• 1959
  • Tela
  • Óleo
  • Inv. 62P259

Júlio Pomar

Cena na Praia

Ambientar o olhar à obra Cena de Praia, de 1959-60, poderá começar, antes de mais, por situá-la no decurso da produção de Júlio Pomar, plena de metamorfoses porque ávida de experimentação. Após o período neo-realista inicial, observa-se uma transformação para uma linguagem de cariz mais gestualista, transformação na qual Maria da Fonte (1957) é um marco incontornável num percurso a seguir pontuado por obras como Cegos de Madrid (1957, pertencente à colecção do CAM) e Lota (1958). A forma mais realista, descritiva ou expressionista que caracterizara a fase neo-realista é substituída por uma experimentação em torno da pincelada e do movimento da mesma, os quais passam a partir de então a estruturar a forma. O avanço desta pesquisa leva, de certo modo, a uma desfiguração do objecto, ainda que Pomar jamais abandone a figuração.

 

Contudo, numa obra como Cena na Praia a figuração é em boa medida assegurada pelo título, que a ancora a um universo referencial específico. Todavia, quando comparada, por exemplo, com Cegos de Madrid é inevitável reconhecer como progressivamente as formas se tornam menos reconhecíveis.

 

Para esta evolução não foi alheia a prática do desenho e da ilustração de obras literárias pelo pintor, como nota Alexandre Pomar*: vejam-se, a título de exemplo, as ilustrações que realiza para Novelas Exemplares de Cervantes (1958), para O Barão de Branquinho da Fonseca (1959) ou para D. Quixote de Cervantes (1957-59), onde se observa a liberdade e movimento do traço a romper gradualmente com uma forma mais descritiva.

 

Num fundo abstracto em dois tons reconhecemos um cenário de praia guiados pelo título: um areal ocre, ocupando uma grande área da composição, e uma mancha negra na parte superior, a qual tanto pode ser uma figuração do mar como de um céu nocturno. O movimento que anima a composição resulta, em primeira instância, da simbiose entre as opções sobre a figuração da paisagem e a disposição das figuras sobre a mesma. O plano do areal não está nivelado pela esquadria ortogonal do quadro, desestabilizando, com esta peculiar inclinação, o nível convencional do olhar. A sua forma tendencialmente circular, com alusões a uma arena, é sublinhada pela disposição das figuras em elipse. Assim, a disposição das figuras em conjunto com a forma do areal criam um sensação de movimento centrípeto, como se as linhas de força em jogo criassem um vórtice na composição. Este vórtice conduz o olhar para o seu centro, ocupada pela figura de maiores dimensões em tons escuros mas iluminada por uma mancha branca.

 

Porém, em segunda instância, temos obviamente de considerar como factores determinantes para a sensação de movimento que a obra transmite a pincelada rápida, bem como um gama cromática predominantemente escura mas animada por brancos brilhantes e, pontualmente, por breves pinceladas de amarelo e vermelho.

 

A grande força desta composição resultará provavelmente de uma permanentetensão entre a sua (e do nosso olhar) estabilidade e instabilidade. Como se os planos desestabilizados relativamente aos limites ortogonais do quadro fizessem oscilar continuamente o nível da imagem e, com esta, o do nosso olhar.

 
 

* Alexandre Pomar, “Júlio Pomar” in Júlio Pomar. Catálogo ‘Raisonné’ I. Pinturas, Ferros e ‘Assemblages’. 1942-1968, Paris, La Différence, 2001-2004, p. 21. 

 

 

 

Luísa Cardoso

Fevereiro 2015

TipoValorUnidadesParte
Altura130,5cm
Largura162,5cm
Tipo assinatura
TextoPomar
PosiçãoFrente, margem inferior à direita
Tipo data
Texto59-60
PosiçãoFrente, margem inferior à direita
TipoAquisição
Data2 Agosto 1962
Exhibition of works of Contemporary Art belonging to the Calouste Gulbenkian Foundation
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1966
Catálogo de exposição
Exhibition of Contemporary Art belonging to the Calouste Gulbenkian Foundation
Fundação Calouste Gulbenkian
Curadoria: Fundação Calouste Gulbenkian
Exposição realizada pela Fundação Calouste Gulbenkian, Novembro de 1966, em Bagdade, Iraque.
4º Prémio Amadeo de Souza-Cardoso: Júlio Pomar
Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso
Curadoria: Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso
13 de Setembro de 2003 a 2 de Novembro de 2003
Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso
Exposição realizada no âmbito da atribuição do Prémio Amadeo de Souza-Cardoso ao Mestre Júlio Pomar.
Pintura Portuguesa - Século XX
Câmara Municipal de Coimbra
Curadoria: Telo Morais
6 de Dezembro de 2001 a 27 de Janeiro de 2002
Casa Municipal da Cultura, Coimbra
Exposição que pretendeu retratar a produção de alguns pos pintores mais relevantes do século XX.
Atualização em 23 janeiro 2015

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