Exposição individual de pinturas de Ricardo Cruz-Filipe (1934), comissariada por João Pinharanda. Foram expostas cerca de 40 pinturas, que representam paisagens interiores através de uma técnica de desconstrução da imagem que estabelece o diálogo entre a fotografia e a pintura.
Solo exhibition of paintings by Ricardo Cruz-Filipe (1943) curated by João Pinharanda. The show featured around 40 works depicting inland landscapes through a technique of image deconstruction which created a dialogue between photography and painting.
Exposição de trabalhos de Ricardo Cruz-Filipe (1934), organizada pelo Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP) e comissariada por João Pinharanda. A mostra esteve patente no piso 01 da Galeria de Exposições Temporárias da Sede da FCG, de 16 de fevereiro a 8 de abril de 2007, tendo sido inaugurada a 15 de fevereiro com a presença de inúmeras figuras célebres do panorama das artes e da cultural em Portugal, entre as quais o historiador José-Augusto França.
Foram expostos cerca de 40 trabalhos da produção mais recente de Cruz-Filipe, relativamente aos quais Jorge Molder, diretor do CAMJAP, no texto de apresentação do catálogo, defende uma classificação que privilegie os termos «obras» e «transformações». Com o primeiro destes conceitos, Molder visa substituir a designação específica «pintura», uma vez que a índole mais lata destes trabalhos os insere num espaço e num tempo de transição entre a pintura e a fotografia. Já com «transformações», Molder centra-se no processo construtivo das obras, pondo o foco na transformação que as imagens sofrem, num «jogo que [se] desenvolve através da articulação, contaminação, e até intrusão de planos a que podemos chamar ecrãs» (Cruz-Filipe. Paisagens Múltiplas, 2007, p. VII).
Também João Pinharanda partilhou a vontade de estabelecer uma tipologia na designação destes trabalhos. Para o curador da exposição, além da situação intermédia entre a fotografia e a pintura, existe também uma vontade de fazer coexistir tradição e contemporaneidade: «Tradição e mudança estão presentes em toda a obra de Cruz-Filipe através de uma troca de estatutos entre pintura e fotografia, entre imagem unitária e colagem. A sua obra adquire, nessa economia de troca, uma dinâmica formal e de significados que subverte modelos e hierarquias, sem subverter valores (morais) e disciplinas (de trabalho).» (Cruz-Filipe. Paisagens Múltiplas, 2007, p. IX)
A sua prática, desenvolvida desde a década de 1960 e que se destaca por uma técnica de justaposição de fotografia e pintura e de utilização simultânea de imagens de diferentes momentos e autores, passa por uma desconstrução da imagem, cujo resultado é a reordenação de fragmentos e a atribuição de novos significados. Se o trabalho de Cruz-Filipe deve à Pop a técnica da colagem, reflete igualmente uma influência de ordem erudita, que o artista vai buscar à pintura renascentista, maneirista, barroca, neoclássica e romântica, e que tem um grande peso na teatralidade final das telas. Além do dramatismo presente em cada obra, que se deve também à reconstrução artificial da natureza e que João Pinharanda equipara à cenografia, o caráter cinematográfico do conjunto foi possível graças à montagem da exposição: «É a sua continuidade, reforçada pela montagem das obras na sucessão das sete salas e do corredor, mas também a sua permanente diversidade, que agora nos sugerem um plano de sequência cinematográfico – ou que, se consideradas na sua individualidade, nos sugerem uma coleção de cortinas de cena.» (Cruz-Filipe. Paisagens Múltiplas, 2007, p. XI)
Apesar de os trabalhos expostos resultarem de um conjunto complexo de técnicas e procedimentos, a simplificação aparente dos elementos formais expressava a vontade do artista de dirigir a interpretação, atribuindo à obra um estatuto de identidade própria e não de representação de algo. No entanto, e tal como refere João Pinharanda, não foi intenção do autor que a série revelasse uma «simplificação dos protocolos criativos nos processos de trabalho» (Ibid.).
A temática desenvolvida é a paisagem, registada pelo artista ou recolhida em revistas, através de imagens recortadas e associadas a outras por afinidade ou contraste, intuitiva ou programaticamente. A representação da paisagem, no entanto, não remete para referentes naturais; antes tem o intuito de registo e, posteriormente, comunicação de uma realidade interior e intelectual, na qual o papel das nuvens é dominante, sendo as suas características formais mimetizadas por montes, ondas, tecidos e campos.
Esta intenção de representar a vida interior do artista foi, aliás, sentida por vários elementos do público, que, no livro de visitas escreveram comentários como: «Aprendi a conhecer-te um pouco mais» e «conhecemo-nos, renovadamente, a cada esplêndida nova mostragem do teu interior». As opiniões foram globalmente positivas, existindo, pontualmente, críticas menos favoráveis (Livro de honra, 2007, Arquivos Gulbenkian, CAM 00556).
Foram realizadas visitas guiadas conduzidas por Lígia Afonso e João Pinharanda.
Com o encerramento da exposição, o artista doou uma das pinturas expostas S/ Título (2006) (Inv. 07P1422), que foi incorporada na coleção do Centro de Arte Moderna. Posteriormente, em 2017, foi doada por Cruz-Filipe uma outra obra apresentada nesta exposição, Paisagens Múltiplas (2004).
Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00556
Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém livro de visitas, reprodução das imagens expostas, correspondência interna e externa, faturas, orçamentos, apólices de seguros, lista de convites, formulários de empréstimo.2006 2007