Exposição de desenhos de Ofélia Marques (1902-1952) pertencentes à coleção do Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP). Apresentada na Galeria do Piso 01 do Centro de Arte Moderna, esta mostra dava início, a par de «Gonçalo Duarte» (piso 0), a um programa de exposições rotativas com obras da coleção, que se estenderia até 2006.

Em abril de 2001, o CAMJAP reabre ao público após algumas intervenções no edifício. A exposição que então se inaugurava integrava duas áreas para mostras rotativas com duração de seis meses. Com estes espaços, um deles no piso 01 e outro no piso 0, procurava-se, por um lado, conferir maior dinamismo à mostra permanente e, por outro, proporcionar ao visitante o contacto com determinados núcleos da coleção, que, pela sua especificidade, dificilmente seriam integráveis num discurso expositivo que abrangia um século de história. Por outro lado, estes espaços lembram o conceito das cabanes ensaiado por Pontus Hultén no Musée National d'Art Moderne, em Paris, que consistia na criação, ao longo da exposição, de espaços acolhedores, projetados para trabalhos de menor escala, onde o espectador podia fazer um intervalo na sua visita e concentrar-se numa particularidade da coleção.

Esta exposição apresenta pela primeira vez e de modo integral no CAMJAP uma série de guaches datada da década de 1930, na qual Ofélia Marques retrata, de modo caricatural, os seus amigos enquanto crianças, a maioria dos quais, figuras proeminentes das artes e letras portuguesas.

Incorporados na coleção do CAM em 1980, estes trabalhos surgem na linha de outros desenhos de crianças, de traços naïf, que ocuparam a artista. A temática da infância, predominante na sua produção, vai adquirindo diferentes sentidos, consoante a natureza ilustrativa ou caricatural dos trabalhos.

Neste caso, a identidade das figuras representadas e o modo como são retratadas conferem um significado de crítica social ou de costumes a esta série. Além do título, alguns traços caracterizadores dos retratados quando adultos (como os grandes olhos de Almada Negreiros ou as tranças de Fernanda de Castro) permitem a sua identificação, num processo lúdico de «quem é quem» semelhante àquele vivido quando se reveem antigos álbuns de fotografia. Por outro lado, a homogeneização no tratamento dos retratados, com roupas cuidadas, executando uma atividade ou empunhando um objeto (simbólico), faz transparecer um tom crítico e irónico sobre os convencionais retratos de infância.

A muitos dos caricaturados, Ofélia dotou-os de elementos simbólicos que denotam a sua futura atividade ou traços de personalidade, como a ardósia com operações matemáticas simples com que surge representado Bento de Jesus Caraça, o caderno e a folha de papel que acompanham Fernanda de Castro e José Gomes Ferreira, ou as pastas de desenhos que Maria Keil e Almada Negreiros transportam. Deste conjunto faz também parte um autorretrato da artista quando criança. Ofélia Marques representa-se com uma pequena mala de onde parece sair um desenho.

Outras figuras surgem sem este tipo de referências, como por exemplo António Ferro, que brinca com um ioiô, opção que parece não ser fortuita se encararmos esta série também como uma reflexão sobre a infância. Como refere Emília Ferreira, «não minimizando o seu desgosto por não ter sido mãe, não podemos contudo esquecer ter sido precisamente nos anos 20 – década em que ela, como os demais modernistas da sua geração, começou a trabalhar em ilustração – que a infância emergiu como tema de interesse social» (Ofélia Marques. Quarenta Caricaturas, Vinte e Um Desenhos, 2002, p. 5).

A esta exposição seguiu-se «Múltiplos de Sonia Delaunay», patente entre 7 de janeiro e 30 de junho de 2002.

Mariana Roquette Teixeira, 2018