zilm (23.os Encontros Gulbenkian de Música Contemporânea [Programa], 1999).

Daniel Peres, 2019