Eduardo Batarda. Pinturas, 1965 – 1998

Exposição retrospetiva de Eduardo Batarda (1943), organizada pelo Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão e comissariada por Alexandre Melo, que selecionou mais de 200 obras de uma produção de três décadas. A iniciativa foi amplamente elogiada pela crítica de arte portuguesa e considerada a exposição do ano em 1998.
Retrospective exhibition on Eduardo Batarda organised by the Modern Art Centre José de Azeredo Perdigão and the Calouste Gulbenkian Foundation. Curator Alexandre Melo selected more than 200 works produced over the course of three decades. The show was widely praised by Portuguese art critics and declared exhibition of the year (1998).

«Eduardo Batarda. Pinturas, 1965-1998» foi o nome da retrospetiva dedicada ao pintor português organizada pelo Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão (CAMJAP). Esteve patente de 3 de março a 10 de maio de 1998 e apresentou quase 200 obras selecionadas por Alexandre Melo, comissário da exposição, e cedidas por numerosas entidades, de galerias de arte a colecionadores privados. O projeto teve a coordenação de Jorge Molder e Rui Sanches, respetivamente diretor e diretor-adjunto do CAMJAP, e a montagem esteve a cargo de Cristina Sena da Fonseca, ocupando os espaços do Hall e a Galeria do piso 1 do CAMJAP.

Sendo representativa de uma carreira de mais de três décadas, a mostra apresentou diversos aspetos da obra de Eduardo Batarda (1943), figura das mais relevantes do panorama artístico português, mas mal conhecida pelo público – o que se pode atribuir, por um lado, ao ritmo expositivo irregular do artista e, por outro, à leitura nem sempre consensual que a crítica especializada e os seus pares fazem da sua obra.

Tal como referem Jorge Molder e Rui Sanches na introdução do catálogo, a prática artística de Eduardo Batarda relaciona-se diretamente com a criação de um vocabulário pictórico que se presta ao relato satírico da realidade contemporânea e se verte numa linguagem simbólica que progressivamente se fecha em si mesma. Além disto, interessa ao pintor o estudo dos mecanismos da pintura e do olhar, presentes no seu trabalho na representação de buracos de fechadura ou candeeiros, elementos que conduzem o espectador a uma reflexão sobre o ato de ver.

Para a produção do catálogo, foi conduzida uma investigação que reuniu vários textos de críticos e historiadores da arte portugueses consagrados à obra do artista. Além destes, o catálogo incluiu um conjunto de pequenos ensaios da autoria de Batarda, publicados em 1974 e 1975 na revista Sempre Fixe, cujo caráter humorístico, como refere Mariana Pinto dos Santos, «é pretexto para escrever textos contundentes e mordazes, com uma argumentação reveladora de um aprofundado pensamento crítico sobre arte» (Santos, «Eduardo Batarda», mai. 2010).

A propósito da seleção de obras para a exposição, Eduardo Batarda manifestaria uma opinião condizente com a sua habitual mordacidade, afirmando que Alexandre Melo, enquanto comissário da exposição, quis apresentar toda a sua obra num «não-sectarismo ecuménico de A.M., ao serviço do público» (Eduardo Batarda. Pinturas, 1965-1998, 1998, p. 8), chegando a declarar: «A exposição terá que ser má, ou muito má, porque houve tentativas de incluir algumas das minhas peças boas. E "o melhor do pior" é "o pior do pior", como se sabe.» (Ibid.)

A exposição abria com um núcleo constituído pelas obras mais recentes, realizadas em 1997, e seguia depois uma orientação cronológica.

Os anos 60 serão anos de uma produção escassa, uma vez que Batarda se reparte entre a pintura para si e o curso na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa – nesta fase, a falta de tempo e de espaço será mitigada pela utilização de tinta acrílica, por ser praticamente inodora e secar rapidamente. Em resultado desta escassez produtiva, o núcleo da exposição com menores dimensões corresponde exatamente a este período. Todavia, são anos em que Batarda se inicia naquela que será a marca caracterizadora de grande parte da sua obra: a divisão da tela em compartimentos aglutinadores de figuras alusivas à política, à arte, às letras e ao quotidiano. As cores usadas refletem a influência das artes gráficas e da publicidade, ao passo que as imagens emanam de um universo satírico, recorrendo à imagética disponível em Portugal durante esta época e que encontra os seus referentes em circos, barracas de feiras e casas de banho masculinas.

A partir de 1972, período em que se encontra a estudar em Londres, no Royal College of Art, com uma bolsa da Gulbenkian, Batarda dedica-se ao figurativismo e à pintura em aguarela, utilizando figuras como o Dr. Bronstein e Unfriendly Kid, extraídas do seu livro O Peregrino Blindado (escrito em 1970 e publicado pela Galeria 111), para dar corpo aos seus propósitos de provocação e protesto. Ao longo dos anos 70, Batarda recorreu frequentemente a estas figuras, enquanto fórmula antiartística, opondo-se à tendência da época que via o figurativismo como arte menor. Citando Mariana Pinto dos Santos: «A técnica da aguarela é voluntariamente escolhida por ser considerada menor, embora específica da pintura, e tanto ela como a morosa qualidade de execução contrastam com uma temática por vezes com carga pornográfica explícita.» (Santos, «Eduardo Batarda», mai. 2010) As suas telas deste período contêm uma clara mensagem política, sendo habitadas por figuras rudes, oriundas de uma cultura popular ou de massas, e que evocam o trabalho que Paula Rego conduzia na mesma época.

A década de 80, especialmente a partir de 1986, corresponde a anos de corte com a produção anterior e de regresso ao acrílico, coincidindo com um momento mais otimista. Mantendo a matriz figurativa ainda na primeira metade da década 80, as pinturas vão assumindo um pendor de crescente improvisação, dispensando o desenho preparatório e adquirindo maior complexidade compositiva. No entanto, manter-se-á a atitude de oposição e resistência face ao panorama artístico: se anteriormente Batarda não se enquadrava nas tendências abstracionistas da pintura, ao assumir o figurativismo dos anos 80 as suas figuras dão lugar a formas cada vez mais estilizadas e abstratas. As cores vivas darão também lugar a negros e cinzentos cada vez mais dominantes. Esta mudança na palete será concomitante com a rejeição da linguagem satírica que caracterizava as suas telas compartimentadas, e ocorrerá a par de uma alteração no universo temático que passará a privilegiar as referências eruditas com origem na história da arte, em detrimento dos temas ligados à cultura de massas. Sobre o efeito imediato destas pinturas, o comissário referia que «tendem a sugerir um efeito de vertigem, turbilhão, abismo – por vezes são literais representações de vórtices» (Eduardo Batarda. Pinturas, 1965-1998, 1998, p. 29).

A década de 1990 foi caracterizada por uma produção mais escassa, devido à dedicação a projetos como o da tapeçaria para a sede da União Europeia, em Bruxelas, de 1992-1995, ou como a decoração mural da estação de Telheiras do Metropolitano de Lisboa, de 1994-1996. Foi, no entanto, um período em que se assinalou uma redução da paleta de cores, comparativamente à década anterior, e uma atenuação da densidade de ocupação das superfícies.

Apesar de passar por todas estas fases, para Alexandre Melo a obra de Eduardo Batarda não se deixa rotular facilmente: não é figurativa nem abstrata, nem geométrica nem lírica, nem impressionista nem expressionista. No entanto, pode classificar-se como pop ou neoconceptual, pelo facto de utilizar a imagem sem respeito a hierarquias e por exibir um esbatimento de fronteiras entre a alta e a baixa cultura (Eduardo Batarda. Pinturas, 1965-1998, p. 13).

As telas de Batarda, especialmente as produzidas na década de 1970, são um importante relato do estado do país e da sociedade portuguesa, denunciando tudo o que está errado com os modelos culturais, políticos, morais e sexuais. Reagindo à guerra colonial e a um regime político esgotado, fazem eco das lutas estudantis e do alargamento dos movimentos de oposição política que culminaram na Revolução de 1974.

No âmbito da exposição, a Gulbenkian encomendou ao Laboratório de Criação Cinematográfica da Universidade Nova de Lisboa a realização de um vídeo, para o qual foram captadas imagens da mostra, close-ups de trabalhos e entrevistas com Eduardo Batarda e Alexandre Melo, nas quais o artista e o comissário falam sobre as diferentes fases da obra do pintor.

A exposição teve ampla divulgação na imprensa portuguesa, sendo considerada pela revista Máxima como «a exposição do ano» («Exposições», Máxima, mai. 1998).

Também o comissário escreveu um artigo sobre a exposição, publicado no Cartaz do semanário Expresso, no qual, além de expressar a sua incredulidade por uma obra tão extensa como a de Eduardo Batarda não ser conhecida do grande público, salienta a atenção que os media dedicaram à exposição, aludindo às muitas entrevistas e críticas saídas na imprensa, e a «atenção do público, que se deve considerar muito pouco habitual» (Melo, Expresso, 9 mai. 1998).

Apesar do reconhecimento que a iniciativa colheu no meio público e nos media, vários aspetos da museografia foram criticados por Ruth Rosengarten, que no artigo que escreveu para a revista Visão apontou a sobrecarga de obras na exposição: «A proximidade das pinturas na parede, quase asfixiante, não dá às obras espaço para respirar.» (Rosengarten, Visão, 26 mar. 1998)

Com o encerramento da exposição, a Fundação Calouste Gulbenkian adquiriu as pinturas She takes chances (… ce soir, 7 heures) (Inv. 98DP1727) e O Vitória de Marracuene (Inv. 98DP1726), ambas de 1973, hoje pertencentes ao acervo da coleção do Centro de Arte Moderna.

Carolina Gouveia Matias, 2019


Ficha Técnica


Artistas / Participantes


Coleção Gulbenkian

Ao Exp. Abs. 1 [Baja California (Corte e Costura)]

Eduardo Batarda (1943- )

Ao Exp. Abs. 1 [Baja California (Corte e Costura)], Outubro de 1974 / Inv. 98DP1728

Ao Exp. Abs. 2 [Se é boa a Mulher do Neves (É favor não fazer festas)]

Eduardo Batarda (1943- )

Ao Exp. Abs. 2 [Se é boa a Mulher do Neves (É favor não fazer festas)], Outubro de 1974 / Inv. 98DP1729

Néctar

Eduardo Batarda (1943- )

Néctar, 1984/85 / Inv. 86P698

No chão que nem uma seta

Eduardo Batarda (1943- )

No chão que nem uma seta, 1975 / Inv. DP1340

O Vitória de Marracuene

Eduardo Batarda (1943- )

O Vitória de Marracuene, Dezembro de 1973 / Inv. 98DP1726

She takes chances (...ce soir, 7 heures)

Eduardo Batarda (1943- )

She takes chances (...ce soir, 7 heures), Dezembro de 1973 / Inv. 98DP1727

O Vitória de Marracuene

Eduardo Batarda (1943- )

O Vitória de Marracuene, Dezembro de 1973 / Inv. 98DP1726

She takes chances (...ce soir, 7 heures)

Eduardo Batarda (1943- )

She takes chances (...ce soir, 7 heures), Dezembro de 1973 / Inv. 98DP1727


Publicações


Material Gráfico


Fotografias


Multimédia


Documentação


Periódicos


Fontes Arquivísticas

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00397

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém convite, planta, orçamentos, apólices de seguro, correspondência e formulários de empréstimo. 1996 – 1998

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00398

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém correspondência entre a FCG e emprestadores e formulários de empréstimo. 1997 – 1998

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00399

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém correspondência entre a FCG e os emprestadores e outros colaboradores da exposição, formulários de empréstimo. 1997 – 1998

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00400

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém correspondência entre a FCG e os emprestadores e outros colaboradores da exposição, formulários de empréstimo. 1997 – 1998

Arquivos Gulbenkian (Centro de Arte Moderna), Lisboa / CAM 00401

Pasta com documentação referente à produção da exposição. Contém correspondência entre a FCG e os colaboradores da exposição, correspondência interna. 1997 – 1999

Arquivo Digital Gulbenkian, Lisboa / ID: 109424

Coleção fotográfica, cor: aspetos (FCG-CAMJAP, Lisboa) 1998


Exposições Relacionadas

Definição de Cookies

Definição de Cookies

Este website usa cookies para melhorar a sua experiência de navegação, a segurança e o desempenho do website. Podendo também utilizar cookies para partilha de informação em redes sociais e para apresentar mensagens e anúncios publicitários, à medida dos seus interesses, tanto na nossa página como noutras.