Natacha, pintura premiada com a 2.ª medalha no Salão de 1929 da Sociedade Nacional de Belas-Artes, é comummente aceite como a obra central da produção pictórica de António Soares. Nela se espelham algumas das qualidades que fizeram deste autodidacta o digno sucessor de Columbano na pintura de figura humana, e personagem de monta entre os modernistas que actualizavam o panorama artístico português da época. Iniciando o seu percurso na produção de caricaturas e ilustrações ainda nos anos dez do século XX, atinge a maturidade artística na década seguinte, o que se poderá aferir pela insistente referência a Natacha como ponto máximo do seu percurso.
Devendo ser entendida num conjunto mais vasto de uma produção que se debruça principalmente sobre a representação da mulher do tempo, tanto em pintura como nos trabalhos gráficos, esta tela alia a mestria do desenho ao tratamento em volume da figura numa pincelada solta e expressiva, embora contida por um relativo rigor anatómico. Esta ambiguidade encontra-se, ainda, na forma elegante mas eivada de erotismo com que a figura se nos oferece sem nos olhar, num fundo que, tendendo à geometrização, liberta a voluptuosidade da bailarina russa. Deve-se, ainda, apontar a sua pose, retomada no Retrato de Maria de Mello Breyner, de 1932.
André Silveira
Maio de 2010