Maria João Pires

Coro Infanto-Juvenil da Universidade de Lisboa

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Grande Auditório Fundação Calouste Gulbenkian

Maria João Pires Piano
Coro Infanto-Juvenil da Universidade de Lisboa
Erica Mandillo Direção

Ludwig van Beethoven
Sonata para Piano n.º 31, em Lá bemol Maior, op. 110
1. Moderato cantabile molto espressivo
2. Scherzo: Allegro molto
3. Adagio ma non troppo – Fuga: Allegro ma non troppo

Composição: 1821
Duração: c. 23 min.

As últimas sonatas para piano de Beethoven foram escritas entre 1821 e 1822. As suas edições refletem a notoriedade internacional do compositor na época, tendo sido publicadas em Viena, Paris, Berlim e Londres. Numa primeira fase, as sonatas para pianoforte eram um género de salão, destinadas a práticas domésticas de sociabilidade. Posteriormente, integraram as apresentações de músicos proeminentes nos salões aristocráticos de Viena. Nesse género, Beethoven foi apresentado como o paradigma da organicidade, tendo as suas obras sido modelares para o ensino da composição e da análise nos séculos XIX e XX. Contudo, as obras incluídas neste recital enquadram-se numa perspetiva de rutura estilística, quando Beethoven se dedicou ao estudo do contraponto associado a compositores do passado. O regresso ao princípio da variação, numa abordagem distinta do jovem improvisador que se afirmou perante a aristocracia melómana de Viena, o fascínio pela fuga e uma abordagem mais lírica às melodias marcam as duas sonatas deste recital.

Os temas da Sonata para Piano n.º 31, op. 110, encontram-se interligados, sendo baseados nas seis primeiras notas da escala diatónica. O Moderato cantabile molto espressivo encontra-se numa forma allegro de sonata em que o primeiro grupo temático prima pelo lirismo, numa associação melodia/harmonia claramente beethoveniana. A transição arpejada conduz-nos à vivacidade rítmica do segundo grupo temático, no qual se destaca uma ornamentação que desempenha funções estruturais. O gesto musical que lança a sonata forma a base do desenvolvimento, fortemente relacionado com o primeiro grupo temático. A textura esparsa, baseada num contraponto aparentemente simples, revela o estilo depurado de Beethoven nesta fase e conduz à reexposição, secção que mistura o primeiro grupo temático com elementos da transição arpejada. Segue-se uma ponte baseada na transformação constante que introduz o segundo grupo temático, cuja apresentação leva a uma coda sobre uma nota pedal, evidenciando a economia dos meios utilizados por Beethoven na sonata.

O Allegro molto encontra-se numa forma ABA’ em que as alternâncias entre registos e dinâmicas das secções extremas são constitutivas, aproveitando a variedade tímbrica do pianoforte da época. A leveza e a verticalidade da seção A cede às passagens rápidas e imprevisíveis da B, em que as várias vozes da textura se encontram em pontos inesperados, acentuados pela sincopação da mão esquerda. A secção inicial é retomada, mas com variantes significativas.

O Adagio non tropo é um recitativo plangente, dando lugar a um arioso contemplativo cuja melodia é enfatizada pela regularidade do acompanhamento, que constrói e destrói tensão, até se diluir numa melodia em uníssono. Segue-se uma fuga a três vozes, que funciona como secção de transição, antecipando o retorno do arioso numa textura mais densa, graças ao acompanhamento pesado e grave. A repetição obstinada de um acorde prepara uma nova fuga, baseada no material temático da fuga anterior. Maior intensidade é conseguida pela aceleração rítmica, conduzindo a sonata ao final.

 

Felix Mendelssohn-Bartholdy
“Terceto de Anjos” da oratória Elias, op. 70

Composição: 1946
Duração: c. 2 min.

Prodígio precoce, Felix Mendelssohn começou a escrever obras musicais de notável maturidade artística ainda antes dos vinte anos. Aos dezasseis anos tinha já completado o seu magnífico Octeto de Cordas op. 20 e provado o seu virtuosismo no violino e no piano. Para além de músico completo, foi também um poeta talentoso, um poliglota e um filósofo, iluminando com um toque de excelência qualquer expressão artística à qual dedicasse o seu tempo. Gozando de uma situação social favorável, homem culto e viajado, exerceu uma forte influência intelectual sobre a música. A oratória Elias, que inclui o “Terceto de Anjos” na segunda parte, foi escrita no espírito de antecessores barrocos como J. S. Bach (a quem dedicou um verdadeiro culto), mas sobretudo G. F. Händel, cujas oratórias admirava profundamente. Não obstante, o lirismo e uso da cor orquestral e coral refletem claramente o estilo de Mendelssohn como um compositor romântico. Depois de Paulus (1836), o compositor começou a idealizar uma nova oratória, também sobre um tema bíblico. Mas Mendelssohn só viria a ocupar-se novamente de Elias em 1845, quando o Festival de Música de Birmingham lhe encomendou uma nova obra, a estrear no ano seguinte. O compositor tinha já uma boa relação com Inglaterra, sobretudo com Birmingham, onde tinha dirigido Paulus (1837) e a sinfonia Lobgesang (1840) com grande êxito. A música foi escrita sobre o libreto em alemão e só depois traduzida para a língua inglesa por William Bartholomew.

 

Franz Schubert
Nacht und Träume, D. 827
An die Musik, D. 547
Du bist die Ruh, D. 776
Salmo 23, “Gott ist mein Hirt“, D. 706

Composição: 1817, 1823, 1822, 1820
Durações: c. 3, 5, 4, 6 min.

Jovem contemporâneo de Goethe e de Schiller e testemunho da revolução romântica de Tieck, dos irmãos Schlegel, de Novalis e de H. Heine, Franz Schubert estabeleceu, através das suas canções, um equilíbrio perfeito entre a melodia e o acompanhamento, entre o sentimento e o elemento descritivo. Para além do sentido melódico, os Lieder de Schubert evidenciam a intuição do autor no domínio do colorido harmónico e da modulação e encontram no acompanhamento pianístico o complemento ideal para a tradução dos estados anímicos evocados pelos poemas.

Entre 1815 e 1827, Schubert musicou doze poemas de Franz von Schobert (1796-1882). O mais proeminente aspeto de An die Musik reside na sua melodia, cujo arco melancólico se passeia entre tonalidades e acordes. Esta graciosa curva acompanha a frase germinal do poema: “Tu, graciosa arte”. No final de 1822, Schubert teve um auge de criatividade com a descoberta de novos poetas, entre os quais Friedrich Rückert (1788-1866). Du bist die Ruh data de 1823 e pertence a um conjunto de quatro Lieder reunidos sob o opus 59. Nesta obra-prima de Schubert, um poema de forte sentimento romântico é musicalmente elevado a um grau de adoração quase religiosa. Nacht und Träume, sobre poema de Matthäus von Collin (1779-1824), foi composto em 1822. Para além de uma meditação, é uma experiência no universo onírico que, do ponto de vista musical, faz apelo a elementos expressivos extremos, fundados em ousados processos modulatórios.

Em dezembro 1820, Schubert acedeu a um pedido da sua amiga Anna Fröhlich (1793-1880), professora de canto no Conservatório de Viena, e musicou o salmo atribuído ao Rei David “O Senhor é o meu pastor”. Sobre uma tradução alemã do filósofo Moses Mendelssohn (avô de Felix Mendelssohn) a peça foi originalmente escrita para dois sopranos e dois contraltos, com acompanhamento de piano. Em agosto do ano seguinte, foi apresentada publicamente numa audição de alunos no Gundelhof, em Viena, tendo-se tornado popular desde então. Desde o requinte da curta introdução do piano e da celestial entrada das vozes, passando pelo elegante progresso harmónico e pelo fino desenho melódico até à feliz declaração final de fé, a definição do ambiente sacro definido por Schubert rivaliza com o do seu Ave Maria (D. 839), sendo uma das peças mais arrebatadoras de música vocal religiosa compostas pelo compositor austríaco.

 

Ludwig van Beethoven
Sonata para Piano n.º 32, em Dó menor, op. 111
1. Maestoso – Allegro con brio ed appassionato
2. Arietta: Adagio molto semplice e cantabile

Composição: 1822
Duração: c. 30 min.

A Sonata para Piano n.º 32, op. 111, foi dedicada ao Arquiduque Rudolfo, patrono, aluno e amigo de Beethoven, tendo a impressão inglesa sido dedicada a Antonie Brentano, uma amiga próxima do compositor. O Maestoso encontra-se numa forma allegro de sonata precedida por uma introdução lenta em que pontificam o pathos e a dissonância, reforçados pelos ritmos pontuados. O primeiro grupo temático recupera algumas características da introdução, sendo apresentado, de forma virtuosística, em uníssono e, posteriormente, com acompanhamento. A ponte modulante baseia-se num fugato que intensifica a instabilidade tonal e harmónica do andamento, cedendo lugar a um segundo grupo temático breve, de características líricas e contemplativas. Segue-se uma fuga, apresentada em diversas texturas. O desenvolvimento tempestuoso é instável e altamente contrapontístico, remetendo para o primeiro grupo temático. A repetição do primeiro tema marca a reexposição, cuja ponte transformada conduz ao desenvolvimento do segundo grupo temático e à coda final.

A sonata termina com um andamento em forma de tema e variações com coda. A Arietta em que se baseia é uma melodia contemplativa dividida em duas partes, onde pontificam a repetição e a verticalidade. A continuidade dá a tónica ao andamento, não havendo quebras entre secções. As duas primeiras variações assentam em mudanças de métrica num contexto de aceleração rítmica, no recurso a arpejos virtuosísticos, na constante transformação harmónica e no contraste entre texturas de várias densidades. O caráter dançável sincopado da terceira variação antecipa os acordes sobre uma nota pedal grave, interpolados por passagens mais movimentadas e leves, características da quarta variação. A fragmentação progressiva dos materiais temáticos conduz-nos aos trilos do final, o auge da dissolução temática empreendida por Beethoven ao longo da obra.

 

Arvo Pärt
Vater Unser

Composição: 2005
Duração: c. 3 min.

Desde a sua saída da Estónia, na então União Soviética, em 1980, Arvo Pärt concentrou-se sobretudo na composição de peças sobre textos religiosos, os quais foram sendo incluídos no repertório corrente de coros e outros agrupamentos de todo o mundo. Escrita para voz branca ou contratenor com acompanhamento de piano, a peça Vater unser é baseada no texto em alemão da Oração do Senhor, ou Pai Nosso. Foi estreada na Áustria em 2005 e, mais tarde, Pärt dedicou a peça ao Santo Padre, Papa Bento XVI. Em julho de 2011, Heldur Harry Põlda e Arvo Pärt interpretaram a peça para o Papa, no Vaticano, por ocasião das celebrações do 60.º aniversário da ordenação de Joseph Ratzinger como sacerdote.

Na sua sonoridade geral e na sua estrutura, a peça é diferente do trabalho usual de Pärt, tendo sido criada como uma canção espontânea, independente de um sistema pré-determinado. A simples e encurvada linha melódica e a harmonia do piano destacam, em parte, a ideia contida no texto “Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos”.

Em 2013, Pärt realizou um arranjo da peça para voz branca ou contratenor e cordas. Esta versão foi estreada a 3 de outubro de 2013 em Wollongong, na Austrália, tendo sido então interpretada pelo contratenor Andreas Scholl, acompanhado por um quinteto de cordas da Orquestra de Câmara Australiana.

Notas de Miguel Martins Ribeiro e João Silva (Beethoven)

Ao longo dos anos, as presenças de Maria João Pires no Grande Auditório Gulbenkian, seja em recital ou com orquestra, têm-se revelado verdadeiros acontecimentos no calendário musical português. Em 2019, em relação à sua interpretação de Schubert, havia o jornal Público de elogiar-lhe o “tom contido”, como se partilhasse com a audiência que “em Schubert não é preciso mais, está tudo lá”. Neste programa especial, partilhado com o Coro Infanto-Juvenil da Universidade de Lisboa, a pianista emoldura a “voz” de Schubert com uma luz muito pessoal, juntando-lhe duas sonatas para piano de Beethoven e ainda peças de Mendelssohn e Pärt.

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