Células usam pistas do ambiente para migrar e formar tecidos

Um novo estudo revela como as células adaptam a sua rigidez em resposta ao ambiente para migrarem coletivamente. Os resultados poderão ter impacto na compreensão de processos como o desenvolvimento embrionário, a regeneração, e a disseminação do cancro.
16 ago 2022

O ambiente no interior de um embrião em desenvolvimento é extremamente dinâmico, com células a viajar de forma coordenada até aos locais onde irão desempenhar funções específicas. Movendo-se individualmente ou em aglomerados, num processo conhecido por migração coletiva de células, estas alcançam o seu destino para eventualmente formar os diferentes tecidos e órgãos do corpo. Mas o que desencadeia e direciona o movimento de múltiplas células de uma forma tão coordenada?

Para migrar, as células dependem de pistas químicas e físicas da superfície que usam como substrato. Estudos realizados em caixas de Petri sugerem que superfícies mais rígidas favorecem a migração celular, enquanto superfícies mais maleáveis não o permitem. Assim, ainda está por descobrir se as células adaptam as suas propriedades mecânicas às superfícies quando migram no cenário dinâmico e complexo de um organismo vivo e como.

Para abordar estas questões, investigadores do laboratório de Elias Barriga no Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) estudaram a interação entre células que formam várias estruturas da cabeça e do rosto e o seu substrato em embriões de rãs. Ao recorrer a um tipo especial de microscópio (microscópio de força atómica), os investigadores puderam medir a rigidez das células e dos seus respetivos substratos em fases migratórias e não-migratórias.

Antes destas experiências, os cientistas julgavam que as células em migração mimetizavam as propriedades elásticas das superfícies em que se encontravam. Mas este estudo, publicado na Nature Materials, veio demonstrar que, pelo contrário, as células tornam-se mais maleáveis quando a sua superfície migratória se torna mais rígida.

Para explorarem o impacto das propriedades elásticas das células na sua migração, os autores integraram os dados obtidos num modelo computacional tridimensional desenvolvido pelo grupo de Abdul Malmi-Kakkada da Augusta University, EUA. Ao combinar este modelo com experiências de biofísica, os autores descobriram que os aglomerados celulares se movimentam mais eficazmente quando a razão entre a rigidez do substrato e da célula é maior. Isto é, se as células de um aglomerado são significativamente mais rígidas que o seu substrato, estas não conseguem migrar. Para esse efeito têm, primeiro, que reduzir a sua rigidez. Então como é que as células adaptam as suas propriedades para se moverem no interior do embrião?

Os investigadores descobriram que as células avaliam a rigidez do ambiente através de um canal específico na sua membrana, chamado Piezo1. Isto, por sua vez, despoleta a modificação do esqueleto das células, permitindo-lhes ajustar as suas propriedades mecânicas e dar início à migração coletiva no embrião. Um resultado impressionante do estudo é que a modificação desta proteína, e a consequente redução da rigidez celular, é suficiente para que as células migrem independentemente do tipo de substrato em que se encontram. “Isto é relevante porque os substratos rígidos eram tipicamente descritos como superfícies permissivas à migração. Por outras palavras, os cientistas assumiam que quando o substrato de migração das células evoluía de maleável para rígido, as células passavam de andar na neve a correr no asfalto”, explica Elias Barriga. “Ao invés, os nossos dados mostram que o substrato tem um papel elucidativo, mostrando às células que devem diminuir a sua rigidez para migrar. Como mostrado no estudo, assim que um aglomerado de células diminui a sua rigidez, este consegue migrar independentemente do seu substrato”, acrescenta.

Estas descobertas poderão ter impacto na nossa compreensão de diversas situações em que a migração coletiva está envolvida. Para além do desenvolvimento embrionário, este tipo de movimento ocorre também quando os tecidos são reparados ou quando o cancro metastiza. Explorar estas novas observações poderá ajudar os cientistas a compreender a migração de células cancerígenas, que ocorre frequentemente em tecidos menos rígidos.

 

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