Tinoco, Luís
Round Time
Caixa de música A água e a ondulação são os temas fortes do disco de Luís Tinoco
A música portuguesa vai alastrando pelo catálogo da Naxos. Há várias obras da polifonia portuguesa (pelo Ars Nova), as sonatas para cravo de Carlos Seixas (por Débora Hatász) e a música para piano de Vianna da Motta (por Sequeira Costa); as obras sinfónicas de Luís de Freitas Branco. Joly Braga Santos, Frederico de Freitas pela batuta de Álvaro Cassuto (que também gravou repertório barroco com orquestras modernas). Recentemente houve o êxito de “La Spinalba”, de Francisco António de Almeida, pel’Os Músicos do Tejo. Chegou agora a vez de um contemporâneo, Luís Tinoco (n. 1969), com um CD gravado na Gulbenkian com a Orquestra da Casa sob a direção de David Alan Miller (diretor musical da Albany Symphony Orchestra). A peça que dá o nome ao disco, “Round Time” (2002), é a única puramente orquestral e também a mais antiga. Com uma orquestra reforçada por uma generosa secção percutiva, Tinoco cria atmosferas variadas, ora tranquilas ora alucinatórias, espectrais mas também gravíticas, que mantêm o ouvinte num estado de suspensão animada. “Round Time” começa bem, com uns pingos sonoros, depressa interrompidos por assomos de imponência e lampejos impressionistas. A unidade da obra é conseguida através de uma insistente pulsação interior alentada aqui e ali por impulsos de energia, e o desfecho surge com um inesperado fogacho jazzístico. Seguem-se três ciclos vocais cuja respiração parece emanar de “Round Time”. Tinoco compõe bem para a voz as óperas “Evil Machines” (2008) e “Paint Me” (2010) são prova disso e tem colaborado com as três sopranos deste disco. “From the depth of dístance” (2008), estreada pelas Orquestras do Algarve e Sinfónica de Albany, recorre a fragmentos de Fernando Pessoa (“Ode Marítima”) e de Walt Whitman (“Passage to índia”), na voz cristaJina e luminosa de Ana Quintans. Tinoco destrinça os idiomas, situando o inglês nos registos vocais mais agudos e reservando o português para os registos médio e baixo-médio. É, para mim, o highiight do programa uma peça verdadeiramente mesmérica. O tema e o ritmo da viagem, do mar e do comboio estão presentes nos vocalizos da cantora e no seu balbuciar etéreo que nos embala e encanta. F. depois há a grande tirada wordsworthiana de que aos cientistas e inventores (químico, geólogo, etc.) se seguem os poetas! Os “Search Songs” (2007), também baseados em poemas de Pessoa (em inglês), parecem-me menos conseguidos em parte porque a altura estratosférica da linha vocal (Yeree Suh) toma as palavras indecifráveis. Por outro lado, há uma maior e mais excitante diversidade dramática, do bloqueio insano do escritor (Towards the End’) à caricatura mágica (gogoliana, lhe chama o compositor Marc André Dalbavie em nota do livrete) de ‘Justice” e The Lip’ (que Shostakovitch não desdenharia musicar). Os ritmos são agora muito mais intensos, as vezes obstinados. Por último, as “Canções do Sonhador Solitário” resultam da redução de uma cantata (2011), com libreto de Almeida Faria, encomendada pela Casa da Música. Mais interessante do que a linha vocal (algo monótona), entregue a Raquel Camarinha, são os envolvimentos orquestrais polifónico (o orfeico ‘Sonhador Feliz’), sinuoso (‘Qualquer Encontro’), trémulo e agoirento (‘O Anjo da Água’). Um passo importante na internacionalização da música portuguesa contemporânea. Jorge Calado Expresso, 04 Maio 2013 TINOCO: Round TimeAna Quintans, Yeree Suh, Raquel Camarinha, sopranos. Orquestra Gulbenkian / David Allan MillerNaxos 8.572981Luis Tinoco es uno de los compositores más interesantes de las últimas generaciones de la música portuguesa. Round Time fue una de las obras que con mayor fuerza marcaron su carrera y en ella Tinoco exhibe una rica paleta orquestal, capaz de inventar un mosaico de atmósferas sonoras muy contrastadas. Las restantes obras del disco son vocales, un terreno que Tinoco maneja a la perfección. From the Depth of Distance respondió a un encargo sobre los navegantes portugueses, aunque el músico prefirió entrarse en la idea del descubrimiento interior. Los poemas de Pessoa y Whitman son cantados por una soprano, que pasa de lo silábico a lo recitativo, con alguna sugerencia jazzística. Search songs, es un ciclo que adquiere tintes más dramáticos e incorpora recursos sonoros repetitivos. Finalmente, las Canções do Sonhador Solitário tienen un tono melancólico, con efectos sonoros muy sutiles, como la caja de música que se sugiere en la primera canción. Estamos ante un compositor muy fino que merece toda nuestra atención. Además, la Orquesta Gulbenkian es una de las mejores de Portugal y la producción se debe a Antena 2, la emisora clásica de la RTP, lo que demuestra todo lo que todavía puede hacer una radio pública por la difusión de la música de su país.C.B.Ritmo nº 868, Novembro 2013
Intérpretes:
- David Alan Miller (Maestro)
- Orquestra Gulbenkian