Ricardo Hogan

1843 – 1891

João Navarro Hogan interessou-se desde muito cedo pela pintura, embora por força das circunstâncias tenha necessitado trabalhar a partir dos dezasseis anos. Inscreveu-se no curso de Pintura da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, passagem fugaz no ensino artístico das Belas-Artes: Hogan é reprovado no final do primeiro ano, acabando por desistir.

O gosto por uma aprendizagem teórica não desvanece Hogan. Dividindo o seu tempo entre o ofício de marcenaria e de pintura, o artista inscreve-se nos cursos nocturnos da Sociedade Nacional de Belas-Artes, usufruindo não só de um primeiro contacto com a arte internacional, nomeadamente com a obra de Cézanne ou Derain, mas também de uma prática constante de exercícios em pintura e desenho, ao longo de três anos.

 

Em 1942 expõe pela primeira vez no VI Salão de Arte Moderna do Secretariado de Propaganda Nacional, participando ininterruptamente nos salões até 1946. No ano seguinte expõe nas Exposições Gerais de Artes Plásticas, decisão influenciada estritamente por uma afirmação política que o artista quis assumir publicamente, como o próprio teve oportunidade de referir: «a minha pintura não mudou ao sabor da nova atitude cívica: no SNI e nas Gerais fui o mesmo pintor».*

 

João Hogan interessava-se sobretudo por um paisagismo que captasse a essência da natureza. A partir dos componentes matéria e cor, Hogan define um processo transversal nas suas pinturas, mantendo um registo linear, como se estas fossem meros exercícios para o artista atingir a obra final. Cingindo-se a uma paleta de cores ocres, que oscilam entre tons esverdeados e acastanhados, Hogan pretende ir sempre além do visível. A natureza é uma natureza repleta de rocha, terra e sedimento, onde não se sente a presença do homem, uma natureza pura, como um retorno ao princípio. A simplicidade das formas tenta secundarizar a visão, numa tentativa de apelar o olfacto e o tacto, embora não se possam cheirar nem sentir as paisagens de Hogan.

 

Após um convite formulado pela Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses, em 1957, João Hogan trabalha em gravura até 1982, ano em que abandona esta linguagem artística para se dedicar completamente à pintura. A gravura de Hogan constitui um corpo de trabalho distinto e em ruptura com a sua pintura. A esse respeito, o artista declara: «Quando faço gravura esqueço o pintor. O gravador Hogan é diferente do pintor Hogan: talvez como nos heterónimos do Pessoa».**

 

As suas primeiras gravuras executadas pela técnica de xilogravura, ou seja, com uma matriz em madeira, compõem-se de densas manchas negras e pequenos apontamentos brancos. Com uma influência expressionista, Hogan explora paisagens desertas a preto e branco, criando composições nocturnas com uma carga dramática. 

 

Na segunda metade da década de 60, Hogan elabora as primeiras gravuras sobre matrizes de metal, em água-forte e água-tinta. Influenciado pelo seminário de Stanley William Hayter (1901-1988), gravador inglês e fundador do Atelier 17 – que teve lugar na Cooperativa Gravura em 1964 com o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian –, João Hogan começa a libertar-se de todos os modelos de referência em detrimento de novas soluções formais. A valorização da matriz não se cinge apenas a uma questão técnica mas também a uma evolução da linguagem artística. O expressionismo dá lugar a formas abstractas enquadradas num imaginário onírico que remete ao surrealismo, corrente estética que sempre exerceu um fascínio no artista. Fernando Lemos, Marcelino Vespeira e Fernando Azevedo, seus amigos, são fundamentais no seu percurso artístico, influenciando a concepção de algumas temáticas: «O real que se vê, sendo importante, não era nem é tudo. O sonho, o acaso, a aventura da imaginação livre e criadora fazem parte de vida. Embora nunca tenha pertencido a nenhum grupo surrealista, nem pintado como tal, na minha pintura aflora e materializa-se (muitas vezes fora do meu controlo racional e por uma via autónoma da pintura) uma grande parte das preocupações que também as temáticas surrealistas vincaram em mim».***

 

Com uma produção artística ambivalente entre a pintura e a gravura, João Hogan realizou também, trabalhos de ilustração. Destaca-se o livro O Homem da Neve, de Aquilino Ribeiro, o poema Lusitânia de Sophia de Mello Breyner e o conto O Cerco de Agustina Bessa-Luís.

 

Bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian em 1958, 1959 e 1961 – ano em que ganha o I Prémio de Pintura na II Exposição de Artes Plásticas organizada pela referida Fundação –, João Hogan dirigiu cursos técnicos de gravura na Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses e leccionou pintura e gravura na Ar.Co.

 

 

* Cf. António Rodrigues, “A Escolha do JL”, in Jornal de Letras, Artes e Ideias, 11 a 17 de Junho de 1985, p. 1.

** Cf. “A Escolha do JL”, op. cit., 1985, p. 1.

*** In Moniz Pereira, João Hogan, José de Guimarães, Rogério Amaral: conversando com Francisco Faria Paulino, Funchal: Quetzal, 1982, p. 16.

 

 

 

Inês Vieira Gomes

 
Updated on 10 march 2016

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