Estudos para as tapeçarias de Basileia
Em 1953, Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) era já uma artista consagrada, com obras nas coleções dos mais importantes museus internacionais. Nesse mesmo ano, submeteu quatro projetos a um concurso promovido pela Universidade de Basileia, cujo objetivo seria realizar duas tapeçarias para o auditório da instituição. Quando venceu o concurso, Vieira da Silva acabou por não dar continuidade a nenhum dos projetos, mas criou dois cartões com o apoio de um grupo de estudantes de Belas-Artes daquela universidade. Estes novos moldes para as tapeçarias levaram a artista a passar longas temporadas em Basileia, ficando hospedada no Hôtel du Mont-Blanc.
Tanto os estudos iniciais como os cartões usados como molde foram realizados com as dimensões que as tapeçarias viriam a ter (5 metros de altura por 3,5 metros de largura), apenas desta forma as bordadeiras poderiam ter noção exata da escala a que deveriam trabalhar. De forma a conseguir criar cartões com esta dimensão, Vieira da Silva utilizava papel kraft e têmpera, técnica pouco explorada pela artista nesta altura, que viria a aprofundar nos anos seguintes. Ao contrário da aguarela, com que Vieira estava mais acostumada a trabalhar, a têmpera mantém as tonalidades, quer assim que é aplicada como quando seca. Num trabalho de tão grandes dimensões, tornava-se mais fácil conseguir uma noção real das cores finais. Henri Sennelier, da aclamada casa de materiais artísticos Sennelier, «(…) forneceu Vieira em tubos com capacidade invulgar, de 250 ml de tinta; eram bisnagas usadas na altura pelos leiteiros para acondicionar leite condessado.»[1] Em correspondência com o seu marido, Arpad Szenes, Vieira da Silva vai dando notícia da evolução dos cartões, confessando-se entusiasmada com o processo[2].
Findos os cartões, Vieira da Silva já não passava tanto tempo na cidade suíça, apenas se deslocava esporadicamente para acompanhar o bordado. Setenta e oito mulheres dos professores da universidade passaram cinco anos e meio, cerca de 6300 horas, a bordar as duas tapeçarias, sob a orientação da tecelã Marthe Guggenbühl. Entre outros materiais, as bordadeiras utilizaram pelos de cabra para conferir brilho às partes brancas. Em 1960, as tapeçarias foram apresentadas ao público na celebração do quinto centenário da Universidade de Basileia. A cerimónia foi transmitida pela televisão suíça, gravação em que Vieira da Silva aparece a ser agraciada com um ramo de flores.
Dois dos estudos inicialmente realizados viriam a pertencer à Coleção do CAM, fruto de uma doação do aclamado colecionador Jorge de Brito. Atualmente, estas duas obras de grande dimensão têm um espaço feito à medida para as acolher nas reservas do CAM. Em 1979, a Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, com que Vieira da Silva trabalhava frequentemente, produziu a tapeçaria Ante-Projecto Bâle a partir de outro dos estudos iniciais para o concurso de Basileia. A tapeçaria foi, assim, adquirida para a coleção da Fundação logo em 1981, integrando atualmente o acervo do CAM.
[1] Agnés Le Gac (coord.) «Por dentro da obra. A técnica da têmpera na obra de Vieira da Silva», p. 11.
[2] «Escrita Íntima. Maria Helena Vieira da Silva e Arpad Szenes. Correspondência 1932-1961», INCM: FASVS, 2014.
Obras da Coleção do CAM
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