CD-Sharon-Isbin

Rouse, Christopher / Dun, Tan

Concert de Gaudí for Guitar and Orchestra
Concerto for Guitar and Orchestra (Yi2)

A Orquestra Gulbenkian continua a alargar a sua presença em catálogos de representatividade internacional de forma consistente e bem planeada. Em vez de tentar afirmar-se em repertórios por demais gravados e visitados por formações lendárias como é o caso, por exemplo, da música orquestral germânica, tem vindo a gravar sobretudo obras concertantes. Com oportunidade tem privilegiado a divulgação de música marginalizada, como é o caso do disco (Hyperion) consagrado a José Vianna da Mota, com um Artur Pizarro como solista no seu melhor, e agora um disco consagrado a música contemporânea para viola, o instrumento que, por desleixo terminológico, é normalmente designado entre nós como guitarra, aquela que não é portuguesa bem entendido. As obras em programa são dois concertos de Christopher Rouse – Concerto Gaudí (1999) – e de Tan Dun – Concerto Yi2 (1996) -, este último autor da tão falada banda sonora do filme In the Mood for Love, de Wong Kar-Wai e vencedor do Oscar para melhor banda sonora com Crouching Tiger, Hidden Dragon, de Ang Lee.

Apesar de tudo o que os distancia, verifica-se em ambos os concertos a omnipresença (mesmo que num plano imaginário) de Espanha e da tradição do flamenco. Em Christopher Rouse, o uso de castanholas, o jogo rítmico em crescendos abruptamente interrompidos que lembram o sapateado, para além da introdução que remete para esse ícone que é o Concerto de Aranjuez. Em Tan Dun, o carácter do primeiro tema que contem já uma célula percussiva (no próprio corpo da guitarra) que se vai expandindo em rasgueados numa clara referência ao flamenco. Tema este que se vai alterando depois numa simbiose de arabescos modais em clara alusão à música chinesa. A presença obsessiva de uma percussão telúrica, no extremo grave, que nos remete para um espaço monástico no ”topo do mundo” fora já a ”imagem de marca” da sua Sinfonia 1997, e a ser usada muito mais vezes tornar-se-á um ”cliché” pessoal. Em C. Rouse trata-se mais da manipulação de recursos conhecidos num jogo de atmosferas, sem que se pretenda uma total autonomia em relação às referências em causa. Estamos perante a possibilidade de conceber um estádio secundário na descomplexada relação do pós-modernismo com o passado ou a invenção alheia.

Por seu lado a obra de Tan Dun oferece uma mais efectiva recriação individual de referências assumidas, criando um mundo próprio de traços mais originais o que se deve também, em certa medida, à integração do exotismo.

Sharon Isbin é um nome de referência, confirmado neste disco. Virtuosa, transmite tudo aquilo que é sedução imediata na transparência harmónica, tudo o que é envolvimento físico, visceral contidos na natureza do próprio instrumento, mas ainda lirismo melódico, minúcia no detalhe tímbrico.

Sob a direcção de Muhai Tang, a Orquestra Gulbenkian oferece uma paleta variada de efeitos tímbricos bem trabalhados autonomamente, embora no Concerto Gaudí se percam pontualmente os fios de ligação entre esses mesmos momentos de efeito, ou seja, a continuidade do confronto e cumplicidade entre orquestra e solista. Os efeitos de ”pathos” espacializado próprio ao universo orquestral americano precisariam também de ser um pouco mais ”ampliados”. Já no Concerto de Tan Dun a interacção entre solista e orquestra ganha uma acuidade e riqueza notáveis, confluindo com naturalidade as partes para um todo. Constitui-se até talvez como uma das melhores prestações da Orquestra Gulbenkian sob a direcção de Muhai Tang disponíveis em disco.

Uma última referência à gravação que apesar da extrema clareza e limpidez, privilegia em excesso a presença sonora do instrumento solista, afastando-nos da realidade concreta da música, o que é pena já que ainda por cima se trata de uma gravação ao vivo.

Vanda de Sá

Intérpretes:
  • Muhai Tang (direcção)
  • Orquestra Gulbenkian
  • Sharon Isbin (guitarra)
Atualização em 18 setembro 2018

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