[…] é em Antítese da Calma (1940) onde a influência de Pablo Picasso
«[…] é em Antítese da Calma (1940) onde a influência de Pablo Picasso (1881-1973) se torna mais notória, se bem que prevaleçam os parâmetros surrealistas. A inclusão de um touro – já ensaiada em Quermesse Espanhola (c. 1939) -, com as patas traseiras apoiadas no mar, como se em terra a existência fosse insuportável, evoca um importante elemento da cultura mediterrânica, de fontes e significados diversos, genericamente associados à ideia de força. O plano é cortado na diagonal pelo corpo de um homem que acompanha o corpo do animal, tocando-o com a mão esquerda. Ao centro, em primeiro plano, uma mulher sentada de costas estica o pescoço, alcançando a cabeça e estendendo o braço esquerdo para cima, seguindo a linha vertical de um poste em madeira. Ambas as figuras, de boca entreaberta, como que num grito inaudível de desespero, recordam o manifesto pictórico antibelicista do artista espanhol, realizado em 1937, na sequência do bombardeamento da cidade de Guernica pelos aviões nazis durante a Guerra Civil. No canto superior direito figura um edifício abobadado em ruínas – vestígios de outros tempos mais civilizados – e, no canto inferior esquerdo, um homem espreita a cena, numa atitude entre a surpresa e a incredulidade perante o drama; quiçá o próprio artista.
A temática da guerra – “o verme da civilização” como proferiu o escritor francês Victor Hugo (1802-1885) – é aqui indubitável. As personagens – de expressão angustiante, tratadas de modo autónomo, sem olhares cruzados, apenas partilhando o inescapável sofrimento, individual e colectivo, perante os horrores cometidos – parecem rendidas a uma atitude de contrição.»
(SARAIVA, 2014, pp. 19; 21-22)
Bibliografia

Saraiva, Tânia, António Dacosta (Pintores Portugueses). Porto: Quidnovi, 2010, p. 96
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