O piano é o centro da nova temporada da Gulbenkian

A Temporada 2017/18 tem algumas novidades, mas resume-se a um único instrumento. De resto, os grandes nomes abundam e as músicas que não a clássica mantêm a sua presença. Para Risto Nieminen, os jovens nos corredores da Fundação encarnam o perfil de um público que está a mudar
25 mai 2017

Se há alguma palavra que possa resumir a nova temporada de música da Fundação Gulbenkian, essa palavra tem cinco letras e é bastante simples. “Piano”, disse Risto Nieminen esta manhã, horas antes de a programação ser divulgada. “Vamos ter mais de 30 pianistas de nível internacional no nosso palco”, continua, explicando que tamanha concentração de talento se deve ao que percebeu ser uma preferência do público e, também, à vontade de celebrar um elemento que sempre fez brilhar as temporadas da Gulbenkian. “Instrumento crucial na história da música”, a ideia é trazer a Lisboa quem melhor o representa, venha de onde vier e tenha a idade que tiver. Menahem Pressler vai tocar aos 93 anos, Beatrice Rana aos 24. Pelo meio, nomes como Elisabeth Leonskaja,Pedro Burmester, Mitsuko Uchida,Lang Lang, Evgeny Kissin, Grigory Sokolov, Radu Lupu, Nikolai Lugansky, Artur Pizarro ou Yuja Wang fazem as honras da casa. Sem esquecer a grande Martha Argerich que, na companha de Lilya Zilberstein, se apresenta em março de 2018 e pelo segundo ano consecutivo.

A grande novidade da temporada 2017/18 talvez seja a forma como está organizada, com três ‘blocos temáticos’ a infiltrar-se na programação regular, cada um deles composto por sete concertos. O primeiro acontece logo em outubro, e sob o título “Entre o Céu e a Terra” promete passar em revista o tema da espiritualidade na música – e para isso o violoncelista António Meneses, vai tocar as Suites de Bach, a soprano Elisabete Matos vai cantar na 3ª Sinfonia de Gorecki, a meio-soprano Magdalena Kozena vai juntar-se à Companhia de Flamenco Antonio El Pipa e Houria Aichi vai dar voz aos cantos sacros argelinos. “São pequenos festivais, e como tal podem dar ao público uma quantidade maior de propostas num espaço de tempo mais curto”, explica Nieminen, diretor da Gulbenkian Música.

Neste sentido, em janeiro tem lugar o segundo destes blocos, “Pianomania”, dedicado por inteiro ao instrumento que assumidamente define a própria temporada. E em maio é apresentado o tema “Guerra e Paz”, com obras inspiradas em períodos históricos conturbados, como o “War Requiem” de Britten, a 7ª Sinfonia de Chostakovitch, as “Metamorfoses” de Richard Strauss, ou o programa “O Milénio de Granada” pela mão de um Jordi Savall cada vez mais atento aos desastres da História. Para Nieminen, esta vertente não podia faltar numa temporada em que se defende uma relação com a música que vá além do entretenimento: “A música tem implicações e conexões diretas com a literatura, com a filosofia e com a história. E os músicos, por sua parte, também tomaram posição nos eventos da sociedade.”

Mas antes, antes, está a abertura. Tudo começa a 27 de setembro, quando o Grande Auditório receber “O Monstro do Labirinto”, uma ‘ópera comunitária’ que reúne 300 cantores em cena, com música do compositor britânico Jonathan Dove, estreada no Festival de Aix-en-Provence e apresentada em versão portuguesa. Depois disso, ao longo de dez meses haverá um desfile de músicos de todo o mundo, consagrados e nem tanto, eruditos e populares. Thomas Hampson, Katia e Marielle Labèque, András Schiff, Sofia Escobar, Tom Koopman, Joana Carneiro, Juanjo Mena, Giancarlo Guerrero, David Afkham, Alina Ibragimova, Joyce DiDonato, Daniil Trifonov, Miguel Polveda, Vicente Amigo. Dave Holland, Anouar Brahem. E a orquestra de jovens da Fundação – a Orquestra Estágio Gulbenkian, criada em 2013 – a partilhar o palco com uma das maiores orquestras do mundo, a do Royal Concertgebouw de Amesterdão, dirigidos por Semyon Byhkov.

A música de câmara terá uma presença forte, com uma secção da programação especialmente consagrada aos Quartetos de Cordas em finais de janeiro e formações como o Quarteto Casals a tocar a integral dos Quartetos de Beethoven em três momentos da temporada. Prossegue igualmente o ciclo de cinema com música ao vivo, desta feita com “O Feiticeiro de Oz” de Victor Fleming, “O Regresso do Rei” – da trilogia “O Senhor dos Anéis”, de Peter Jackson – e, por fim, a projeção de um conjunto de imagens cedidas pela NASA enquanto “Os Planetas” de Gustav Holst, “Assim Falava Zaratustra” de Richard Strauss e “Short Ride in a Fast Machine” de John Adams são ouvidas, numa experiência dirigida e concebida pelo maestro Rovert Ziegler. Esta iniciativa, que segundo Nieminen tem suscitado um grande interesse por parte do público, serve para “mostrar o impacto da música no cinema”, que muitas vezes passa despercebido. E, no caso do “Senhor dos Anéis”, para dar a ouvir partes da música original que estão ausentes do filme e, por isso, desconhecidas de quem o viu no cinema.

Aos domingos, os já tradicionais concertos para famílias deslocam o horário para as 12h e as 17h. E a Gulbenkian acolhera, como tem sido regra em anos anteriores, o Prémio Jovens Músicos e o Rising Stars — jovens músicos selecionados pela ECHO, a rede de salas de concertos europeia de que a Gulbenkian faz parte.

Há já oito anos à frente da Gulbenkian Música, o finlandês Risto Nieminen afirma estar a ser bem sucedido no seu propósito de “abrir as portas” da Gulbenkian a novos públicos e ao resto do país. Na temporada que termina em junho, houve 30 concertos realizados fora de Lisboa. “O perfil das pessoas que nos visitam está a mudar. Além do público fiel da Fundação, vejo mais jovens nos concertos. E isso só pode ser bom”, conclui o programador.

 

Expresso – 25 de maio 2017

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