Entrevista a Ana Hatherly, conduzida por Ana Sousa Dias no âmbito do programa da RTP 2 «Por Outro Lado IV», tocando em aspetos profissionais e pessoais da vida da artista. Ana Hatherly revela que o seu sonho de carreira não era no âmbito das artes plásticas, mas sim na música, como cantora lírica. Por impossibilidades físicas, esta via foi-lhe negada, o que a levou a conduzir o seu impulso criativo para a escrita e as artes plásticas.

A artista fala da sua infância e da educação conservadora e católica dada pela sua avó, com quem vivia: «Eu não tenho o mito da infância. Eu não acho que a infância seja a idade de ouro... Para mim a infância nunca foi a idade de ouro. Na verdade, eu nunca tive uma idade de ouro. […] Não tenho saudades nenhumas de nada.» Apesar de desprezar a infância, não deixa de referir a sua relação com os rituais cristãos, com o universo cinematográfico – em particular o filme O Homem Invisível, com Claude Rains – e com a literatura, destacando Dom Quixote, de Cervantes. Confessa na entrevista que estas reminiscências da infância contaminam o seu trabalho plástico.

Hatherly conta histórias do seu percurso profissional na Califórnia, do seu fascínio pelo Egito, das suas tentativas de composição musical sobre poemas de Rilke, do seu fascínio pelos caracteres chineses, das suas traduções, e faz considerações sobre o estatuto do artista como ser andrógino: «Eu considero que o criador, o artista, seja o que for, tem que ser andrógino, tem que ter os dois sexos reunidos, e só assim é que pode criar seja o que for. […] Quando estou a escrever sou outra pessoa, é a mão inteligente.»

Termina com uma reflexão acerca da questão da fé e do sagrado na arte.